O que é arcabouço fiscal? Nova regra do orçamento está em debate no governo
Teto de gastos: rebatizada de arcabouço fiscal, a proposta que deve ser apresentada em abril após ajustes do presidente Lula
Redação Exame
Publicado em 13 de março de 2023 às 06h57.
Última atualização em 29 de março de 2023 às 10h33.
Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do Planejamento, Simone Tebet (MDB), debatem uma nova regra do orçamento federal para substituir o teto de gastos. Rebatizada de arcabouço fiscal,a proposta que deve ser divulgada em abril. A dupla econômica definiu o texto que foi apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deve fazer ajustes e considerações antes enviar a proposta ao Congresso.
Tebet vemafirmando que o novo arcabouço fiscal vai agradar a todos,inclusive ao mercado financeiroporque atende tanto o lado da preocupação em zerar o déficit fiscal e estabilizar a relação dívida/PIB, quanto garantir os investimentos necessários para o país voltar a crescer.
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Na opinião do cientista político, André César, da Hold Assessoria, o arcabouço fiscal nada mais é do que um 'rebranding' do teto de gastos. "É outro nome para o mesmo produto. O governo Lula quer se diferenciar do antigo governo até na questão semântica. Talvez tenha alguma mudança no teto, que deve subir, mas tem que ver o que vai ser mesmo porque até agora ninguém viu", diz.
Principais pontos do arcabouço fiscal
O novo arcabouço fiscal a ser apresentado pelo governotem por objetivo ser "desafiador, mas crível", diz o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo . A frase, segundo ele, é frequentemente usada pelo ministro Fernando Haddad como base para a elaboração do projeto.
O "número 2" da Fazenda afirma também que a nova regra vai corrigir problemas vistos nos dois último modelos usados pelo Brasil: o teto de gastos a partir do governo Michel Temer e, antes disso, a regra baseada na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
A LRF foi a principal base da discussão do espaço fiscal nos dois governos Lula e já foi elogiada pelo presidente como oposição ao modelo do teto de Temer, mas o secretário admite que o novo arcabouço desenhado busca corrigir problemas também desse modelo, com foco nas políticas anticíclicas.
Galípolo argumenta que já é "consenso" entre economistas que o"orçamento público deve suavizar os ciclos econômicos, não acentuar os ciclos econômicos". Mas afirma, também, que não se vai "gastar mais quando está crescendo".
Ao mesmo tempo, o secretário afirma que é prioridade na Fazenda garantir um ambiente democrático na discussão do orçamento, corrigindo um problema que, segundo ele, existe na atual regra do teto, que autoriza aumento dos gastos para corrigir a inflação, e não um crescimento real.
O que é o teto de gastos?
Criado por emenda constitucional no fim de 2016, o teto de gastos é uma das três regras fiscais a que o governo tem de obedecer. As outras são a meta de resultado primário (déficit ou superávit), fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias de cada ano, e a regra de ouro, instituída pelo Artigo 167 da Constituição e que obriga o governo a pedir, em alguns casos, autorização ao Congresso para emitir títulos da dívida pública.
Considerado uma das principais âncoras fiscais do país, o teto de gastos tem como objetivo impedir o descontrole das contas públicas. A adoção desse mecanismo ganhou força após a crise na Grécia, no início da década passada.
Por que o teto é importante?
O teto foi uma das primeiras medidas propostas pelo governo Michel Temer (MDB) como forma de ancorar as expectativas de investidores após um período de forte aumento dos gastos e da dívida pública brasileira. Os juros estavam elevados, refletindo as incertezas sobre a sustentabilidade fiscal do país, o que tornava mais caro para o Brasil emitir títulos e se financiar no mercado.
Qual é o problema?
O teto é corrigido pela inflação, mas cada item de despesa tem seu próprio ritmo de evolução. Gastos obrigatórios, como benefícios previdenciários e salários, têm historicamente crescido acima da inflação. Na prática, isso significa que o espaço para gastos “livres” da máquina pública, como investimentos e até programas sociais, é cada vez menor.
Quando o teto foi furado
No sistema atual, o teto pode ser extrapolado em alguns casos: créditos extraordinários (relacionados a gastos emergenciais), capitalização de estatais não dependentes do Tesouro (mecanismo usado para sanear problemas financeiros ou preparar empresas para a privatização), gastos da Justiça Eleitoral com eleições e transferências obrigatórias da União para estados e municípios.
Nos demais casos, é necessário modificar a Constituição. Apesar da atenção em torno da proposta atual, o teto de gastos tem sido ultrapassado nos últimos anos. Desde a criação do mecanismo, o limite foi furado pelo menos sete vezes, das quais cinco por meio de emendas constitucionais.
Em 2019, o governo precisou aprovar uma emenda constitucional para retirar R$ 46 bilhões para que a União pudesse distribuir, aos estados e municípios, os recursos da nova cessão onerosa do petróleo na camada pré-sal. Como a transferência era voluntária, não obrigatória, foi necessário costurar uma emenda constitucional com o Congresso. A capitalização da estatal Emgepron, ligada à Marinha, para a construção de corvetas (tipo de navio) custou mais R$ 7,6 bilhões.
Em 2020, o Orçamento de Guerra para enfrentar a pandemia de covid-19 foi responsável por excluir mais R$ 507,9 bilhões, segundo cálculos do economista Bráulio Borges, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre).
Arcabouço fiscal: expectativa de apresentação
O texto está em discussão dentro do governo. Com o adiamento da viagem do presidente Lula à China em virtude de uma pneumonia, a expectativa é que o tema seja prioridade nos próximos dias e que um possível adiantamento da apresentação pública possa ocorrer.
Após reunião com Lula, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse que "não há data definida", mas que Haddad e o presidente traçarão agora um cronograma para os trabalhos finais antes de apresentar a regra. A previsão é apresentar o marco fiscal no começo de abril.
Com Estadão Conteúdo e Agência Brasil