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Haddad vai conseguir herdar os votos de Lula?

Apoio do ex-presidente preso será suficiente para impulsionar seu substituto? Analistas avaliam a estratégia (e o potencial) de transferência

Fernando Haddad, candidato do PT, em entrevista para a mídia estrangeira em 13 de setembro (Nacho Doce/Reuters)

Fernando Haddad, candidato do PT, em entrevista para a mídia estrangeira em 13 de setembro (Nacho Doce/Reuters)

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Isabel Seta

Publicado em 14 de setembro de 2018 às 06h00.

Última atualização em 14 de setembro de 2018 às 08h56.

São Paulo - “Lula é Haddad presidente”.

Foi assim que o perfil de Fernando Haddad no Instagram marcou a oficialização da troca do cabeça na chapa petista na última terça-feira (11).

Sai o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que teve a candidatura barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com base na Lei da Ficha Limpa, e entra Haddad, até então candidato a vice na coligação “O Povo Feliz de Novo”. Manuela D’Ávila (PCdoB), terceiro elemento da chapa "tríplex", é a nova candidata oficial a vice.

A troca por Haddad já era esperada há meses, mas agora o ex-ministro da Educação e ex-prefeito de São Paulo pode ser finalmente apresentado como candidato e participar de debates e sabatinas como tal - ainda que sempre frisando o apoio de Lula. Nesta sexta-feira, por exemplo, ele participa de sabatina do Jornal Nacional, a mesma de que participaram os outros presidenciáveis no final de agosto.

A estratégia de manter o ex-presidente no foco até o limite do tempo serviu a dois objetivos: o primeiro foi mostrar para a militância que o partido não havia desistido dele e o segundo, mais importante, foi visando garantir a maior transferência de votos possível para Haddad.

Lula, afinal, liderava as pesquisas de intenção de voto com taxas que chegaram a 39%. A dúvida agora é se Haddad conseguirá captar uma parcela suficiente deste bolo para chegar ao segundo turno. Na opinião dos analistas ouvidos por EXAME, é muito provável que sim.

Votos automáticos

Segundo Renato Meirelles, diretor do instituto de pesquisa Locomotiva, a transferência de votos ocorre em dois níveis. O primeiro, praticamente automático, vem dos eleitores não apenas lulistas, mas também petistas.

De acordo com o Datafolha, o PT é o partido brasileiro com maior preferência partidária. Além disso, o último levantamento eleitoral do instituto mostrou que 33% dos brasileiros “com certeza votaria” no candidato indicado por Lula. Para conquistar esses eleitores, portanto, bastaria insistir que “Haddad é Lula; Lula é Haddad".

Um sinal de que este processo já está em curso é o aumento do grupo que cita Haddad na pesquisa espontânea: 4% dos eleitores, segundo as pesquisas Ibope e Datafolha mais recentes. Antes, era menos de 1%.

Para Meirelles, bastaria os votos desses eleitores mais cativos do PT para levar Haddad ao patamar de 15% das intenções de voto nos próximos levantamentos.

“É o piso de qualquer candidatura do PT. Não existe um candidato do partido ter menos que isso, ainda mais agora que Haddad passa a ter cobertura dos telejornais como candidato”, diz Meirelles.

No cálculo de Christopher Garman, cientista político e diretor para as Américas da consultoria Eurasia, se Haddad conquistar três quartos dos petistas, já ficaria próximo de 20% das intenções de voto.

Transferência não automática

O segundo nível de transferência de votos é mais difícil, pois exige que o ex-prefeito conquiste os eleitores que gostariam de votar em Lula, mas que não são necessariamente petistas. E para isso, diz Meirelles, a campanha de Haddad terá que ir além da associação entre os dois nomes.

A vantagem do PT nesta área é contar com o segundo maior tempo de televisão, além da maior estrutura partidária.

“O PT tem o maior número de diretórios municipais e o maior número de filiados entre os partidos”, diz Thiago Vidal, analista político da consultoria Prospectiva.

“O partido sabe fazer campanha e tem uma experiência de disputa eleitoral de décadas”, destaca Lincoln Secco, historiador, professor da USP e autor do livro “A História do PT”.

Dificuldades

O maior obstáculo para Haddad nessa transferência tem nome: Ciro Gomes (PDT), que já foi inclusive ministro de Lula.

Dos cinco líderes nas pesquisas, Ciro tem o menor nível de rejeição: 20% afirmam que não votariam nele de jeito nenhum, contra 22% de Haddad, segundo o Datafolha.

Ambos tem seus menores percentuais de rejeição no Nordeste (15% nos dois casos). A região tem sido o foco de Ciro nas últimas semanas e os resultados apareceram: Ciro subiu 6 pontos percentuais e foi de 14% para 20% na região, também segundo o Datafolha.

“Ciro tem o problema do tempo de televisão, mas acertou fortemente na narrativa de [tirar nomes do] SPC, que fala de forma direta a um problema das pessoas, e em passar tempo no Nordeste captando os votos do Lula”, afirma Meirelles. “A questão é se ele consegue segurar esses votos.”

Ciro e Haddad devem, inclusive, disputar os mesmos palanques em alguns estados do Nordeste. Um exemplo é o Ceará, estado do pedetista, onde Camilo Santana (PT) concorre à reeleição com uma vice do PDT na chapa.

Outro caso é o do Maranhão, onde o governador Flávio Dino (PC do B) disputa a reeleição em uma coligação de 16 partidos - incluindo o PT, de Haddad, e o PDT, de Ciro.

No entanto, Ciro pode vir a perder para Haddad alguns dos eleitores que hoje votam nele. Uma coluna da Folha de S.Paulo aponta que 11% daqueles que votariam em Ciro acham que ele é o indicado por Lula, outros 38% dos eleitores do pedetista não sabem quem é o substituto do ex-presidente.

Apesar disso, Garman não acredita que a campanha petista vá, pelo menos em um primeiro momento, tentar atacar Ciro, já que tem a tarefa mais urgente de consolidar o nome de Haddad.  Mas o movimento contrário deve acontecer: na medida que cresce, Haddad se torna alvo privilegiado.

Para Vidal, da Prospectiva, Haddad tem ainda outra vantagem, a complementaridade de votos: em geral, o eleitor de Lula é de classe baixa e de baixa escolaridade, enquanto o de Haddad é mais de classe alta e alta escolaridade.

“Ele pode conseguir unir dois pólos de eleitores que os outros candidatos não conseguem”, afirma.

Secco acredita que se o PT não cometer "erros colossais”, a estratégia deve ser bem-sucedida, com Haddad herdando a maior parte do espólio lulista. A Eurasia aposta em um segundo turno entre Bolsonaro e Haddad. Mas os últimos acontecimentos mostram que essa campanha é tudo, menos previsível.

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