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Com Flávio, eleição será um plebiscito sobre Bolsonaro, diz analista

Para Creomar de Souza, da Dharma, a escolha do ex-presidente foi de alguém que "vai com tudo e contra tudo" para garantir um perdão em caso de vitória, além de manter o capital político com a família

Flávio Bolsonaro: escolha mantém capital político de Bolsonaro com alguém da família (Edilson Rodrigues//Agência Senado)

Flávio Bolsonaro: escolha mantém capital político de Bolsonaro com alguém da família (Edilson Rodrigues//Agência Senado)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 6 de dezembro de 2025 às 08h01.

A escolha do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de indicar o nome do seu filho, Flávio Bolsonaro (PL), para ser o nome da direita nas eleições de 2026 mantém os votos com a família e torna a disputa em uma espécie de plebiscito sobre se Bolsonaro deve continuar preso ou ser solto, segundo Creomar de Souza, CEO da consultoria de análise de risco político Dharma.

"A bandeira do bolsonarismo é para transformar a eleição em um plebiscito sobre Bolsonaro, para que ele siga como um sinônimo de ser de direita no Brasil", afirma Creomar em entrevista à EXAME. 

O analista explica que a escolha do ex-presidente foi de alguém que "vai com tudo e contra tudo" para garantir uma "graça constitucional" — perdão de pena que pode ser concedido pelo presidente da República — em caso de vitória, além de manter o capital político com a família.

Nomes como o dos governadores Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Ratinho Jr. (PSD) eram apontados como potenciais nomes para substituir Bolsonaro no pleito do próximo ano.

"Ao dizer que o candidato é o Flávio, o bolsonarismo prefere correr o risco de perder do que transferir legado", diz.

Bolsonaro começou a cumprir a pena de 27 anos e 3 meses de prisão por tentativa de golpe de Estado no fim de novembro após a conclusão do processo na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).

O analista afirma que a força de Bolsonaro deverá garantir que Flávio tenha pelo menos dois dígitos na eventual disputa de primeiro turno.

Na Paraná Pesquisas, divulgada em novembro, Flávio aparece com 19,7% das intenções de voto no primeiro turno. Nas contas de aliados, esse percentual poderia levá-lo ao segundo turno contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em cenário de segundo turno, o primogênito de Bolsonaro aparece com 38,6% contra 45,4% do petista.

Ao mesmo tempo, ele afirma que a falta de um partido controlado pela família torna o grupo político do ex-presidente frágil. Hoje, toda a família e aliados estão no PL, sigla do Valdemar da Costa Neto.

"O bolsonarismo é muito frágil porque, ao não ter construído uma estrutura burocrática, é dependente de outras forças para manter a imagem do Bolsonaro viva", afirma.

Disputa sobre quem errar menos

Para Creomar, a eleição se desenha novamente como uma corrida do lulopetismo contra o bolsonarismo e ganhará quem errar menos. Ele defende ainda que será a eleição da transferência do legado. "É um jogo de quem erra menos. Porque todo mundo tem errado muito e dado munição para o outro lado", afirma.

O CEO da Dharma avalia que de partida o movimento favorece o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pois inclui o fator polarizante na disputa presidencial. "O Lula chega à eleição pior do que ele imaginava em 2023, mas melhor do que em janeiro de 2025. O governo Lula tem suas falhas, mas ainda tem muita força. Ele precisa da polarização, porque, sem ela, teria mais dificuldade em manter a mobilização. O Lula sempre ganhou eleições polarizando", diz.

Leia a entrevista completa com Creomar de Souza, CEO da consultoria de análise de risco político Dharma.

Como você vê o cenário desenhado para 2026? 

Hoje, 5 de dezembro, temos uma probabilidade de que o Flávio seja candidato. Sabemos que tudo muda, mas ele está se consolidando. Vínhamos avisando aos clientes há algumas semanas que esse era o cenário base. Em termos de grandes tendências, o que posso dizer é que a eleição será, efetivamente, entre o lulopetismo e o bolsonarismo. Nos nomes, o que sempre observamos com cautela é que o próprio Lula disse que era candidato, mas, dias depois, disse que ia pensar até março e depois voltou atrás de novo.

Por que esses movimentos acontecem? 

