É proibido sorrir na Coreia do Norte hoje
Embora seja feriado hoje na Coreia do Norte, esboçar um sorriso ou falar alto em público são ações vetadas no 20º aniversário da morte do fundador do país
Da Redação
Publicado em 8 de julho de 2014 às 12h43.
Seul - Embora seja feriado nesta terça-feira na Coreia do Norte , esboçar um sorriso ou falar alto em público são ações vetadas durante o 20º aniversário da morte de Kim Il-sung, o fundador do país e considerado um "pai" por seus cidadãos.
Desde que 1994, quando os norte-coreanos perderam seu primeiro líder, a cada 8 de julho "está proibido sorrir, levantar a voz na rua, beber álcool ou dançar, embora ninguém cogite fazê-lo porque todo o país está de luto", contou à Agência Efe a refugiada norte-coreana e ativista Park Yeon-min, de 21 anos.
A rede de televisão estatal norte-coreana dedicava o dia a transmitir a solene cerimônia oficial em homenagem ao designado "presidente eterno", assim como filmes sobre sua vida e obra glorificadas com narração entre o mito e a ficção pela incessante máquina de propaganda do regime.
O culto à personalidade de Kim Il-sung chega até um ponto em que hoje, da mesma forma que a cada 8 de julho e também 15 de abril - o aniversário de seu nascimento -, o regime tenta minimizar os frequentes cortes de luz no país para que todos os norte-coreanos possam assistir à maratona televisiva de eventos e filmes sobre o ditador.
A Coreia do Norte dedica ao falecido "grande líder" mais de 34 mil estátuas em todo o país, a cujos pés os cidadãos depositam habitualmente flores, enquanto seu corpo é exposto embalsamado dentro do Palácio do Sol de Kumsusan, em Pyongyang.
A maioria dos analistas políticos concorda que tanto seu filho, o "querido líder" Kim Jong-il, que governou durante 17 anos até falecer, em 2011, como seu neto, o atual líder Kim Jong-un, fracassaram em tentar herdar a admiração e o profundo respeito que os norte-coreanos professam ainda ao falecido fundador.
No caso de Kim Jong-il, seu mandato esteve marcado pela fome e a crise econômica, embora a propaganda e a repressão lhe garantissem a fidelidade do povo, enquanto os 31 anos de idade de Kim Jong-un o tornam inexperiente aos olhos dos norte-coreanos, segundo a maioria dos analistas.
Jang Jin-sung, escritor norte-coreano refugiado em Seul que chegou a ser próximo da elite de Pyongyang, garante que o jovem líder fracassou ao tentar imitar a imagem de seu avô, e o regime se viu obrigado a mudar sua estratégia propagandística.
"Kim Il-sung era retratado como um pai que recebe o povo e o protege em seus braços enquanto, no caso de seu neto, ele é mostrado se aproximando das pessoas", disse à Efe o escritor e criador da ONG New Focus International, que investiga os segredos do complicado e opaco Estado comunista.
O fervor que Kim Il-sung desperta na Coreia do Norte tem suas raízes na colonização japonesa de Coreia (1910-45), período durante o qual, segundo a amplificação da propaganda, despontou como o herói do movimento de libertação contra o domínio japonês.
Após a Segunda Guerra Mundial, Kim aproveitou habilmente o surgimento da Cortina de Ferro para fundar, com o apoio da União Soviética, a nova República Popular Democrática de Coreia (RPDC) e se tornar líder do país, em 1948.
Pouco depois, ele ordenou a invasão à Coreia do Sul , o que deu origem à Guerra da Coreia (1950-53), um conflito que confirmou a divisão do povo coreano.
O chamado "grande líder", que nunca renunciou a seu sonho de unir as duas metades da Coreia em um regime comunista sob seu comando, preparou nas seguintes décadas uma nova invasão ao sul que nunca aconteceu e ordenou vários ataques terroristas ao governo de Seul que custaram centenas de vidas.
Kim Il-sung também inspirou a ideologia "juche", o socialismo ortodoxo baseado na autossuficiência que prolongou o auge econômico nos anos 70, mas acabou arruinando o país nos anos 90 com uma crise de fome que matou um décimo da população e que provocou uma grave crise humanitária que dura até hoje.