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Fabricantes de máscaras lucram com coronavírus

Para conter a propagação do vírus, o governo chinês ordenou que os cidadãos usassem máscaras toda vez que saíssem

CORONAVÍRUS: Cães usam máscaras em cidades com alto índice de infecção  (Aly Song/Reuters)

CORONAVÍRUS: Cães usam máscaras em cidades com alto índice de infecção (Aly Song/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 20 de fevereiro de 2020 às 14h10.

Última atualização em 20 de fevereiro de 2020 às 14h17.

França – O barulho incessante das máquinas ecoando pela cavernosa fábrica francesa é o resultado inesperado do vírus mortal que paralisou cidades na China e em outras partes da Ásia. A empresa, a Kolmi Hopen, fabrica um item que, de repente, é um dos mais procurados no mundo: a máscara facial.

A fábrica, em Angers, na França, normalmente faz cerca de 170 milhões de máscaras por ano, mas recentemente as encomendas chegaram a impressionantes 500 milhões, inundando o departamento de vendas à proporção de uma caixa a cada dois minutos. A Kolmi Hopen está correndo para contratar mais trabalhadores que mantenham as máquinas funcionando 24 horas por dia, sete dias por semana.

“Estamos fazendo máscaras o mais rápido possível. Mas a demanda continua aumentando”, disse Guillaume Laverdure, diretor de operações da empresa mãe da Kolmi Hopen, a Medicom, com sede no Canadá, enquanto motoristas de empilhadeiras levavam caixas de máscaras recém-acabadas para os caminhões.

O surto de coronavírus desencadeou uma enorme procura por máscaras de proteção por toda a China. Para conter a propagação do vírus, o governo chinês ordenou que os cidadãos usassem máscaras toda vez que saíssem. Profissionais médicos disseram que, uma vez usada, a máscara deve ser substituída por uma nova, gerando uma explosão na demanda. Cenas de pessoas fazendo fila para obter essa proteção, sem conseguir comprá-las, pois os estoques das farmácias se esgotam, tornaram-se familiares.

“Não consigo encontrar uma única máscara para comprar. Não sei mais quais lojas têm estoque”, afirmou Sandy Lo, de 60 anos, em Hong Kong. Ela contou que reutiliza máscaras velhas porque não tem opção.

A maioria das máscaras faciais do mundo são feitas na China e em Taiwan. Mas as fábricas de lá, incluindo as administradas pela Medicom, foram forçadas a suspender temporariamente as exportações para cumprir as exigências do governo de reservá-las para a população local.

O governo chinês, admitindo que precisava urgentemente de máscaras médicas e outros equipamentos de proteção, declarou que começaria a importá-los da Europa, do Japão e dos Estados Unidos, para ajudar a compensar o déficit.

Isso gerou um frenesi na filial da Kolmi Hopen, no oeste da França. Os telefones na fábrica têm tocado sem parar, pois compradores de suprimentos médicos vasculham o mundo em busca de fabricantes do produto.

A demanda é especialmente forte para máscaras respiratórias de alta filtração, que, em comparação com as máscaras cirúrgicas, podem ser mais eficazes contra a propagação de gotículas que carregam o vírus, disse Laverdure. Outra fábrica da Medicom que faz máscaras faciais, em Augusta, na Geórgia, também está aumentando a produção. Laverdure não quis discutir detalhes financeiros, incluindo o custo das máscaras.

Os cientistas disseram que não há muitas evidências de que as máscaras realmente protejam as pessoas saudáveis (lavar as mãos pode ser mais importante).

Mesmo assim, à medida que o coronavírus se espalha, com milhares de casos confirmados e centenas de mortes, especialistas temem que o fornecimento de máscaras faciais e outros itens de proteção sanitária seja baixo em outros países – mesmo para uso médico rotineiro.

A enxurrada de pedidos na Kolmi Hopen mostra em que escala a China pode chacoalhar a cadeia de suprimentos global, até mesmo de produtos mais especializados, se as fábricas de lá não operarem com força total.

Só a China produz cerca de metade das máscaras faciais sanitárias do mundo – cerca de 20 milhões por dia, ou mais de sete bilhões por ano, fornecendo-as para hospitais e trabalhadores médicos em vários países. Taiwan representa mais 20 por cento da oferta global.

