Atual legislatura é a mais "infiel" dos últimos dez anos
Desde janeiro de 2015, quando iniciou esta legislatura (2015-2019), até agora, um de cada quatro parlamentar mudou de partido
Estadão Conteúdo
Publicado em 25 de setembro de 2017 às 10h59.
Última atualização em 25 de setembro de 2017 às 10h59.
São Paulo - O plenário que discute a reforma política na Câmara é o que vivenciou o maior número de trocas partidárias nos últimos dez anos. Desde janeiro de 2015, quando iniciou esta legislatura (2015-2019), até agora, um de cada quatro parlamentar mudou de partido. No total, foram 124 deputados "infieis" e, destes, 31 mudaram mais de uma vez.
O "mercado de vagas" dos partidos escancarou nesta semana uma briga entre DEM e PMDB, com críticas do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), às iniciativas do partido do presidente Michel Temer em arrematar deputados que já estavam em negociação com a sua sigla (mais informações nesta página).
Segundo dados da Câmara, foram quase 400 trocas desde 2007, quando o Supremo Tribunal Federal determinou que os mandatos pertencem aos partidos, não a deputados e vereadores. Desde então, só dois deputados perderam o mandato por infidelidade partidária, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ambos eram do DEM. Walter Brito Neto (PB), em 2006, e Robson Rodovalho (DF) dois anos depois. Do total de trocas, 160 foram feitas desde o começo de 2015. E as mudanças devem se intensificar em março, quando está prevista a janela partidária, brecha para a troca sem o risco de perda do mandato.
Apesar de criticadas pelos próprios parlamentares, as propostas relativas à troca de siglas não avançaram nas discussões da reforma política. A supressão dos artigos que tratam de fidelidade partidária será, segundo a deputada Shéridan (PSDB-RR), um dos poucos consensos na votação do segundo turno de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) da qual é relatora, prevista para ocorrer amanhã na Casa.
O relatório da deputada propõe estender a regra da fidelidade partidária para cargos majoritários e seus vices e prevê que o candidato eleito por um partido que não atingir a cláusula de barreira pode mudar de sigla. A cláusula de barreira impõe restrições à legenda que não alcançar determinado porcentual de votos. "Eu acho que não ficou como queríamos, mas podia ser pior. Foi a construção política que conseguimos", afirmou Shéridan.
Para o cientista político da Arko Advice Murillo Aragão, o levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo com base em informações da Câmara indica uma "indústria de partidos". "Troca de partido não é necessariamente um problema, mas não pode ser abusivo. O mundo político desmoraliza os partidos ao permitir a criação de legendas sem orientação programática."
Por outro lado, a professora de Ciência Política da Unicamp Andréia Freitas disse ver com naturalidade o aumento das mudanças. "Em momentos de crise, é normal que haja uma maior movimentação entre os partidos. Neste momento, a que estamos vivendo é a (Operação) Lava Jato. Os políticos estão calculando qual o melhor lugar para disputar reeleição, estão se reposicionando."
Janela
Em março de 2016, quando ocorreu a primeira janela partidária, houve 94 trocas de partido. Por meio dela, o parlamentar não tem direito à "portabilidade" - levar tempo de TV e recursos do Fundo Partidário para a nova legenda. Pela regra, a troca durante o mandato, fora da janela, só é permitida se houver "justa causa" - discriminação política pessoal, mudança no programa partidário ou se o parlamentar quiser migrar para um partido recém-criado.
Inicialmente, o relatório de outra PEC sobre reforma política, de autoria do deputado Vicente Cândido (PT-SP), previa antecipar a janela para dezembro, mas, sem consenso, a data foi mantida em março.
Na avaliação do professor de Direito do Mackenzie Diogo Rais, a janela partidária "desrespeita o laço com a sociedade". "É uma janela casuística. Não é isonômico, pois quem mudou de partido uma semana depois tem de responder por isso", afirmou o professor. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo .