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Os erros e a queda da BR Pharma, criada com planos grandiosos

Com a missão de ser uma consolidadora do mercado farmacêutico, ela buscou crescer por meio de aquisições, mas cometeu erros básicos de gestão

21º - Brazil Pharma  (Fernando Moraes/Veja São Paulo/VEJA)

21º - Brazil Pharma (Fernando Moraes/Veja São Paulo/VEJA)

Karin Salomão

Karin Salomão

Publicado em 15 de janeiro de 2018 às 11h09.

São Paulo – Com planos grandiosos de ser a maior rede de farmácias do país e pioneira ao incorporar redes menores, a BR Pharma acabou de pedir recuperação judicial.

Em 10 de janeiro, entrou com um pedido na Varas de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo, com dívidas de quase 1 bilhão de reais. O pedido chegou meses depois da companhia ter sido vendida pelo BTG Pactual ao fundo Lyon Capital, por um preço irrisório de mil reais.

Na ocasião, por problemas antigos e uma integração incompleta entre suas diversas marcas, a companhia já tinha dívidas altas e queimava caixa há anos. O fundo de investimentos, porém, tinha a intenção de reestruturar a companhia e “readequar seus processos de gestão, de controle e do perfil da dívida, visando à preservação e revitalização de suas atividades e operações", disse a BR Pharma na ocasião da aquisição.

Não deu tempo. De acordo com especialistas ouvidos pelo site EXAME, o fundo não conseguiu reverter os números negativos antes que o negócio se tornasse insustentável.

Agora, com a recuperação judicial, a empresa deve pretende "concentrar seus máximos e melhores esforços para preservar suas atividades comerciais e operacionais e assim cumprir com seus compromissos e obrigações”, disse no pedido de recuperação.

Histórico

Criada em 2009 pelo banco BTG Pactual, a BR Pharma tinha a missão de ser uma consolidadora do mercado pulverizado. Ela buscou crescer por meio de aquisições de líderes regionais, plano que colocou em prática logo depois de seu nascimento.

Em 2010, foram compradas três marcas fortes no Nordeste: a Rede Nordeste, a “Farmácia dos Pobres”, de Pernambuco, e a Guararapes. No mesmo ano, a incorporadora comprou a Rosário Distrital, do Centro-Oeste, e a Farmais.

Nos dois anos seguintes, abocanhou a Mais Econômica, do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, a Sant’Anna, da Bahia, e a Big Ben, do Pará.

No meio das aquisições, realizou uma abertura do capital, por 465,7 milhões de reais, em 2011. Hoje, a rede tem 288 lojas próprias e 430 franquias, com 4.500 funcionários.

Apesar de, em pouco tempo, ter se tornado uma das maiores redes de farmácia do Brasil, a companhia acumulava prejuízos. Desde 2013 o resultado anual era negativo e, até o 3° trimestre de 2017, acumulava prejuízo de 1,46 bilhões de reais no ano.

Além disso, a operação queimava caixa e precisava, continuamente, de novas injeções de capital para se manter funcionando. "A empresa passava por aumentos de capital para queimar todo o caixa em seguida. Não era uma situação sustentável", disse Vitor Suzaki, analista da Lerosa Investimentos.

Em janeiro de 2017, o BTG Pacual colocou mais 400 milhões de reais na companhia e emitiu 511 milhões de reais em Cédula de Crédito Bancário, CDB. Dessa forma, o banco tornou-se credor da companhia, assim como a PPLA Participations (anteriormente denominada BTG Pactual Participations), empresa com sede em Bermuda e que possui os mesmos sócios do BTG Pactual.

Venda

Com dificuldades financeiras, dívidas altas e acúmulo de prejuízos, a situação piorou com a prisão de André Esteves, criador e ex-CEO do BTG Pactual, em dezembro de 2015, por corrupção.

