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Flipboard é ideia de milhões

Mike McCue, o criador do Flipboard, aplicativo para iPad que teve mais de 20 milhões de downloads na App Store, conta como pensa seus novos negócios

A ideia do Flipboard nasceu numa conversa informal entre Mike McCue e Evan Doll, os fundadores da empresa (Divulgação)
DR

Da Redação

Publicado em 18 de maio de 2011 às 10h50.

São Paulo -- Aos 43 anos, alguns cabelos grisalhos e muitas histórias para contar, o americano Mike McCue é um legítimo desbravador de oportunidades na internet. Desde o começo dos anos 1990, já bolou (e ganhou um bom dinheiro com isso) programas para realidade virtual e reconhecimento de voz. Foi vice-presidente de tecnologia da Netscape, negociou uma de suas invenções, o Tellme, com a Microsoft e acaba de entrar para o conselho do Twitter.

Agora, o hiperativo McCue está surfando na onda da sua última invenção: o Flipboard. Trata-se de um aplicativo desenvolvido para o iPad que se tornou um fenômeno, com mais de 20 milhões de downloads desde o lançamento, em abril do ano passado. O programa registra suas redes sociais e as repagina no formato de uma revista digital. Assim, o usuário visualiza, a partir da página inicial do Flipboard, os últimos posts do Facebook e as imagens de forma muito mais atraente que uma simples lista cronológica.

Os feeds, links, vídeos e fotos enviados pelos amigos aparecem no tablet como seções de uma revista. Ao clicar em um link na tela do iPad, é possível ler mais sobre o autor ou responder a uma mensagem. Ao colocar dois dedos juntos e puxar o post para baixo, a pessoa tem acesso ao resto da conversa ou pode colocar os assuntos em categorias como notícias, artes ou esportes.

Revistas no tablet

O Flipboard também pode agregar um pedaço do conteúdo de publicações que permitem o compartilhamento, como as revistas Wired, Fortune, The Economist, Bon Appétit, The Washington Post Magazine, o jornal San Francisco Chronicle, os guias de viagem Lonely Planet, entre outros que publicam links e trechos nas redes sociais. Tudo é atualizado constantemente. “O conteúdo do site das publicações é apresentado de um jeito diferente, muito mais bonito, e pode ser folheado”, afirmou Mike McCue em entrevista no escritório da empresa, instalado num casarão branco com móveis vermelhos e repleto de MacBook Pros, iPads e iPhones, no centro de Palo Alto, a cidade que se tornou o epicentro das novidades no mundo da internet.

No total, são sete categorias de conteúdo no Flipboard, tudo bonito e bem organizado, como uma boa revista de estilo, só que concebida de maneira diferente por cada usuário. “Trata-se de uma nova forma de agregar nosso conteúdo a uma plataforma e mostrá-lo para uma nova audiência”, diz Michele Slack, vice-presidente de mídia do jornal San Francisco Chronicle.


No Flipboard, a primeira página mostra os itens mais recentes dos posts feitos nos sites de relacionamentos. No lugar dos 140 caracteres e links típicos do Twitter, os tópicos são convertidos em textos e imagens, como acontece no papel. Quando chegam novas notícias, basta dar um zoom no artigo para ler o conteúdo. Vídeos ou fotos também ficam disponíveis. E, claro, é possível comentar e interagir.

Um exemplo prático? Se um amigo lhe envia pelas redes sociais uma reportagem que inclui uma foto, no Flipboard ela aparece como uma imagem bem mais vistosa do que no thumbnail que acompanha os primeiros parágrafos da história — tudo isso com as funcionalidades interativas que nenhuma publicação impressa pode igualar. Basta um toque do dedo para que a foto se expanda para a tela inteira do tablet. A um toque no link, tem-se acesso à notícia, ainda mais completa, e com a possibilidade de fazer comentários. “O Flipboard acaba com o caos gerado por imagens, atualizações e links enviados por vários amigos”, escreveu a revista Time, que considerou o aplicativo criado por McCue uma das 50 melhores invenções de 2010.

