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Lasier, do PSD: O STF sob suspeita

Senador tenta aprovar sua PEC que passa o poder de escolha de ministros do Supremo para um colegiado de chefes do Judiciário, como acontece com a PGR

LASIER MARTINS: “Senadores não estão nem ligando para a opinião pública” / Divulgação

Raphael Martins

Publicado em 9 de março de 2017 às 16h14.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h24.

Desde a nomeação de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal, no final de fevereiro, o método de escolha de ministros está em xeque. A indicação de Michel Temer para o cargo, acatada pelo Senado, causou desconforto em parte da classe jurídica e nas ruas, que protestaram contra o fato de um homem da política assumir uma cadeira no mesmo Supremo que julgará crimes cometidos por políticos.

O senador Lasier Martins (PSD-RS) já estava atento aos conflitos de interesses no processo de indicação e, em 2015, escreveu um Projeto de Emenda Constitucional para mudar a forma de escolha de ministros do STF. A PEC 35/2015 está com tramitação avançada no Congresso, e a ideia básica é passar o poder de escolha para os chefes do Judiciário, num modelo que lembra bastante a escolha do procurador-geral da República. Em entrevista a EXAME Hoje, o senador critica as indicações dos últimos presidentes, fala sobre a permissividade do Senado e a falta de ouvidos dos parlamentares para a opinião pública.

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Desde a nomeação de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal, no final de fevereiro, o método de escolha de ministros está em xeque. A indicação de Michel Temer para o cargo, acatada pelo Senado, causou desconforto em parte da classe jurídica e nas ruas, que protestaram contra o fato de um homem da política assumir uma cadeira no mesmo Supremo que julgará crimes cometidos por políticos.

O senador Lasier Martins (PSD-RS) já estava atento aos conflitos de interesses no processo de indicação e, em 2015, escreveu um Projeto de Emenda Constitucional para mudar a forma de escolha de ministros do STF. A PEC 35/2015 está com tramitação avançada no Congresso, e a ideia básica é passar o poder de escolha para os chefes do Judiciário, num modelo que lembra bastante a escolha do procurador-geral da República. Em entrevista a EXAME Hoje, o senador critica as indicações dos últimos presidentes, fala sobre a permissividade do Senado e a falta de ouvidos dos parlamentares para a opinião pública.

Há muito tempo se fala em mudar o modelo de escolha do ministro, mas porque nada foi feito antes?
Pela dificuldade de mudar. É difícil mudar costumes, ainda mais um status quo do Judiciário. Como os governos têm na mão o domínio do Parlamento, continua tudo igual. Com toda a repercussão do caso atual, uns 20 senadores me adiantaram apoio para votar a PEC que enviei ao Congresso. Sei que será difícil e que o corporativismo vai pesar, com alguma entidade pedindo mais representatividade na comissão. Mas vamos conversar e acender o debate.

Como funciona seu projeto de lei? Como ele poderá corrigir tais distorções?
Apresentei em 2015 uma PEC que tenta restringir a nomeação de ministros do Supremo ao meio jurídico. Sete especialistas de carreira formariam uma comissão que escolheria três nomes para indicação do presidente. Os integrantes seriam os presidentes do Supremo, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Superior Eleitoral, do Trabalho e do Militar, mais o procurador-geral da República e o presidente do conselho federal da OAB. O candidato a ministro precisaria ter 15 anos na atividade jurídica e passaria por uma sabatina do Senado antes de ser empossado. Outra coisa é o mandato fixo. O cargo vitalício tem impedido que haja uma oxigenação e renovação da jurisprudência. O mundo anda rápido, mas ministros ficam 20, 30 anos no cargo.

Houve inspiração em algum modelo de fora?
Alemanha, França e Portugal são alguns que têm prazo fixo de mandato. O Direito Alemão tem 10 anos de prazo, França é de 12 anos… A comissão jurídica foi ideia minha. Quem tem que indicar o ministro é jurista, que esteja habilitado a escolher. A PEC está aprovada pela CCJ, na semana passada encaminhei um requerimento firmado pelos 14 líderes do Senado e entreguei em mãos ao presidente Eunício Oliveira (PMDB-CE), para que ele abra um calendário especial e vote em plenário o mais breve possível. Meu assessor legislativo foi avisado de que na próxima sessão será anunciada a data da colocação em pauta. A expectativa é ser apreciada dentro do mês de março.

Desde Floriano Peixoto [2º presidente do Brasil, entre 1891 e 1894], o Senado não rejeita um indicado ao Supremo. É inútil passar pelo Legislativo?
Há um problema de modelo. Nos Estados Unidos, uma sabatina para indicar um ministro da Suprema Corte leva meses. Aqui, tudo acontece em um dia, com falas normalmente dominadas por senadores governistas, que são, no fundo, os responsáveis pela indicação. Aí passa a ser inútil. Eu sempre fui um inconformado com essa forma de indicação, pois contraria a Constituição, que diz que os poderes são harmônicos e independentes. Na medida em que a Suprema Corte brasileira espera que o presidente da República indique um novo integrante, quando e como quiser, o Supremo se torna dependente. Por conta das indicações, de anos para cá, há uma politização do Supremo.

Acredita em politização dos ministros que compõem a Corte antes de Moraes?
O caso Alexandre de Moraes chega ao ápice para confirmação da tese de que o Supremo vem sendo politizado, mas os exemplos mostram. O Fernando Henrique Cardoso indicou um amigo pessoal ao tribunal, que é o Gilmar Mendes. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou Dias Toffoli, que sequer passou num concurso para juiz de São Paulo e foi advogado do PT. A ex-presidente Dilma Rousseff levou nove meses para escolher o sucessor de Joaquim Barbosa, usando a nomeação para especular e barganhar. No fim, escolheu Edson Fachin que, ainda que respeitável, fez campanha para ela em 2010. Felizmente, a prática não está totalmente guiada pelas pautas político-partidárias, mas chegamos ao limite dessa tendência com o Temer indicando um nome de dentro do governo, um ministro da Justiça vinculado ao PSDB. A desfiliação resolve? Não, porque o Supremo tem que se caracterizar por total imparcialidade, isenção e equidistância de ideologias.

Não caberia ao Senado corrigir isso na sabatina?
Tão logo um novo presidente da República assume, em razão dessa praga do “carguismo”, o parlamento assume compromissos para atender às vontades do governo. Os colegiados são dominados pelos governos de plantão e acabam respaldando as indicações. Se partirmos para uma comissão, fugimos deste vício.

Então o Senado vai ser loteado para qualquer coisa que o presidente queira?
Passar uma reforma é diferente. Faz parte da função de Executivo e Legislativo a negociação de pautas. Agora, o presidente da República compor o Supremo ao seu gosto, com apoio de um Parlamento comprometido, está errado. Isso é uma deformação, um poder interferindo no outro. Contraria a doutrina tripartite, não é possível que uma pessoa administre, legisle e julgue.

O senhor desconfia da atuação de Moraes daqui para a frente, em função das relações partidárias?
Não posso fazer essa ligação. Mas veja quantas manifestações, quantos comentários em rádio, jornal e televisão, quantas críticas surgiram pondo em suspeição a sua conduta. Agora ficamos na dependência de avaliar o ministro a cada processo que ele for julgar.

Ainda assim, Moraes foi aprovado. O Senado deixou de ouvir a opinião pública?
(Risos). Não estão nem ligando.

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