Isso acontece porque as coisas mudam muito rápido. Em janeiro, o governo estava numa situação em que o Lula tinha muito claro que não valeria a pena o risco de destruir sua própria biografia, que já é, em determinado sentido, triunfante ao sair da prisão e se tornar presidente. Aí vem toda a celeuma do Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos e todos os desdobramentos daí derivados, e o Lula vê que está em um ótimo momento. Mas vem a operação Contenção no Rio de Janeiro e o governo bate cabeça de novo — além de outras falas do presidente, como aquela sobre a relação entre usuários de drogas e traficantes. O que temos visto até aqui é que me parece uma corrida do lulopetismo contra o bolsonarismo, em que quem errar menos vai levar. Porque todo mundo tem errado muito e dado munição ao outro lado.

Como se desenham as intenções de cada grupo político nessa próxima eleição? 

Será uma eleição voltada para consolidar o legado do Lula e o bolsonarismo tentando transformá-la em um plebiscito sobre o Bolsonaro, porque isso manteria o bolsonarismo como um sinônimo de direita no Brasil. O Lula está se esforçando para consolidar o legado, eliminando qualquer tipo de dissensão à esquerda. Ele está preocupado em garantir que não haja alternativas à esquerda que possam enfraquecer o governo. O presidente sabe que a eleição vai ser muito apertada, então está trabalhando para garantir essa união.

O que significa a escolha de Flávio como candidato? 

Com o Flávio como candidato, o bolsonarismo faz uma escolha clara. Ao escolher Flávio, eles preferem perder do que transferir o legado para outro nome. Isso torna a eleição mais favorável para o Lula, porque o bolsonarismo acaba tornando a eleição um plebiscito sobre o Bolsonaro.

Qual seria o grande dilema da direita na eleição? 

A direita tem um dilema importante. Bolsonaro foi o grande artífice, a grande figura que reconfigurou a direita no Brasil. Ele foi o cara que derrotou o PT, algo que o PSDB não conseguiu. Mas a direita, ao reassumir essa figura, tem um dilema. Nomes como Ratinho Júnior, Tarcísio de Freitas, Ronaldo Caiado e Romeu Zema surgem mais como símbolos dessa nova onda conservadora, mas têm um problema: falta projeção nacional. Não têm o carisma do Bolsonaro, o que limita suas chances.

E como vê a organização do bolsonarismo? 

O bolsonarismo tem uma grande fragilidade, porque não tem uma estrutura partidária sólida. Ele se utiliza de outras redes, como as igrejas evangélicas e o PL, mas não construiu um partido próprio. E o problema disso é que, sem essa estrutura partidária, o bolsonarismo fica dependente de outras forças para manter sua imagem viva. Ele é forte, mas muito frágil.

Qual é o papel da família Bolsonaro nesse cenário?

A família Bolsonaro tem um papel central. Eles são o principal ponto de apoio do bolsonarismo. Mas, ao mesmo tempo, há divisões dentro da família que podem prejudicar a candidatura de Flávio. O fato de Michelle, por exemplo, tentar fortalecer sua própria posição política, indo contra os filhos de Bolsonaro, cria uma dinâmica interna de insubordinação. Isso pode impactar o bolsonarismo, pois essa disputa interna enfraquece o projeto político.

Existe uma questão importante: o bolsonarismo precisa garantir que a eleição seja sobre Bolsonaro, porque, com isso, ele mantém o controle do discurso. O dilema para Bolsonaro e seus filhos é quem vai assumir o legado do presidente. Se a eleição for uma disputa de legado, a família Bolsonaro tem que definir se vai entregar esse legado a alguém fora da família, o que não parece ser o caso, ou se vai centralizar tudo.

E em relação a Lula, como ele chega para essa disputa?

O Lula chega à eleição pior do que ele imaginava em 2023, mas melhor do que em janeiro de 2025. O governo Lula tem suas falhas, mas ainda tem muita força. Ele precisa da polarização, porque, sem ela, ele teria mais dificuldade em manter a mobilização. O Lula sempre ganhou eleições polarizando, e isso é essencial para ele.

E você acha que outros nomes da direita, como Caiado, Ratinho Júnior ou Zema, vão recuar e apoiar o Flávio?

Não acho que todos vão recuar. Alguns nomes, como o Caiado, que já tem uma boa base, podem tentar se lançar de forma independente. A questão é que esses governadores não querem perder sua base local. O centrão, por exemplo, está muito mais preocupado com as eleições legislativas, pois cada deputado garante muito mais em termos financeiros do que uma eleição presidencial.

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