Esteves negou as acusações e, em setembro de 2017, o Ministério Público afirmou que não há provas suficientes contra Esteves e recomendou que ele seja absolvido. O banco espera que ele seja inocentado.

Sua prisão, no entanto, levou o BTG Pactual a vender alguns de seus ativos nos anos seguintes, como o banco BSI, a rede D’Or, sua participação na BR Properties e no Monte dei Paschi, entre outros.

Em relação à BR Pharma, o banco vendeu duas marcas: a Mais Econômica em novembro de 2015, antes do escândalo, por 44 milhões de reais ao fundo Verti, e a Rosário, para a Profarma, por 173 milhões de reais, em dezembro de 2016.

O que restou foi passado para a Lyon Capital, por um valor irrisório de mil reais. O fundo na verdade comprou as ações da Stigma Cayman, empresa com sede nas Ilhas Cayman e que controlava 94,49% do capital da BR Pharma. Depois de um aumento de capital, o fundo passou a gerenciar, indiretamente, 99,99% das ações do grupo.

Para gerar caixa e manter a companhia funcionando, o controlador tentou vender ativos, como a rede Big Ben para o conglomerado industrial Ultrapar, por 750 milhões de reais, mas fechar acordo sobre o preço. De acordo com o Valor Econômico, o empresário Paulo Remy, do fundo Lyon, buscava mais capital de giro com o BTG.

Sem sucesso, a rede pediu recuperação judicial no dia 10 de janeiro deste ano. "O Lyon Capital não conseguiu, dentro do prazo que tinham previsto, fazer a reestruturação da empresa que pretendiam", afirmou Vitor Suzaki, analista da Lerosa Investimentos.

Hoje, a dívida do grupo BR Pharma é de quase 1 bilhão de reais - o maior credor é o ex-controlador, BTG Pactual.

Erros antigos

Com sonhos grandiosos de consolidar o mercado de varejo farmacêutico, a BR Pharma deixou um ponto importante de lado: a integração de todas as redes que foram compradas. De acordo com os especialistas, esse foi o principal erro do grupo.

"O fundo fez reformulações e análises com pouca profundidade. Pensou mais na parte financeira, mas pouco na operação das lojas", disse Alexandre Machado, sócio-diretor da GS&Consult.

Sem integrar o back office, que são as áreas de compras, logística, recursos humanos, entre outros, o custo operacional da empresa se manteve muito alto, pouco competitivo em relação à concorrência. Além dos custos, a empresa chegou a ter falta de estoque em alguns momentos e perdeu vendas.

Outro problema foi o choque de culturas entre as diferentes redes, indicam os consultores.

"Quando a BR Pharma começou as aquisições, incorporou redes com características muito diferentes, às vezes familiares e com gestão pouco profissional", disse Machado.

Em muitos casos, a incorporadora manteve os antigos diretores das varejistas em seus cargos e deu a eles assento em seu conselho de administração. "Com essa gestão descentralizada, sem uma diretoria unificada, muitas decisões foram tomadas de forma equivocada", disse Suzaki.

Enquanto a integração da BR Pharma tenha deixado a desejar, esse foi justamente o trunfo de sua maior concorrente, a Raia Drogasil.

As duas companhias, Raia e Drogasil, anunciaram uma fusão em 2011. De início, o mercado viu a movimentação com ceticismo, por conta das diferenças de cultura entre as duas.

A integração levou dois anos para ser realizada – enquanto isso, elas continuavam operando separadamente. Quando foi feita, impulsionou o valor de mercado da companhia. As ações valorizaram cerca de 300% nos últimos três anos e, desde a fusão, o faturamento quase triplicou.

Para os analistas, a integração entre a Raia e a Drogasil deu certo porque as duas empresas se planejaram para dar esse passo. "Elas fizeram a lição de casa e estavam muito mais preparadas para crescer quando, enfim, se uniram", afirmou machado.

Agora, com a recuperação judicial, a BR Pharma ganhou uma nova chance de reestruturar e trazer valor.

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