Partido opositor de Hong Kong fecha as portas após prisões e exílio
Desde que a China impôs uma dura lei de segurança nacional, os políticos eleitos pelo Partido Cívico perderam suas cadeiras e um ex-legislador está entre as pessoas mais procuradas da cidade
Agência de notícias
Publicado em 28 de dezembro de 2023 às 10h30.
O Partido Cívico, uma das principais forças pró-democracia em Hong Kong , fechou sua sede em definitivo, após um processo de autodissolução que Alan Leong, um de seus fundadores, comenta com alívio e fatalismo.
"Os tempos mudaram", disse Leong à AFP, em uma das várias entrevistas concedidas ao longo do processo de dissolução.
Fundado em 2006, o Partido Cívico, apelidado de "partido dos advogados", incluía juristas, acadêmicos e outros profissionais que promoviam a democratização de Hong Kong, chegando a ser o segundo maior partido da oposição do conselho legislativo.
Desde que a China impôs uma dura lei de segurança nacional que acabou com a dissidência, na esteira dos maciços protestos pró-democracia de 2019 em Hong Kong, o Partido Cívico teve três membros detidos, seus políticos eleitos perderam suas cadeiras e um ex-legislador está entre as pessoas mais procuradas da cidade.
Ante essa situação, em maio, o partido decidiu se dissolver. Nos últimos meses, doou seus móveis de escritório e alto-falantes de campanha e arrancou recortes de jornais e emblemas partidários das paredes.
Leong manteve apenas seis distintivos verdes e roxos com a data 19.03.06, dia da fundação do partido.
"O que sobrou desses 'pins' iniciais é tudo o que temos", disse ele à AFP.
Leong mencionou a "realidade política" de Hong Kong e a falta de dinheiro e moral entre as principais causas do fechamento do partido.
"Nunca duvidei da capacidade do povo de Hong Kong de governar Hong Kong , mas há coisas que estão fora do nosso controle", desabafou.
"Alguns dos nossos legisladores continuam presos. Essa é a realidade. Isso também explica porque estamos fechando", completou.
Resiliência à prova
Nascido de um grupo de defesa da reforma eleitoral, o Partido Cívico foi fundado por quatro advogados que eram legisladores: Ronny Tong, Margaret Ng, Audrey Eu e Leong. Recrutou figuras de elite de diferentes profissões, como o engenheiro civil Albert Lai.
Hong Kong foi transferida do domínio britânico para a China em 1997, com a promessa de Pequim de preservar suas liberdades e o objetivo de ter líderes locais e legisladores eleitos democraticamente.
"Uma década se passou desde a transferência de Hong Kong, mas Pequim não cumpriu sua promessa de sufrágio universal na cidade (…) Foi isso que motivou a formação do partido", disse Lai à AFP.
Hoje, o chefe do Executivo de Hong Kong ainda é escolhido por pessoas leais à China.
Em 2004, a China impôs novos obstáculos à reforma eleitoral. Isso alimentou uma disputa já em curso sobre a "miniconstituição" de Hong Kong e levou centenas de milhares de pessoas às ruas a favor de uma maior democratização.
"A resiliência de Hong Kong foi testada até ao limite", escreveu Ng no manifesto de fundação do partido.
Em 2010, o partido colaborou com a Liga de Socialdemocratas para provocar eleições parciais com a renúncia de cinco legisladores pró-democracia.
Os partidos disseram que queriam criar um referendo simbólico, ao permitir que os eleitores mostrassem seu apoio à democratização, algo que a China condenou como "inconstitucional".
Ronny Tong, um cofundador que deixou o partido em 2015 para formar outro grupo, disse que, à época, ficou alarmado com sua "radicalização".
"Foi um ato de confrontação", disse Tong, membro do atual gabinete, a um meio de comunicação pró-governo em junho. Lamentou, então, seu papel na fundação do partido.