O caminho para as mulheres chegarem ao topo das organizações é longo e cheio de desafios. Os sinais de tempos melhores parecem vir das pequenas e médias empresas (Getty Images/Getty Images)
Redação Exame
Publicado em 25 de julho de 2023 às 11h43.
O número de mulheres ministras é o maior na história da República brasileira. Quase 30% da alta liderança na Esplanada dos Ministérios é feminina – até o ano passado esse número era de 12%.
Estudo feito pelo coletivo Elas no Orçamento identificou, no entanto, que a maioria das mulheres da Administração Pública Federal está concentrada nos cargos de assessoramento, e os espaços de tomada de decisão, com os maiores salários, são, majoritariamente, ocupados por homens.
Infelizmente, essa é a realidade também na iniciativa privada. Uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria revela que as mulheres representam apenas 29% da alta liderança da indústria.
Para as mulheres negras essa jornada pode ser ainda mais sacrificante e os números não nos deixam mentir. O racismo que estrutura a nossa sociedade está refletido também nas hierarquias organizacionais.
Segundo a Associação de Promoção da Equidade Racial, não há nenhuma grande empresa brasileira presidida por uma mulher negra. Dados divulgados pela consultoria Triwi indicam que uma em cada quatro empresas no Brasil não possui nenhuma mulher negra no seu quadro de funcionários.
Quase metade das organizações – 45% possui apenas 10% do corpo de colaboradores formado por mulheres negras. Do total das empresas pesquisadas, 68% não possuem mulheres com deficiência no quadro de pessoal.
O caminho para as mulheres chegarem ao topo das organizações é longo e cheio de desafios. Os sinais de tempos melhores parecem vir das pequenas e médias empresas.
Dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento indicam tendência de aumento do número de mulheres donas de negócios no Brasil.
Essas mulheres estão, preponderantemente, nas micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) e 45% delas são responsáveis pelo domicílio, “uma situação bem diferente de alguns anos atrás e que demonstra a importância de sua posição para o bem-estar de suas famílias”, segundo o estudo.
Uma das principais razões para essa tendência é a busca pela flexibilidade e a possibilidade de conciliar melhor a carreira com os cuidados com a família e maternidade.
Além disso, o empreendedorismo por necessidade fala alto no Brasil, principalmente depois da Covid-19 que causou desemprego maior entre as mulheres – seja porque elas são maioria nos setores mais atingidos pela pandemia ou porque tiveram que abandonar o trabalho para cuidar dos filhos sem escola ou familiares doentes.
Para que o cenário das pequenas e médias empresas brasileiras lideradas por mulheres realmente seja promissor é preciso endereçar pelo menos dois desafios, que são sustentados por questões estruturais da nossa sociedade.
A pesquisa realizada pelo Sebrae Delas revela que a jornada tripla da empreendedora brasileira é uma grande barreira para o êxito do negócio.
As mulheres chegam a dedicar à empresa até 17% menos horas do que os homens, pois, em casa, elas trabalham até 10 horas semanais a mais que seus companheiros com afazeres domésticos e cuidados com filhos.
Portanto, a mulher líder da empresa de médio porte pode ter a sensação de estar subindo degraus numa escada rolante que está descendo.
Apesar de ter mais tempo de escolaridade e entregar resultados econômico-financeiros superiores, como mostram diferentes pesquisas, as mulheres têm mais dificuldade de acesso ao crédito.
Segundo dados do Sebrae, as taxas de juros para empreendedoras são 3,5% mais altas, embora a inadimplência feminina seja menor - 3,7% entre as mulheres e 4,2%, entre os homens.
O Mapa de Negócios de Impacto Socioambiental mostra que apenas 25% das empresas fundadas por mulheres ou com maioria feminina no quadro societário conseguem captar investimentos – contra 55% das empresas fundadas por homens ou com predominância masculina.
Ou seja, mesmo dedicando menos tempo ao negócio, acumulando sobrecarga de trabalho na vida, e com menos acesso ao crédito, as mulheres seguem desbravando caminhos e movimentando a economia do país. Para que a jornada seja mais justa, no entanto, é preciso um esforço coletivo para reduzir as barreiras.
Recentemente, a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que destina 25% dos recursos do Pronampe para mulheres empreendedoras – sendo que uma parcela desse montante deverá ser destinada a empreendimentos liderados por mulheres negras, de baixa renda ou com deficiência. É uma medida crucial que pode estimular e multiplicar iniciativas (públicas e privadas) semelhantes em todo o país.
Além disso, as escolas – da educação básica às escolas de gestão – podem cumprir um relevante papel na sociedade e passarem a tratar dessa temática com maior ênfase.
São mais que bem-vindas ações de promoção de reflexão e debates sobre diversidade, masculinidades e o papel das mulheres na sociedade contemporânea e cursos de capacitação de mulheres para mobilização de recursos e captação em fundos de investimento. A educação pode ajudar o Brasil a virar esse jogo.
Afinal, essa é uma agenda que não interessa apenas às mulheres. O desenvolvimento econômico passa pela igualdade de gênero. E a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres contribui para maior eficiência econômica e para o desenvolvimento nacional.
A construção de uma nação próspera e pacífica pressupõe a cooperação entre setores e entre governos, empresas e sociedade civil para enfrentarmos as desigualdades existentes, como as de gênero e suas interseções, e proporcionar melhor qualidade de vida para toda a população – desta e das futuras gerações.