Sucesso instantâneo

O paradigma de McCue para seu Flipboard são as revistas e os jornais bem desenhados. “Pensamos em colocar à disposição das pessoas a beleza das páginas impressas para juntar às suas redes sociais”, diz McCue. “Adoro a National Geographic, a Wired, o Wall Street Journal e detesto as listas feiosas, com imagens pequenas e sem graça, como as que hoje aparecem no Twitter e no Facebook, sem recursos de tipografia, nas quais todo mundo parece igual e banal.” Com tantos recursos e ainda por cima gratuito, o Flipboard é um dos aplicativos mais bem-sucedidos para o iPad. Foi escolhido pela Apple o aplicativo do ano, em 2010, e foi tão requisitado para downloads, logo depois de seu lançamento, que derrubou o servidor onde estava hospedado.

Curiosamente, nem uma raposa experiente como McCue havia se preparado para tanto interesse. “Eu testei o Flipboard com amigos, mas sabia que tinha apenas uma chance de causar boa impressão na App Store. Eles gostaram, mas não imaginávamos o tamanho da procura”, diz McCue. O programa bombou também entre donos de revistas e jornais. Quatro dias após o lançamento, 130 editores ligaram para McCue. Queriam saber como colocar seu conteúdo na aplicação.


Conversa entre amigos

O Flipboard nasceu de uma conversa entre amigos. Aconteceu no verão de 2009, semanas depois de McCue deixar a Microsoft, onde estava para completar o processo de venda e consolidação de seu sistema de reconhecimento de voz Tellme, adquirido pela empresa de Bill Gates. Na conversa, de um lado estava McCue e do outro o engenheiro Evan Doll, especialista em aplicativos para iPhone, ex-funcionário da Apple e hoje sócio do Flipboard.

Num tempo em que as únicas informações concretas sobre o tablet da Apple eram rumores, os dois discutiam a feiura da web. “Começamos a imaginar como seria fazer a internet a partir do zero. Nossa proposta era consertar seus pontos fracos e aproveitar recursos usados na imprensa”, diz McCue. “Foi assim que pensamos que havia uma oportunidade para desenvolver uma companhia capaz de fazer a web um lugar mais bonito e menos complicado.” Sentado numa das poltronas vermelhas de seu escritório, que contrastam com as paredes brancas da casa, McCue conta que, quando o tablet da Apple finalmente chegou ao mercado, eles adaptaram para a nova plataforma a proposta de uma revista que agrega conteúdo das redes sociais.

A partir daí, tudo correu muito rápido. Segundo McCue, foram seis meses para a programação, mais três para as interfaces. “No dia em que Steve Jobs apresentou o iPad, pensei: Uau, isso será perfeito para a gente.” Mas era preciso um pouco mais do que uma interface bonita e prática. Para não se perder no universo gigante das redes sociais, McCue e Doll buscaram parceiros que poderiam ajudá-los com dados e informações. Entraram em contato com a Ellerdale, uma pequena empresa de Menlo Park, a oito minutos de carro de Palo Alto, que havia criado um sistema de análise semântica para estudar e destacar informações de acordo com sua relevância.

“Hoje, somos especializados em analisar e filtrar fluxos de dados”, diz Christel van der Boom, holandesa radicada na Califórnia e diretora de marketing do Flipboard. Na equipe está ainda o designer argentino Marcos Weskamp, com formação acadêmica no Japão e experiência com revistas e sites criativos. “Quando cheguei ao Flipboard, em março de 2010, a proposta que recebi foi de fazer um programa para a internet que tivesse as qualidades de uma revista, a começar pela simplicidade”, diz Weskamp. “Quando se desenha uma interface digital é muito fácil cair na tentação de agregar botões, opções, modos diferentes de navegação. A nossa proposta foi colocar o mínimo indispensável para navegar no conteúdo rico em texto, imagens e vídeo.” Weskamp nunca havia trabalhado com McCue ou Doll. Foi encontrado graças à rede de contatos de McCue, que está sempre em movimento.


99 centavos por download

Caso cobrassem 99 centavos de dólar de cada usuário que baixasse o Flipboard, McCue, Doll e seus amigos da casa de móveis vermelhos ganhariam um bom dinheiro. Mas essa não é a ideia. O plano de negócios do Flipboard prevê a venda de anúncios. Como o iPad permite navegar nas páginas nas posições horizontal ou vertical, a turma do Flipboard já começou a bolar publicidade tirando proveito dessa interação. Um exemplo é a campanha da vodka Nikita. Ela mostra uma bela mulher de pé, e que aparece deitada quando o tablet é virado. McCue quer usar esse tipo de recurso para multiplicar o preço dos anúncios. Pelo seu raciocínio, na medida em que o Flipboard gerar valor e obtiver adesões, os publicitários o levarão cada vez mais em consideração para suas campanhas interativas.

