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Lula defende reforma administrativa e tributária e diz que "não existe 3ª via"

O petista pediu diálogo com o agronegócio, defendeu que haja reforma administrativa e tributária e criticou a busca por uma terceira via na eleição deste ano

Lula: no discurso, ele cobrou que o empresariado se envolva para garantir aprovação de reforma tributária (NELSON ALMEIDA/AFP/Getty Images)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 9 de agosto de 2022 às 17h44.

Última atualização em 9 de agosto de 2022 às 18h52.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou, durante discurso na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo ( Fiesp ) nesta terça-feira, 9, que, caso eleito, irá governador "sem surpresas" e falou sobre temas que geram controvérsia entre o empresariado — como posições a respeito de teto de gastos e reforma trabalhista. O petista pediu diálogo com o agronegócio, defendeu que haja reforma administrativa e tributária e criticou a busca por uma terceira via na eleição deste ano.

Depois de 2 horas e de responder a algumas perguntas de representantes da Fiesp, Lula afirmou que não disputará reeleição se for eleito, fez piadas e buscou construir pontes com empresários que estavam no encontro. O petista também fez referências e elogios ao vice, Geraldo Alckmin (PSB), e também a José Alencar, que foi vice-presidente nos dois mandatos do petista e é pai do atual presidente da Fiesp, Josué Gomes da Silva.

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Sobre reforma tributária, o ex-presidente prometeu encampar o assunto no início de um eventual governo e afirmou que é preciso aumentar a taxação sobre patrimônio. "Alguém vai ter de pagar a conta e o mais rico vai ter de pagar a conta", afirmou. "Se a gente conseguir desonerar cada vez mais a produção e aumentar a possibilidade de onerar o patrimônio da pessoa, a gente pode estar fazendo justiça tanto com o consumidor quanto com produtor", disse.

"Estou convencido de que logo depois da posse temos de colocar esse assunto para discutir", disse Lula, que prometeu tratar o tema de forma imediata se eleito. O ex-presidente afirmou que é preciso tornar o projeto público antes de levar à votação no Congresso.

No discurso, Lula cobrou que o empresariado se envolva para garantir aprovação de reforma tributária. "Essa é uma coisa que vou desafiar vocês, nós vamos ter que definir qual política tributária é boa para esse país. Porque, em abril de 2007, fiz uma política tributária e fui levar pessoalmente ao Congresso achando que ia ser aprovada por unanimidade. Até hoje não foi votada", disse. "Então é o seguinte, gente, cada um de vocês tem uma bancada naquele Congresso. Quando tiver uma proposta de reforma tributária nós vamos ter que fazer ela ser aprovada. Porque quando chega lá dentro são 513 reformas tributárias", afirmou.

Lula repetiu uma parte do discurso que tem feito reservadamente em reuniões com empresários, o de que irá governar, se eleito, com "credibilidade, estabilidade e previsibilidade". Ele defendeu que o País "volte à normalidade" e disse que "não haverá política de surpresa". Disse ainda que "ninguém quer desmontar o que está dando certo".

"Não vamos meia-noite apresentar um pacote. Na minha vida não existe isso. Tudo será público. É isso que eu vim dizer a vocês. Pensem no que vai acontecer nesse país", afirmou. "Não estou voltando à Presidência para fracassar", disse Lula.

Lula fala sobre teto de gastos

O PT vem sendo cobrado a apresentar o que pretende colocar no lugar do teto de gastos, que afirma revogar caso o ex-presidente Lula seja eleito. O petista falou sobre o assunto diante da plateia na Fiesp. "Me falam: você precisa falar de responsabilidade fiscal. Eu, sinceramente, fico às vezes até ofendido porque quem não tem responsabilidade cria lei de teto de gastos. Quem tem responsabilidade na sua origem não precisa de lei de teto de gastos", disse Lula, que relembrou sobre seus governos anteriores e disse que se compromete com responsabilidade, mas não indicou qual será a âncora a ser usada em um eventual governo.

Lula critica terceira via

Em um apelo ao voto útil no primeiro turno, Lula afirmou que não há opção na eleição deste ano, polarizada entre ele e o presidente Jair Bolsonaro. "Esse negócio que eu vejo todo dia nos jornais de uma terceira via. Na história da humanidade não existe terceira via. Deus e o diabo polarizam há quantos anos? Tentaram encontrar terceira via, gente, não existe", disse Lula. Aos empresários, ele chamou o presidente Bolsonaro de aventureiro.

"Esse é o momento do Brasil se apresentar ao mundo com a grandeza que ele tem. É o momento de se apresentar aos EUA, China, Europa. Mas é preciso ter gente séria para conversar. Se mandarmos gente com complexo de vira-latas não dará certo", disse Lula, em um dos momentos em que foi aplaudido. "Esse país está pronto. Essa coisa do Bolsonaro criar essa convulsão diplomática no mundo, isso vai ser para nós um filé mignon. Quando nós dois [ Lula e Alckmin ] chegarmos, esse Brasil vai voltar a crescer e vocês empresários vão voltar a ser respeitados [ no plano internacional ]", afirmou.

Em acenos ao agronegócio, Lula afirmou que há uma parte do setor preocupado com produção sustentável, mas é atrapalhado por "ministro dizendo que é preciso queimar [ florestas ] e passar a boiada logo". O petista também elogiou a tecnologia envolvida nas produções no País. "Muitas vezes a gente fala em commodities como se fosse um desdém, sem levar em conta quanto de engenharia e ciência e tecnologia via num grão de soja hoje", afirmou, aplaudido.

Lula também disse que, em diálogos recentes com empresários, questionou os motivos que levam o agronegócio a "gostar do Bolsonaro". "Queria saber o que o Bolsonaro fez de bom! Nada! Eu duvido alguém dizer o que ele fez pelo agro", disse. O ex-presidente ainda lembrou de programas voltados ao setor em seu governo.

