Síria: na Guta Oriental, sitiada pelas forças do governo desde 2013, vivem cerca de 400 mil pessoas em condições críticas (Bassam Khabieh/Reuters)
AFP
Publicado em 22 de fevereiro de 2018 às 06h43.
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) exigiu nesta quarta-feira (21) acesso à Guta Oriental, reduto rebelde perto da capital síria e que o governo bombardeou pelo quarto dia consecutivo, matando ao menos 50 civis.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, exigiu junto ao Conselho de Segurança a suspensão "imediata" dos combates nesta região.
Desde domingo, a nova campanha aérea de ataques com bombas e barris de explosivos contra Guta Oriental deixou 320 civis mortos, entre eles 76 crianças e 45 mulheres, e mais de 1.650 feridos, detalhou o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH).
Na Guta Oriental, sitiada pelas forças do governo desde 2013, vivem cerca de 400 mil pessoas em condições críticas, com casos de desnutrição.
"Devem autorizar nossas equipes para que cheguem à Guta Oriental e socorram os feridos", declarou em comunicado Marianne Gasser, representante do CICV na Síria.
As equipes médicas "são incapazes de fazer frente a este grande número de feridos e não há remédios nem material médico suficientes na região", assinalou Gasser.
Nesta quarta-feira, os bombardeios custaram a vida de ao menos 50 civis, incluindo oito crianças, e feriram mais de 350, de acordo com o OSDH. Os ataques atingiram várias localidades, principalmente Hamuriyé e Kfar Batna. Além das bombas, os aviões lançaram barris de explosivos, um método denunciado pela ONU e por ONGs internacionais, de acordo com o OSDH.
Os bombardeios também alcançaram vários hospitais.
"O governo pretende apontar contra grupos armados (...), mas na realidade aponta somente contra os civis!" - denunciou Ahmed Abdelghani, um médico que trabalha nos hospitais de Hamuriyé e Arbin, bombardeados.
"Isso é um hospital civil (...) Por que o governo aponta para nós?" - acrescentou.
"Tentamos evacuar dezenas de feridos e transferi-los a outros hospitais, mas ainda não pudemos sair por causa da intensidade dos bombardeios", indicou à AFP Abu Ibrahim, médico do hospital de Saqba, atingido na segunda e quarta-feira pelos bombardeios.
"Nos escondemos nos cemitérios. É como se cavássemos nossa própria cova antes de morrer", contou Amal Al-Wuhaibi, uma vizinha de Duma.
Na terça-feira, a aviação russa bombardeou a Guta Oriental pela primeira vez em três meses, indicaram o OSDH e o grupo islamita Jaish al-Islam, uma das duas formações rebeldes da região. Moscou desmentiu a afirmação.
A nova campanha aérea contra Guta Oriental começou no domingo após a chegada de reforços visando uma iminente ofensiva terrestre que ainda não começou.
O governo quer reconquistar essa área, de onde os rebeldes disparam obuses contra Damasco.
A Guta Oriental é o último reduto controlado pelos rebeldes perto da capital síria.
Nos últimos meses, o governo conseguiu retomar o controle de várias localidades dos arredores de Damasco mediante os chamados acordos de reconciliação, que implicam a evacuação dos combatentes em troca do fim dos bombardeios e do cerco.
Antes da Guta Oriental, várias zonas rebeldes, como a cidade velha de Homs, em 2012, e Aleppo, em 2016, foram esmagadas pelas bombas e submetidas a um cerco asfixiante, obrigando os rebeldes a entregar as armas e provocando a fuga dos civis.
O conflito entre o governo e os rebeldes se tornou rapidamente uma guerra civil muito complexa, com a participação de grupos extremistas e potências estrangeiras.
Em novembro de 2015, a Rússia interveio militarmente para apoiar o governo de Bashar al-Assad, que estava em uma difícil situação.
A intervenção russa, sobretudo aérea, e o apoio de milícias iranianas e do Hezbollah libanês, permitiu a Assad recuperar em dois anos o controle de mais da metade do território do país, vencendo, segundo as zonas, os extremistas do Estado Islâmico (EI) e os rebeldes.
Os bombardeios do governo continuam apesar dos protestos internacionais.
António Guterres reclamou a suspensão "imediata" dos combates para permitir que a ajuda humanitária chegue, enquanto nos próximos dias pedirão ao Conselho de Segurança que vote um projeto de resolução para impor um cessar-fogo de um mês na Síria.
Enquanto isso, a Rússia solicitou para quinta-feira uma reunião de urgência do Conselho de Segurança para abordar este assunto.
Forças favoráveis ao governo sírio continuaram se mobilizando em Afrin, região do norte da Síria invadida pelo Exército turco, que quer expulsar as Unidades de Proteção Popular (YPG), uma milícia curda que a Turquia considera "terrorista".
A Turquia afirmou nesta quarta que qualquer grupo que ajude as YPG será atacado pelas Forças Armadas turcas e seus aliados sírios.