Para tornar-se inovador, Mike McCue precisou enxergar longe. Quando era adolescente, seu sonho era ser astronauta. Aos 14 anos, criou seu primeiro software, um joguinho chamado Shuttle Flight, em uma máquina com minguados 16 quilobytes de memória RAM que pertencia ao clube de alunos da escola. Já incorporado à pele de geek, bolou videogames para se divertir. O mais bem-sucedido foi o Night Mission, baseado na malsucedida tentativa do presidente americano Jimmy Carter de resgatar soldados detidos no Irã. O objetivo era salvar os reféns com um helicóptero.

Astronauta frustrado

Quando McCue estava se preparando para entrar para a Academia da Força Aérea dos Estados Unidos, o primeiro passo para quem quer ir para o espaço em uma nave da NASA, seu pai morreu de câncer. Como era o mais velho de uma família de seis irmãos, precisou trabalhar. “No lugar da West Point (a academia que forma candidatos a astronauta) acabei na IBM”, diz McCue. Por três anos ele mergulhou em programas e ferramentas para gráficos, relações com consumidores e redes. Com a experiência adquirida no mundo corporativo, resolveu que era hora de tocar uma carreira solo.

“Para começar uma companhia do zero é preciso três coisas: uma boa ideia, paixão e as pessoas certas”, diz McCue. Era 1989, quando obteve 100 mil dólares de oito investidores e abriu uma empresa na garagem da casa de sua mãe. Criou uma ferramenta, a Sidebar, que tornava mais amigável a operação da primeira versão do Windows. Vendeu os direitos de utilização para a IBM inicialmente por 250 mil dólares, depois renegociados pelo dobro desse valor com outra companhia.


Dali, para tocar sua primeira empresa formal, a Paper Software, foi um pulo. Quando começou, ficava em um pequeno prédio, acima de um restaurante indiano e de uma livraria, em Woodstock, a 175 quilômetros de Nova York. Apesar das instalações modestas, tinha uma grande sacada: era uma companhia especializada em plataformas digitais de realidade virtual, capaz de mostrar gráficos complexos em 3D. Acabou comprada pela Netscape (especula-se que por 20 milhões de dólares) e McCue foi incorporado à direção da equipe do primeiro navegador para a internet.

“O objetivo de quem monta uma startup nunca é vender, mas desenvolver um negócio novo e independente”, afirma McCue. “Mas um CEO tem de estar atento às oportunidades, inclusive para que sua criação possa ter um futuro muito além do que ele pode dar.” Dez anos depois, lá estava McCue com outro projeto, o do Tellme, um programa de reconhecimento de voz em que as solicitações para um banco de dados são dadas verbalmente e não por teclado. Tornou-se um padrão para browsers de voz e foi vendido à Microsoft por 800 milhões de dólares.

Carros conectados

O Tellme hoje é usado nos carros da Ford, nos Estados Unidos. Parte dos lucros foi dividida com investidores como o Benchmark Capital (que bancou o e-Bay) e o Kleiner Perkins Caufield & Byers (que acaba de aplicar 200 milhões de dólares no Twitter e já investiu na Amazon e na AOL). “Enxerguei que não teria condições financeiras para levar o Tellme aos limites que uma grande corporação poderia, por isso decidi negociá-lo”, diz McCue. “Era isso ou tentar uma fusão com outra empresa pequena.” Cravou a primeira alternativa e partiu para outra.

No Vale do Silício, a onda dos tempos atuais é incubar uma ideia brilhante o suficiente para atrair gigantes da tecnologia interessados em aumentar o portfólio de produtos ou investidores ávidos por negócios inovadores. Foi assim que McCue cresceu e enriqueceu. “Quando se tem um currículo com realizações não é difícil conseguir dinheiro para uma boa ideia”, diz McCue, antes de sair para uma reunião de trabalho pedalando sua bicicleta. Com gigantes como o Yahoo! e o Google de olho no conceito das redes sociais, e plataformas como o Android mergulhando com tudo no mundo dos tablets, não duvide que em breve McCue virá com mais novidades.

