Reprodução assistida é vetada a mulheres solteiras e lésbicas na China
O uso de óvulos congelados e métodos de reprodução assistida está proibido na China a quem não apresentar uma certidão de casamento
EFE
Publicado em 13 de fevereiro de 2019 às 15h56.
Última atualização em 13 de fevereiro de 2019 às 16h31.
Pequim - Alan tem 27 anos e quer se submeter a um tratamento de reprodução assistida, mas não cumpre um requisito: estar casada. Este método continua sendo inalcançável na China para as mulheres solteiras ou lésbicas, que lutam para que esta discriminação acabe.
"Busco doador de sêmen", afirma Alan - um nome fictício - em um vídeo que revolucionou as redes sociais chinesas e reabriu o debate sobre a necessidade de modificar a lei que veta a fecundação in vitro às mulheres que não estão casadas em um país que, além disso, não reconhece as uniões entre homossexuais.
"No entanto, os homens podem congelar seu esperma sem certidão de casamento. É injusto", criticou em entrevista à Agência Efe esta jovem psicóloga residente em Jiangsu, no leste do país, que levou sua luta inclusive à Assembleia Nacional Popular (ANP), o principal órgão legislativo chinês.
Recentemente, ela enviou cartas a vários membros da ANP para que na sua próxima sessão de março abordem este tema e reconheçam o direito das mulheres que queiram ter um bebê sem precisar se casar.
Segundo um regulamento sobre tecnologia de reprodução assistida emitido pela Comissão Nacional de Saúde, o uso de óvulos congelados e métodos de reprodução assistida está proibido na China a quem não apresentar uma certidão de casamento.
Há apenas uma exceção no país, concretamente na província de Jilin, no nordeste, onde em 2002 duas professoras solteiras que queriam submeter-se a um tratamento deste tipo levaram seu caso aos tribunais e ganharam.
"Pensei em ir ao exterior para fazer o tratamento ou congelar meus óvulos, mas é muito caro e não posso", declarou Alan, que faz parte de uma rede de mulheres que lutam pelo reconhecimento dos direitos reprodutivos para todos os tipos de famílias.
É cada vez maior o número de jovens lésbicas ou solteiras chinesas que decidem submeter-se a estes tratamentos em outros países como Malásia, Singapura ou Tailândia, onde são permitidos.
Apesar de o governo chinês se esforçar para combater a queda do número de nascimentos (em 2018 se situou em 15,23 milhões, a taxa de natalidade mais baixa desde 1961) após acabar em 2016 com sua política do filho único, especialistas citados por meios de comunicação oficiais não consideram provável que nos próximos cinco anos os direitos reprodutivos estejam acessíveis às mulheres que não estejam casadas.
Embora Alan deseje ser mãe acima de tudo, está consciente que, além do âmbito legal, um dos grandes obstáculos na sua luta é a própria sociedade chinesa, onde o modelo de família tradicional segue muito enraizado.
"Eles acreditam que permitir que uma mulher solteira seja mãe vai romper a tradição chinesa sobre o casamento", comentou, já que a família é um pilar fundamental da sociedade, que segue pressionando àquelas que não se casam antes dos 30, tachando-as de forma depreciativa como "mulheres restantes".
Quando questionados sobre esta questão, muitos moradores do Pequim seguem mostrando suas reservas a modificar a legislação porque, na opinião da jovem Li Hong, a lei "ajuda a proteger as crianças" das dificuldades econômicas que pode enfrentar uma mulher solteira.
"A família é como o yin e o yang. Não pode existir só com uma mãe ou com um pai (...) Se só existe um lado, a balança se desequilibra. Assim é a vida", declarou à Efe outro morador de Pequim, Zhang Ming.
No entanto, as novas gerações se mostram cada vez mais abertas à mudança porque "a lei não é justa", como destacou a jovem Tian.
"Embora eu pessoalmente não pretenda ter um filho sozinha, se outra mulher escolher ser mãe solteira, eu a apoiaria", completou sua amiga Kelly.
Alan reconhece que durante muito tempo buscou um marido para poder realizar seu sonho: "Mas para ser sincera, não espero uma vida a dois (...) provavelmente prefiro viver só. Mas quero um bebê", ressaltou.
Após a publicação do polêmico vídeo, Alan disse que muitos têm entrado em contato com ela: "Alguns pensam como eu e entendem minha situação. Outros ligam por curiosidade. Outros querem sexo. Também me ligou um homem já casado que dizia querer doar seu esperma".
"A força social para conseguir uma mudança continua sendo muito pouca. A lei na China mudará, mas não em breve", lamentou.
No entanto, Alan não pensa em render-se e, junto a outras companheiras, seguirá em pé de guerra para reivindicar seus direitos.