Lula defendeu o rigor sobre a defesa ambiental e proteção climática, tema que foi destacado por Josué em sua apresentação de abertura. "A Europa vai definitivamente voltar a compreender que se quiser fazer investimento no Brasil para que a gente cuide da questão climática, ela vai ter gente com disposição para enfrentar qualquer grileiro e canavieiro que queira invadir área que não pode ser invadida. A questão climática é prioritária para a gente ganhar dinheiro e respeito", disse o petista.

Sobre reforma trabalhista, o ex-presidente afirmou que "muita gente ficou assustada" com posição da campanha do PT sobre o assunto, mas afirmou que ele historicamente defendeu a força das negociações coletivas. Ele também falou que os trabalhadores não querem voltar ao sistema passado e que a ideia é aprimorar as regras em vigor.

"Ninguém quer recuperar o que era em 1943, as pessoas querem evoluir. As pessoas estão querendo fazer coisas novas no país. Essa história de achar que trabalhador quer que o empresário quebre não é verdade", disse. Inicialmente, a campanha do petista falava em revogar a reforma trabalhista, mas passou a defender que o texto fosse revisado - e não revogado -, para amenizar críticas.

Lula defendeu o retorno à normalidade e enalteceu sua parceria com o ex-governador Geraldo Alckmin. "Como a gente pode viver num país em que o presidente conta sete mentiras por dia? Que chame uma carta que defende a democracia de cartinha? Quem sabe a carta que ele gostaria de ter é um feita por milicianos no Rio de Janeiro. E não uma carta feita por empresários, intelectuais defendendo o regime democrático, defendendo a urna eletrônica", disse Lula, que fez uma defesa enfática do atual processo eleitoral.

"Que negócio é esse de as Forças Armadas fiscalizarem as urnas? Os militares têm de fiscalizar nossas fronteiras, afirmou. Lula disse que o País vive uma crise de governabilidade e crise de "falta de sintonia" entre o estado e instituições que são garantia do próprio estado.

Ao tratar de sua parceria com Alckmin, disse que a aliança é "uma das grandes novidades políticas desse país". "Já fomos adversários. Esse jeitão dele bonzinho não foi tão bom na campanha. Eu tô com as canelas até agora machucadas", disse Lula arrancando risos da plateia. "E eu e ele resolvemos relegar a segundo plano e compor uma chapa", afirmou o petista. "Caneladas passam, é preciso olhar para o futuro", disse Alckmin, que voltou a repetir que o "hit" agora é "lula com chuchu".

"Essa junção só pode fazer as pessoas entenderem que não aconteceria se nós não tivéssemos convicção da nossa responsabilidade. Até porque estamos pegando um Brasil um pouco pior do que o que eu peguei em 2003, com um agravante, que é a falta de credibilidade internacional", disse Lula.

O economista e ex-presidente do BNDES André Lara Resende chegou à Fiesp acompanhando a comitiva do PT. Lula estava acompanhado também pelo candidato a vice, Geraldo Alckmin, pelo coordenador de seu plano de governo, Aloizio Mercadante, pelo candidato do PT ao governo do Estado de São Paulo, Fernando Haddad, pelo ex-chanceler Celso Amorim, pelo ex-governador Wellington Dias e pelo ex-ministro Luiz Dulci.

Lula tem ampliado o diálogo com empresariado de diferentes setores, para tentar desfazer o mal-estar entre atores econômicos com o PT. A presença da comitiva petista na Fiesp é possível diante do novo momento da entidade. Antes, sob o comando de Paulo Skaf, a Fiesp patrocinou uma campanha contra medidas adotadas no governo Dilma Rousseff. O "pato da Fiesp", mascote da ação da entidade, tornou-se um símbolo dos protestos contra Dilma, que foram cruciais para o caldo político e social que culminou no impeachment da petista.

O bom relacionamento de Lula com Josué Gomes da Silva já fez com que ele fosse cotado para ser vice do petista na eleição de 2018. Na época, o empresário era filiado ao então PMDB. No ano passado, a Fiesp recuou da ideia de divulgar um manifesto em defesa das instituições - e oposição aos atos de 7 de setembro contra o Supremo Tribunal Federal que vinham sendo convocados por bolsonaristas. Neste ano, por outro lado, a entidade está na liderança de um movimento pela defesa da democracia e do processo eleitoral articulado por empresários e sociedade civil, que deve culminar com um ato no dia 11 de setembro na Faculdade de Direito da USP.

Alckmin agradeceu "a posição da Fiesp na defesa da democracia". "As pessoas passam, as instituições ficam. O que precisamos é ter boas instituições. A nação é mais importante que o governo. O governo é o braço político do estado. A nação é nossa língua, nossa cultura, nossa religião. A luta dos que já morreram. A nação assinou a carta aos brasileiros", disse Alckmin.

Em um recado aos empresários, Alckmin afirmou ser necessário acompanhar os empresários em "preocupações" expostas pelo presidente da Fiesp, como a "competitividade", o combate à inflação, e o crescimento com sustentabilidade. "E, aqui, bem colocado, os acordos internacionais. O presidente Lula é um homem reconhecido no mundo inteiro e vai recolocar o Brasil na economia mundial", disse o ex-governador.

Lula já esteve na Fiesp em julho, para um almoço organizado por Josué Gomes da Silva. Na ocasião, o encontro foi reservado com nomes do empresariado de diversos setores - não apenas do industrial. A reunião de hoje é institucional e parte das rodadas de conversas que a Fiesp tem organizado com todos os candidatos à presidência. Bolsonaro havia confirmado participação em evento no dia 11, mas cancelou a presença e não remarcou nova data.

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