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Kirchner: direitos humanos, crescimento e brigas políticas

A "Era K" começou em 25 de maio de 2003 com a presidência de Néstor Kirchner (até 2007) e se prolongou com sua mulher, eleita em 2007 e reeleita em 2011

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 23 de maio de 2013 às 19h45.

O avanço nos julgamentos dos militares da ditadura (1976-83) e na economia são tão representativos da década do casal Kirchner no poder quanto sua política de confrontação, que deflagrou amor e ódio na Argentina.

O país está mergulhado na discórdia entre os Pró-K, que destacam a criação de empregos e a política de direitos humanos, e os Anti-K, que denunciam o autoritarismo, a corrupção e a insegurança.

A "Era K" (a letra K passou a ser a marca do kirchnerismo) começou em 25 de maio de 2003 com a presidência de Néstor Kirchner (até 2007) e se prolongou com sua mulher, Cristina Kirchner, eleita em 2007 e reeleita em 2011.

Néstor sofreu um infarto e faleceu em 2010.

Os Kirchner, ex-militantes da esquerda peronista nos turbulentos anos 1970, chegaram ao poder apadrinhados por caciques moderados e de centro-direita do Partido Justicialista. Depois, deram uma virada para o que passou a ser chamado de novo progressismo latino-americano.

"Néstor Kirchner construiu uma forte liderança e foi bem-sucedido em reorientar o país pelo caminho do crescimento econômico e social", disse à AFP o sociólogo Manuel Mora y Araujo, diretor local da consultoria Ipsos, com sede em Paris.

A redução no índice de desemprego de 19,8% para 7,9% amparou o kirchnerismo, que também criou uma espécie de Bolsa Universal por Filho para subsidiar 3,5 milhões de pessoas, membros de famílias pobres, segundo o órgão de Previdência Social, enquanto a economia cresceu 7,2%, em média, nessa década.

"A primeira década do século XXI foi a de maior crescimento da América Latina em seus dois séculos de história. Na Argentina, Néstor Kirchner aproveita isso e ganha popularidade", disse à AFP o cientista político Rosendo Fraga.


Fraga, que é diretor da consultoria Nueva Mayoría e membro da Academia Argentina de História, acrescentou que "o modelo de Néstor Kirchner oscilou entre o populismo do (falecido presidente venezuelano Hugo) Chávez e a social-democracia do PT (Partido dos Trabalhadores) no Brasil".

O filósofo favorito dos K, professor Ernesto Laclau, da Universidade britânica de Essex, reivindica o populismo, "porque garante a democracia".

Os Kirchner, cuja carreira política começou na patagônica e despovoada província de Santa Cruz (sul), emergiram como líderes, depois da pior crise da história argentina deflagrada em 2001, quando foi rompida a paridade do peso com o dólar e declarado o "default".

Outro eixo do modelo kirchnerista foi derrogar as leis de anistia e indultos aos comandantes da ditadura (1976-1983), iniciativa que reabriu os julgamentos por crimes contra a Humanidade com mais de 200 condenações em dez anos, incluindo a do ex-ditador Jorge Videla, que morreu na prisão na sexta-feira passada, aos 87.

Os K, que foram um casal até no exercício do poder, também substituíram membros da esvaziada Suprema Corte para compor um tribunal prestigioso, que ocasionalmente confrontou seu governo.

O acúmulo gradual de poder foi tamanho que, dos parcos 22% obtidos no primeiro turno em 2003, chegou-se a 45% em 2007 e 54 em 2011, ambos com Cristina.

"Mas Cristina K se afasta do Brasil e se identifica com Chávez, com estatizações, controle do câmbio, congelamento de preços e uma política externa que inclui a aproximação com o Irã", analisou Fraga.


O discurso político de confronto do casal se amplificou com a atual presidente, e aumentaram os escândalos por denúncias de corrupção de uma imprensa em forte oposição ao governo.

"Foi extraordinário o feito nos direitos humanos e na economia, mas nos discursos Cristina ofende as pessoas, maltrata as pessoas e briga com os agricultores, com a imprensa, não tolera a crítica", disse à AFP o sociólogo Jorge Giacobbe, diretor de uma consultoria e assessor da ONG Transparência Internacional.

Milhares de cidadãos foram várias vezes às ruas para protestar contra a falta de segurança, contra a corrupção, contra o controle cambial que impede a compra de dólares para se proteger da inflação - que, segundo os economistas, chegou a 25,6% em 2012 - e contra o que chamam de "autoritarismo K".

O governo também intensificou o confronto com um dos maiores grupos de mídia da América Latina, o Clarín, que recorreu à Justiça para evitar uma lei antimonopólio que o forçaria a se desfazer de rádios e emissoras de televisão.

Ao mesmo tempo, Cristina seduziu o eleitoral com medidas como a criação do Futebol para Todos, que tirou das mãos da TV privada o direito de exclusividade nas transmissões desse esporte, de longe o mais popular na Argentina.

Uma recente pesquisa da consultoria privada CEOP revela que o maior apoio da população é para os programas Futebol para Todos (88,2%) e "Asignación por Hijo" (71,2%).

"Se Cristina K não tiver uma vitória contundente nas eleições legislativas deste ano (outubro), não poderá reformar a Constituição para um terceiro mandato e, provavelmente, será sucedida por um peronista moderado que tomará o caminho do modelo brasileiro", avaliou Fraga.

As tensões políticas e econômicas que têm agitado o país "são uma prova de que vem um fim de ciclo, o que se reflete nas nossas pesquisas", completou Giacobbe.

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