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São Paulo -- Aos 43 anos, alguns cabelos grisalhos e muitas histórias para contar, o americano Mike McCue é um legítimo desbravador de oportunidades na internet. Desde o começo dos anos 1990, já bolou (e ganhou um bom dinheiro com isso) programas para realidade virtual e reconhecimento de voz. Foi vice-presidente de tecnologia da Netscape, negociou uma de suas invenções, o Tellme, com a Microsoft e acaba de entrar para o conselho do Twitter.

Agora, o hiperativo McCue está surfando na onda da sua última invenção: o Flipboard. Trata-se de um aplicativo desenvolvido para o iPad que se tornou um fenômeno, com mais de 20 milhões de downloads desde o lançamento, em abril do ano passado. O programa registra suas redes sociais e as repagina no formato de uma revista digital. Assim, o usuário visualiza, a partir da página inicial do Flipboard, os últimos posts do Facebook e as imagens de forma muito mais atraente que uma simples lista cronológica.

Os feeds, links, vídeos e fotos enviados pelos amigos aparecem no tablet como seções de uma revista. Ao clicar em um link na tela do iPad, é possível ler mais sobre o autor ou responder a uma mensagem. Ao colocar dois dedos juntos e puxar o post para baixo, a pessoa tem acesso ao resto da conversa ou pode colocar os assuntos em categorias como notícias, artes ou esportes.

Revistas no tablet

O Flipboard também pode agregar um pedaço do conteúdo de publicações que permitem o compartilhamento, como as revistas Wired, Fortune, The Economist, Bon Appétit, The Washington Post Magazine, o jornal San Francisco Chronicle, os guias de viagem Lonely Planet, entre outros que publicam links e trechos nas redes sociais. Tudo é atualizado constantemente. “O conteúdo do site das publicações é apresentado de um jeito diferente, muito mais bonito, e pode ser folheado”, afirmou Mike McCue em entrevista no escritório da empresa, instalado num casarão branco com móveis vermelhos e repleto de MacBook Pros, iPads e iPhones, no centro de Palo Alto, a cidade que se tornou o epicentro das novidades no mundo da internet.

No total, são sete categorias de conteúdo no Flipboard, tudo bonito e bem organizado, como uma boa revista de estilo, só que concebida de maneira diferente por cada usuário. “Trata-se de uma nova forma de agregar nosso conteúdo a uma plataforma e mostrá-lo para uma nova audiência”, diz Michele Slack, vice-presidente de mídia do jornal San Francisco Chronicle.


No Flipboard, a primeira página mostra os itens mais recentes dos posts feitos nos sites de relacionamentos. No lugar dos 140 caracteres e links típicos do Twitter, os tópicos são convertidos em textos e imagens, como acontece no papel. Quando chegam novas notícias, basta dar um zoom no artigo para ler o conteúdo. Vídeos ou fotos também ficam disponíveis. E, claro, é possível comentar e interagir.

Um exemplo prático? Se um amigo lhe envia pelas redes sociais uma reportagem que inclui uma foto, no Flipboard ela aparece como uma imagem bem mais vistosa do que no thumbnail que acompanha os primeiros parágrafos da história — tudo isso com as funcionalidades interativas que nenhuma publicação impressa pode igualar. Basta um toque do dedo para que a foto se expanda para a tela inteira do tablet. A um toque no link, tem-se acesso à notícia, ainda mais completa, e com a possibilidade de fazer comentários. “O Flipboard acaba com o caos gerado por imagens, atualizações e links enviados por vários amigos”, escreveu a revista Time, que considerou o aplicativo criado por McCue uma das 50 melhores invenções de 2010.

Sucesso instantâneo

O paradigma de McCue para seu Flipboard são as revistas e os jornais bem desenhados. “Pensamos em colocar à disposição das pessoas a beleza das páginas impressas para juntar às suas redes sociais”, diz McCue. “Adoro a National Geographic, a Wired, o Wall Street Journal e detesto as listas feiosas, com imagens pequenas e sem graça, como as que hoje aparecem no Twitter e no Facebook, sem recursos de tipografia, nas quais todo mundo parece igual e banal.” Com tantos recursos e ainda por cima gratuito, o Flipboard é um dos aplicativos mais bem-sucedidos para o iPad. Foi escolhido pela Apple o aplicativo do ano, em 2010, e foi tão requisitado para downloads, logo depois de seu lançamento, que derrubou o servidor onde estava hospedado.