A produção já havia desacelerado com a proximidade do feriado do Ano Novo Lunar no início de janeiro. Alguns locais ao redor de Wuhan, o epicentro do surto do coronavírus, ainda não retomaram totalmente a produção e estão operando com cerca de 60 por cento da capacidade, de acordo com o governo.

A fábrica da Medicom em Wuhan, que faz trajes cirúrgicos, está entre as que atrasaram a reabertura. O local de fabricação de máscaras da empresa em Taiwan não tem mais permissão para exportar. E na fábrica da Medicom, em Xangai, o governo enviou monitores e está requisitando três milhões de máscaras diariamente, assim que saem da linha de produção, contou Laverdure.

 

A escassez de oferta pode ser piorada pelo fato de que componentes para máscaras e respiradores são feitos em vários países. Mais de 90 por cento das máscaras cirúrgicas vendidas nos Estados Unidos são produzidas no exterior, de acordo com o Departamento de Saúde e Serviços Humanos. Os componentes – ou às vezes a montagem final – podem ser feitos não só na China e em Taiwan, mas também no Japão, no Vietnã, no México e na Colômbia.

“Esses países poderiam facilmente cortar nossa cadeia de suprimentos”, disse Laurie Garrett, especialista em política e repórter vencedora do Prêmio Pulitzer, que escreveu sobre Sars, ebola e outros surtos.

Com a interrupção da produção da China para o mundo exterior, fornecedores médicos em todo o mundo, incluindo gigantes como a Honeywell e a 3M, estão lutando para encontrar fontes alternativas. Ambas as empresas disseram por meio de representantes que estão experimentando um crescimento da demanda e estão trabalhando para aumentar a produção onde podem.

Até os produtores menores acabaram entrando na onda. A Pardam, empresa na República Tcheca que fabrica nanofibras, que retêm micropartículas, quase abandonou um protótipo de máscara sanitária que havia testado no ano passado por causa da fraca demanda. Mas, após o surgimento do coronavírus, ela vendeu seu estoque de duas mil máscaras em dois dias e está recorrendo à automação para aumentar a produção, afirmou Jiri Kus, presidente da Associação Tcheca da Indústria de Nanotecnologia, falando em nome da Pardam.

Na Medicom, as autoridades lançaram esta semana um plano de emergência para que a fábrica de Angers adicione 30 novos trabalhadores à operação de cem pessoas, visando produzir 24 horas por dia. A empresa está produzindo mais de um milhão de máscaras diariamente – o dobro da quantidade normal, disse Laverdure.

Na fábrica, mais de uma dúzia de máquinas faziam as máscaras a uma taxa de 80 por minuto, combinando fibras sintéticas vindas de bobinas gigantes e adicionando tiras de nariz, laços de cabeça ou laços de ouvido a cada uma delas. Cinco máquinas fabricavam máscaras cirúrgicas, os finos retângulos que cobrem o nariz e a boca, enquanto outras produziam as máscaras respiratórias mais resistentes.

Quatro trabalhadores, incluindo dois novatos que começaram a treinar esta semana, inspecionavam um lote das cobiçadas máscaras, acondicionando-as em caixas que eram então transferidas para o armazém e embarcadas para Hong Kong e outros destinos.

A Medicom já vivenciou as crises do vírus da Sars, H1N1 e ebola. À medida que iam surgindo relatos do coronavírus em dezembro, os executivos organizaram um espaço na sede em Montreal para monitorar os desenvolvimentos e enviar planos de produção para suas fábricas na Europa e na América do Norte, e em suas fábricas em Wuhan, Xangai e Taiwan.

“Quando vimos a paralisação das cidades na China, o governo estendendo o Ano Novo Chinês e depois interrompendo as exportações de máscaras, ligamos para nossas fábricas e dissemos: ‘Uma epidemia está se desenvolvendo; façam o que puderem para garantir mais cobertura'”, declarou Laverdure.

A Kolmi Hopen foi capaz de aumentar a produção rapidamente porque seus fornecedores de matérias-primas estão sediados na França e nos países europeus próximos. Essas empresas também se esforçaram para estender o horário de funcionamento das fábricas e correram para contratar mais trabalhadores para acompanhar a demanda, disse Laverdure, acrescentando: “Isso cria muito estresse na cadeia de suprimentos. Não é fácil de gerenciar.”

Enquanto o governo chinês ia criando campos de quarentena em massa ao redor do epicentro do surto, a empresa se preparava para um ritmo mais veloz. “A demanda não para. A situação está evoluindo rapidamente”, concluiu Laverdure.

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