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A difícil tarefa de recuperar a reputação da Petros

Alvo da operação Greenfield, fundo de pensão da Petrobras mudou estatutos, criou ouvidoria e comitê independente

Logo da Petrobras: estatal decidiu manter o preço da gasolina inalterado (Ricardo Moraes/Reuters)

Logo da Petrobras: estatal decidiu manter o preço da gasolina inalterado (Ricardo Moraes/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 12 de agosto de 2018 às 12h13.

Última atualização em 12 de agosto de 2018 às 12h13.

São Paulo - "Senhor Walter, a Polícia Federal está aqui no escritório". Eram 7h30 da manhã do dia 5 de setembro de 2016, uma semana após o economista Walter Mendes ter assumido o comando da fundação Petros, que administra os fundos de pensão da Petrobras. O executivo havia acabado de sair de um voo São Paulo-Rio e, em segundos, dezenas de mensagens, além do recado da secretária, começaram a invadir seu celular.

A PF, juntamente com o Ministério Público, estava na sede do fundo de pensão, no centro do Rio, para cumprir um mandato de busca e apreensão de documentos e computadores. Era a deflagração da Operação Greenfield, que apura desvios nos maiores fundos de pensão do País, calculados em R$ 8 bilhões.

Ao chegar ao prédio, Mendes tentou explicar que não podia assinar o termo de apreensão, porque seu nome nem tinha sido habilitado pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), órgão fiscalizador dos fundos. "Mas tem até placa com o seu nome na porta", disse um policial. "Num desses arroubos de eficiência, alguém tinha feito a plaquinha", conta Mendes.

"Pedi para que tudo fosse entregue. Com os policiais ainda nos andares do prédio, eu me apresentava aos 480 funcionários, em quatro reuniões com a capacidade máxima do nosso auditório", explica o executivo, que negociou cooperação com as autoridades em troca de acordo para evitar novas buscas na sede ou na casa de funcionários.

A empreitada de Mendes para tentar restaurar a reputação da fundação não tem sido fácil. Com carreira no Unibanco e no Itaú, o executivo, de 62 anos, deu início a uma série de procedimentos para aumentar a transparência da fundação. Mudou estatutos, criou ouvidoria para denúncias de fraude e um comitê independente, formado por quatro gerentes, para acompanhar as investigações sobre investimentos duvidosos. "É muito difícil separar o efeito de crise, de incompetência e de malfeitos", diz o presidente do fundo de pensão, segundo maior do País, com R$ 80 bilhões sob gestão.

Os relatórios são enviados, sem precisar do aval da diretoria, para Ministério Público, Previc e, se for o caso, Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Segundo Mendes, até agora, 11 investigações foram encerradas (ou seja, tiveram relatório enviado às autoridades competentes), quatro estão em andamento e outras nove sendo avaliadas.

Para tentar recuperar parte do dinheiro perdido, a fundação avalia quais casos são passíveis de ressarcimento. Em maio, a Petros entrou na CVM com o primeiro processo em que cobra indenização de R$ 584 milhões de dois ex-presidentes e seis diretores sobre conduta indevida na compra de participação da construtora Camargo Correa na Itaúsa. "Esse é o primeiro. Haverá outros", garante Mendes. A Camargo não quis comentar.

O executivo não detalha os investimentos problemáticos. Mas há exemplos clássicos, como o aporte na Sete Brasil, ao lado de Funcef, dos funcionários da Caixa, em que cada uma das fundações investiu R$ 1,4 bilhão na empresa de construção de sondas, que quebrou durante o escândalo da Petrobrás. Hoje, o caso está em arbitragem.

Déficit

Investimentos desse tipo explicam parte do rombo de R$ 28 bilhões amargado no ano passado pelo plano mais antigo da fundação, o PPSP. Rentabilidades baixas, crise econômica e mudanças no perfil da população reforçaram o déficit, que acontece quando o patrimônio acumulado pelo plano é menor do que o necessário para pagar todos os participantes.

"É importante lembrar que a crise de três dos maiores fundos de pensão do País é marcada pela ingerência política. E que o sistema, com os outros 304 fundos de pensão fechados existentes no País, é sólido", diz Luís Ricardo Martins, presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp).

Para reequilibrar as contas, a atual diretoria da Petros propôs um plano de equacionamento de 18 anos. Pelo plano, aprovado pelo conselho de administração em setembro do ano passado, 76 mil dos 146 mil empregados e pensionistas da Petrobrás terão de pagar R$ 14 bilhões no período. As contribuições extras, que começaram a ser cobradas em março, muitas vezes duplicam ou até triplicam os valores originais dos aportes feitos pelos participantes. Petrobrás também terá de contribuir com R$ 13,7 bilhões no período.

Desde então, multiplicaram pelo País liminares de sindicatos pedindo a suspensão da cobrança. "O impacto na mensalidade é muito alto para quem já tinha dívidas, e muitos dos participantes, a maior parte formada por aposentados, estão inadimplentes", explica Simão Zanardi, coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP). "A Justiça não é o melhor lugar para resolver o problema, porque temos pressa. Queremos uma solução negociada. Nessa semana vamos apresentar uma alternativa ao plano proposto, que mantém a paridade na contribuição da empresa e dos trabalhadores, mas em que os cálculos não são feitos pelo máximo do déficit."

A pressão dos participantes começou antes da aprovação do plano. Na primeira das oito reuniões da diretoria com o conselho da Petros para explicar o plano, cerca de 100 manifestantes contrários à medida invadiram o prédio, e alcançaram a sala do colegiado, no nono andar. "Foi muito tenso, até que conseguimos negociar com uma comissão dos participantes", lembra Mendes. Depois do episódio, as reuniões passaram a ser feitas em diferentes hotéis. "Os conselheiros eram colocados em vans, sem saber para onde iriam." Segundo Mendes, não havia outra saída. "Para zerar o déficit, teríamos de ter 20% de retorno ao ano. Mesmo batendo metas, rentabilidade não salva esse fundo."

Estratégia

Dentro da reestruturação feita pela atual a diretoria, houve a revisão de todos os processos de investimento. A ideia era fazer com que a Petros passasse a atuar como uma gestora de recursos. Na nova estratégia, a fundação zerou a posição em ativos de renda variável (ações negociadas em Bolsa e participações em empresas) sem liquidez. Vendeu fatia na CPFL Energia, na JBS, e no FIP Florestal, quando se desfez de participações na Eldorado Celulose. Somando a venda de imóveis e de ações da Itaúsa, foram mais de R$ 6 bilhões para o caixa da fundação. Apesar de afirmar que não tem pressa, a fundação também deve vender seus papéis na Vale, negociação aguardada pelo mercado.

Foi desenvolvida ainda uma nova política para escolha de conselheiros nas empresas em que a Petros tem participação. Hoje, 100% dos 30 representantes do fundo em conselhos de 10 empresas em que a Petros tem participação são independentes. Antes, os colegiados eram ocupados por membros da direção ou gerentes da Petrobrás.

"Criar comitês, processos, colegiados, é uma forma de despersonalizar a decisão e de blindar a fundação. A melhor defesa para a Petros é a transparência. Assim, voltar ao que era fica mais difícil", resume Mendes.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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