Curiosamente, nem uma raposa experiente como McCue havia se preparado para tanto interesse. “Eu testei o Flipboard com amigos, mas sabia que tinha apenas uma chance de causar boa impressão na App Store. Eles gostaram, mas não imaginávamos o tamanho da procura”, diz McCue. O programa bombou também entre donos de revistas e jornais. Quatro dias após o lançamento, 130 editores ligaram para McCue. Queriam saber como colocar seu conteúdo na aplicação.


Conversa entre amigos

O Flipboard nasceu de uma conversa entre amigos. Aconteceu no verão de 2009, semanas depois de McCue deixar a Microsoft, onde estava para completar o processo de venda e consolidação de seu sistema de reconhecimento de voz Tellme, adquirido pela empresa de Bill Gates. Na conversa, de um lado estava McCue e do outro o engenheiro Evan Doll, especialista em aplicativos para iPhone, ex-funcionário da Apple e hoje sócio do Flipboard.

Num tempo em que as únicas informações concretas sobre o tablet da Apple eram rumores, os dois discutiam a feiura da web. “Começamos a imaginar como seria fazer a internet a partir do zero. Nossa proposta era consertar seus pontos fracos e aproveitar recursos usados na imprensa”, diz McCue. “Foi assim que pensamos que havia uma oportunidade para desenvolver uma companhia capaz de fazer a web um lugar mais bonito e menos complicado.” Sentado numa das poltronas vermelhas de seu escritório, que contrastam com as paredes brancas da casa, McCue conta que, quando o tablet da Apple finalmente chegou ao mercado, eles adaptaram para a nova plataforma a proposta de uma revista que agrega conteúdo das redes sociais.

A partir daí, tudo correu muito rápido. Segundo McCue, foram seis meses para a programação, mais três para as interfaces. “No dia em que Steve Jobs apresentou o iPad, pensei: Uau, isso será perfeito para a gente.” Mas era preciso um pouco mais do que uma interface bonita e prática. Para não se perder no universo gigante das redes sociais, McCue e Doll buscaram parceiros que poderiam ajudá-los com dados e informações. Entraram em contato com a Ellerdale, uma pequena empresa de Menlo Park, a oito minutos de carro de Palo Alto, que havia criado um sistema de análise semântica para estudar e destacar informações de acordo com sua relevância.

“Hoje, somos especializados em analisar e filtrar fluxos de dados”, diz Christel van der Boom, holandesa radicada na Califórnia e diretora de marketing do Flipboard. Na equipe está ainda o designer argentino Marcos Weskamp, com formação acadêmica no Japão e experiência com revistas e sites criativos. “Quando cheguei ao Flipboard, em março de 2010, a proposta que recebi foi de fazer um programa para a internet que tivesse as qualidades de uma revista, a começar pela simplicidade”, diz Weskamp. “Quando se desenha uma interface digital é muito fácil cair na tentação de agregar botões, opções, modos diferentes de navegação. A nossa proposta foi colocar o mínimo indispensável para navegar no conteúdo rico em texto, imagens e vídeo.” Weskamp nunca havia trabalhado com McCue ou Doll. Foi encontrado graças à rede de contatos de McCue, que está sempre em movimento.


99 centavos por download

Caso cobrassem 99 centavos de dólar de cada usuário que baixasse o Flipboard, McCue, Doll e seus amigos da casa de móveis vermelhos ganhariam um bom dinheiro. Mas essa não é a ideia. O plano de negócios do Flipboard prevê a venda de anúncios. Como o iPad permite navegar nas páginas nas posições horizontal ou vertical, a turma do Flipboard já começou a bolar publicidade tirando proveito dessa interação. Um exemplo é a campanha da vodka Nikita. Ela mostra uma bela mulher de pé, e que aparece deitada quando o tablet é virado. McCue quer usar esse tipo de recurso para multiplicar o preço dos anúncios. Pelo seu raciocínio, na medida em que o Flipboard gerar valor e obtiver adesões, os publicitários o levarão cada vez mais em consideração para suas campanhas interativas.

