Brasil

Matrículas na rede privada despencam em 2021; veja dados do Censo Escolar

A crise afetou principalmente a educação infantil, etapa na qual a participação do setor privado nas matrículas caiu de 20% para 14% na pandemia

Creche em São Paulo: rede pública terá de receber alunos que deixaram as escolas do setor privado (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Creche em São Paulo: rede pública terá de receber alunos que deixaram as escolas do setor privado (Rovena Rosa/Agência Brasil)

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Carolina Riveira

Publicado em 31 de janeiro de 2022 às 20h58.

Última atualização em 31 de janeiro de 2022 às 21h59.

O número de alunos matriculados em escolas privadas no Brasil teve nova queda no ano passado, mostram dados do Censo Escolar divulgados nesta segunda-feira, 31. Enquanto a rede pública teve leve aumento de matrículas entre 2020 e 2021, chegando a 38,5 milhões de alunos, a rede privada caiu de 8,8 milhões para 8,1 milhões de matriculados. 

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Os resultados deste ano refletem desafios como a crise econômica intensificada pela pandemia, que fez parte das famílias transferirem os filhos para escolas públicas.

O Censo Escolar foi feito junto às escolas entre junho e agosto de 2021. A pesquisa é divulgada anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), autarquia ligada ao Ministério da Educação, e constitui uma das principais fontes oficiais de informação sobre a educação no Brasil, sendo usada para distribuição de recursos públicos para as escolas, por exemplo.

O principal impacto da pandemia foi na educação infantil, etapa que inclui creches e pré-escolas, atendendo crianças de até 6 anos. Nos dois anos de pandemia, houve queda de 22% nas matrículas nas creches privadas e de 26% na pré-escola. 

O Brasil tem hoje 1.900 escolas de educação infantil privadas a menos em comparação a 2019, muitas fechando com a crise e a queda no número de alunos.

Assim, a fatia da participação da rede privada (sem convênio) nas matrículas na educação infantil, que era de quase 20% do total em 2019, caiu para 14% no ano passado.

Já as matrículas em creches e escolas infantis privadas com convênios (formato em que o Estado arca com as mensalidades de alunos pobres) se mantiveram relativamente estáveis, o que mostra como a redução no número de alunos privados tende a vir, sobretudo, da queda na renda das famílias.

Paralelamente, a rede municipal passou a responder por 76% dos alunos na educação infantil em 2021, ante 71% pré-pandemia. 

 

Para Carlos Eduardo Moreno Sampaio, diretor de Estatísticas Educacionais do Inep, a queda na matrícula em creches na rede privada é um movimento "que só pode ser explicado pela pandemia", segundo afirmou em coletiva de apresentação dos resultados.

A redução da participação da rede privada também se repete em outras etapas, ainda que em menor escala. Os números do censo mostram que as matrículas para alunos mais velhos, em anos finais do ensino fundamental e no ensino médio, se mostram mais resilientes. No ensino médio, inclusive, a rede privada chegou a ter leve aumento no número de matrículas.

Incluindo todas as etapas da educação básica, da creche ao ensino médio, o Brasil tem 46,7 milhões de alunos (o número não leva em conta o ensino superior). Mais de 80% estão matriculados na rede pública, e 17% estavam inscritos na rede privada em 2021.

Faltam creches

Um desafio para o orçamento público é que os alunos que saíram das creches na rede particular terão de ser absorvidos pela rede municipal, que já enfrenta problemas no oferecimento de vagas nesta etapa.

A educação infantil, no geral oferecida pelos municípios, é uma das etapas mais caras da educação básica, porque inclui um grande número de profissionais para ajudar no cuidado e ensino às crianças, além de mais matrículas em tempo integral.

Antes da pandemia, o número de matriculados nesta etapa escolar vinha crescendo, puxado pelo ingresso das mulheres no mercado de trabalho. Agora, um risco é que os alunos deixem de frequentar a escola na primeira infância e não recebam em casa estímulos adequados ao desenvolvimento.

Mesmo na rede pública, houve um componente de evasão na pandemia. O número total de matrículas em creches públicas caiu 2% entre 2019 e 2021, e na pré-escola, 6%, mesmo com a chegada de mais ex-alunos da rede privada, o que mostra que parte dos alunos mais pobres previamente atendidos deixaram as escolas.

"De 8 até 14 anos praticamente universalizamos o acesso. Temos desafios nos anos iniciais e sobretudo na creche, quando a frequência à escola cai no Brasil", afirmou Sampaio, do Inep.

Apesar da queda na pandemia, um dos principais gargalos na educação infantil brasileira ainda é a oferta, isto é, muitas famílias querem matricular os filhos em creches, mas não conseguem uma vaga. A estimativa é que o Brasil precise criar mais de 1,5 milhão de vagas em creches até 2024 para cumprir a meta do Plano Nacional de Educação de ter 50% das crianças de zero a 3 anos matriculadas (eram 37% em 2019, data da última estimativa do Inep).

Historicamente, a falta de acesso à educação infantil no Brasil afeta sobretudo as famílias mais pobres: 54% das crianças mais ricas frequentava uma creche antes da pandemia, segundo dados anteriores do Inep, contra 27% dos mais pobres. Os alunos brancos também são maioria.

Desafios da rede pública

Ao todo, incluindo rede pública e privada, o número total de alunos na educação básica no Brasil caiu perto de 2,5% entre 2019 e 2021, indo de 47,9 milhões para 46,7 milhões de matrículas.

O número bruto de matrículas já vinha naturalmente em queda ano após ano, devido à menor taxa de natalidade e envelhecimento da população - e a tendência é que o Brasil, de fato, tenha progressivamente um menor número de alunos no futuro.

Mas, com a crise da covid-19, parte da queda atual é também resultado da evasão, que afeta todas as etapas. Há ainda um problema não contabilizado, que é o abandono: são alunos que estão matriculados e ainda não evadiram, mas não têm frequentado as aulas.

Ainda não há números exatos sobre quantos alunos podem ter abandonado a escola na pandemia. Mais informações sobre a situação das escolas serão divulgadas em uma segunda parte do censo do Inep.

Uma estimativa do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) aponta que mais de 170.000 alunos no Brasil deixaram a escola só em 2020. Os números podem ser bem maiores. No ensino médio, onde parte dos alunos mais pobres é pressionada a trabalhar, pesquisas já mostram que mais de 10% pode ter abandonado a escola em alguma medida. Redes têm feito a chamada "busca ativa", tentando localizar os alunos e trazê-los de volta às aulas neste ano.

A conectividade é outro desafio. O Censo Escolar também mostra que, na maior parte dos municípios (2.449), nenhuma escola conseguiu oferecer aulas síncronas (ao vivo) durante a pandemia em 2020. Problemas de acesso à internet por parte dos alunos também atrapalham o planejamento das redes.

(Com Estadão Conteúdo)

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