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Startups no Brasil: menos glamour e mais trabalho na era da inteligência artificial

Em artigo especial para a EXAME, a investidora serial em startups Cláudia Rosa argumenta que investidores e founders precisam ser realistas, até porque a IA chegou e já mexeu na zona de conforto de muitos negócios. Tudo isso, claro, sem perder a ousadia

Cláudia Rosa,  (Divulgação/Divulgação)

Cláudia Rosa, (Divulgação/Divulgação)

Cláudia Rosa
Cláudia Rosa

CEO do Ela Investe e colaboradora da EXAME

Publicado em 23 de novembro de 2024 às 08h03.

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Dizem os espiritualistas que o Universo é composto por apenas dois elementos: espírito e matéria. Ou seja, o que não é uma coisa, é a outra. Pode parecer exagero – e talvez até seja –, mas na última década passamos a viver num planeta no qual quem não é “influenciador”, é investidor ou founder de startup.

O noticiário e, especialmente, as redes sociais, transmitiam a impressão de que influenciadores e “startupeiros” viviam num mundo ideal, onde tudo dá certo, não há riscos, e no qual a inspiração vale mais do que a transpiração.

Bem, a “bolha” dos influenciadores estourou no final de 2023. Envolvimento com pirâmides financeiras, “publis” para sites de apostas e jogos de azar ilegais e fraudulentos, queda significativa de audiência e até um fenômeno já constatado nos EUA, batizado de “fadiga de influenciador”.

Tudo isso vem se somando para chegar a uma redundância: os influenciadores estão perdendo a influência.

É claro que, no ecossistema de startups, a situação não é igual. Até porque tem a Lei Complementar 182, que estabelece o Marco Legal do segmento, e as próprias leis do mercado que, juntas, exercem regulação e controle. No mundo dos “influencers”, a coisa anda bem mais solta.

Glamourização das startups

A glamourização das startups vem da visão equivocada de que conquistar o investimento anjo para o negócio basta. E, para os investidores, de que fazer parte de uma rede é entrar para “o clube”. Verdades sejam ditas: conquistar um aporte para seu negócio é algo demorado, muitas vezes exaustivo, podendo inclusive prejudicar a operação.

Até o esperado “cheque” há uma demora média de três meses. Aos que conseguem passar nesse funil, é preciso estar claro que devem performar para a próxima rodada, que pode ser ainda mais intensa do que a primeira, visto que agora há investidores cobrando resultados.

De acordo com pesquisa da Anjos do Brasil, até agosto deste ano o país tinha 8.155 investidores que aportaram em negócios. Nos Estados Unidos, o número é de 422 mil. O volume de dinheiro também é muito distante: nos EUA, o valor investido em startups em 2023 foi de 18 bilhões de dólares (mais de R$ 100 bilhões), contra R$ 900 milhões no Brasil.

Evidentemente, o mercado de startups americano é bem mais maduro e tem mais tempo de desenvolvimento do que no Brasil, onde vem ganhando visibilidade nos últimos dez anos e cresce 10% ao ano em números de investidores.

Analisando os números comparativos acima, concluímos que ainda há um potencial enorme. Porém, o Brasil ainda não tem o perfil de investimento de risco, e venture capital é investimento de alto risco.

Regra clara nos dois lados do balcão

Para quem topa a parada, a regra é clara nos dois lados do balcão: enquanto os empreendedores buscam por smart money – ou seja, apoio de especialistas e dinheiro –, investidores buscam negócios escaláveis, rentáveis, disruptivos e com founders engajados e preparados.

Digo sempre que o empreendedor deve se conectar e encontrar seu próximo investidor, de preferência alguém que conheça o segmento. Para os investidores, reforço a importância de apoiar, participar, ouvir e colaborar com suas startups investidas.

Nessa linha, faço uma consideração: conquistei espaço e notoriedade neste mercado porque sigo minha essência colaborativa no ecossistema. Desde meu primeiro investimento, em 2016, foco em “entender-investir-criar conexões-facilitar”.

Frequentemente, participo de reuniões das startups com clientes ou parceiros e crio oportunidades para algumas delas. Juntos, pensamos em formas de alavancar o negócio, ao mesmo tempo em que desenvolvemos habilidades nos founders para que estejam mais preparados para as próximas fases.

Empreender não é glamuroso, e investimento anjo também não deve ser. É a fase de mão na massa, do “vamos juntos”. É ilusório pensar que se vai ficar milionário com investimento anjo: a média de múltiplos com os exits é de três vezes o valor investido. Porém, se investidores e redes apoiarem mais os founders e seus times, esses múltiplos podem melhorar.

Vejo também o rápido crescimento do ecossistema, com novas redes de investimentos, aceleradoras, hubs, venture builders, corporate ventures e parques tecnológicos. Tudo isso é ótimo, desde que os empreendedores sejam beneficiados por essa estrutura.

Menos glamour, mais realidade e mão na massa

Muitas redes ganham dinheiro com a adesão de novos associados, mas se esquecem de apoiar e acompanhar as startups. Sabemos que o smart money tem muitos indicadores qualitativos, portanto subjetivos, e que na maioria dos casos não são mensuráveis. Um pouco mais de dedicação e parceria ajuda muito.

E assim chegamos a um ponto fundamental: a inteligência artificial (IA) já está aí para analisar melhor os negócios, trazer informações mais rápidas para investidores e startups, avaliar resultados e, obviamente, perfis dos times.

No entanto, ainda não temos uma ideia clara do impacto da IA no ecossistema de startups. Mesmo big techs como Facebook, Apple, Netflix, Google e Amazon ainda não conseguiram medir totalmente esse impacto, enquanto novas empresas ancoradas em IA crescem exponencialmente no Vale do Silício.

É preciso reforçar a receita: menos glamour, mais realidade e mão na massa. Os negócios vão mudar muito com esse novo componente, e para avançar será preciso transpirar, se dedicar e se inspirar. Quem (sobre)viver verá.

Conselheira e maior investidora-anjo em startups do Brasil (2022), CEO do Ela Investe – @claudiarosa_vc

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