Para tornar-se inovador, Mike McCue precisou enxergar longe. Quando era adolescente, seu sonho era ser astronauta. Aos 14 anos, criou seu primeiro software, um joguinho chamado Shuttle Flight, em uma máquina com minguados 16 quilobytes de memória RAM que pertencia ao clube de alunos da escola. Já incorporado à pele de geek, bolou videogames para se divertir. O mais bem-sucedido foi o Night Mission, baseado na malsucedida tentativa do presidente americano Jimmy Carter de resgatar soldados detidos no Irã. O objetivo era salvar os reféns com um helicóptero.

Astronauta frustrado

Quando McCue estava se preparando para entrar para a Academia da Força Aérea dos Estados Unidos, o primeiro passo para quem quer ir para o espaço em uma nave da NASA, seu pai morreu de câncer. Como era o mais velho de uma família de seis irmãos, precisou trabalhar. “No lugar da West Point (a academia que forma candidatos a astronauta) acabei na IBM”, diz McCue. Por três anos ele mergulhou em programas e ferramentas para gráficos, relações com consumidores e redes. Com a experiência adquirida no mundo corporativo, resolveu que era hora de tocar uma carreira solo.

“Para começar uma companhia do zero é preciso três coisas: uma boa ideia, paixão e as pessoas certas”, diz McCue. Era 1989, quando obteve 100 mil dólares de oito investidores e abriu uma empresa na garagem da casa de sua mãe. Criou uma ferramenta, a Sidebar, que tornava mais amigável a operação da primeira versão do Windows. Vendeu os direitos de utilização para a IBM inicialmente por 250 mil dólares, depois renegociados pelo dobro desse valor com outra companhia.


Dali, para tocar sua primeira empresa formal, a Paper Software, foi um pulo. Quando começou, ficava em um pequeno prédio, acima de um restaurante indiano e de uma livraria, em Woodstock, a 175 quilômetros de Nova York. Apesar das instalações modestas, tinha uma grande sacada: era uma companhia especializada em plataformas digitais de realidade virtual, capaz de mostrar gráficos complexos em 3D. Acabou comprada pela Netscape (especula-se que por 20 milhões de dólares) e McCue foi incorporado à direção da equipe do primeiro navegador para a internet.

“O objetivo de quem monta uma startup nunca é vender, mas desenvolver um negócio novo e independente”, afirma McCue. “Mas um CEO tem de estar atento às oportunidades, inclusive para que sua criação possa ter um futuro muito além do que ele pode dar.” Dez anos depois, lá estava McCue com outro projeto, o do Tellme, um programa de reconhecimento de voz em que as solicitações para um banco de dados são dadas verbalmente e não por teclado. Tornou-se um padrão para browsers de voz e foi vendido à Microsoft por 800 milhões de dólares.

Carros conectados

O Tellme hoje é usado nos carros da Ford, nos Estados Unidos. Parte dos lucros foi dividida com investidores como o Benchmark Capital (que bancou o e-Bay) e o Kleiner Perkins Caufield & Byers (que acaba de aplicar 200 milhões de dólares no Twitter e já investiu na Amazon e na AOL). “Enxerguei que não teria condições financeiras para levar o Tellme aos limites que uma grande corporação poderia, por isso decidi negociá-lo”, diz McCue. “Era isso ou tentar uma fusão com outra empresa pequena.” Cravou a primeira alternativa e partiu para outra.

No Vale do Silício, a onda dos tempos atuais é incubar uma ideia brilhante o suficiente para atrair gigantes da tecnologia interessados em aumentar o portfólio de produtos ou investidores ávidos por negócios inovadores. Foi assim que McCue cresceu e enriqueceu. “Quando se tem um currículo com realizações não é difícil conseguir dinheiro para uma boa ideia”, diz McCue, antes de sair para uma reunião de trabalho pedalando sua bicicleta. Com gigantes como o Yahoo! e o Google de olho no conceito das redes sociais, e plataformas como o Android mergulhando com tudo no mundo dos tablets, não duvide que em breve McCue virá com mais novidades.

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