Mesquita em Xinjiang: casais poderão receber 10 mil iuanes por ano (Mark Ralston/AFP)
Da Redação
Publicado em 11 de setembro de 2014 às 11h20.
Pequim - Em plena ebulição do conflito em Xinjiang, no noroeste da China, entre a população "uigur", de religião muçulmana, e a majoritária "han", um condado da região tomou a iniciativa de oferecer uma compensação econômica aos casamentos inter-raciais para tentar restabelecer a paz e a harmonia.
O casal receberá o bônus quando comprovar que a união se mantém em harmonia depois de cinco anos de casamento.
Essa é a principal condição imposta pelo condado de Qiemo, também conhecido como Qargan, aos casais "uigur" e "han" que se casarem.
A outra, que o casamento tenha acontecido depois de agosto, quando entrou em vigor a legislação, confirmada à Agência Efe pelas autoridades locais e que aparece no site do governo de Qiemo, onde se especifica que esses casais poderão receber 10 mil iuanes (US$ 1.600) ao ano.
Embora à primeira vista não pareça um valor alto, é considerado muito significativo para a região, que tem renda média anual de 7.400 iuanes (pouco mais de US$ 1.200).
Se a recompensa não for incentivo suficiente para quem está "em idade para casar", as autoridades acrescentaram que os futuros filhos dos pombinhos estudarão de graça no condado até o ensino médio.
A partir de então receberão um subsídio que varia de três mil a cinco mil iuanes anuais caso se matriculem em universidades da região.
Como presente final de casamento, caso um dos dois parceiros não tenha emprego - dependendo da escolaridade, segundo o site oficial - receberão ajuda para encontrar um adequado e, depois de três anos de casamento, poderão ter "compensações" no alojamento e em atendimento médico.
A medida busca persuadir, principalmente os "uigures", de se casarem com chineses da etnia "han", já que 72% dos cerca de 100 mil habitantes registrados no censo local pertencem ao primeiro grupo e o cortejo costuma ser basicamente endogâmico em ambas as comunidades.
Mas por que esse empenho das autoridades em fazer papel de cupido? Um funcionário do condado explicou recentemente em um jornal local: "As diferentes etnias compartilhamos o mesmo céu, a mesma terra e o mesmo amor no coração. O casamento entre diferentes etnias é uma maneira para o estudo, o respeito e a promoção mútua".
"Nosso maior objetivo é estabilizar Xinjiang e promover a integração étnica", acrescentou o artigo.
No entanto, a estabilidade na região parece um assunto mais complexo de solucionar do que com casamentos, após um ano de tensões exacerbadas que deixaram mais de cem mortos em confrontos entre "uigures" e a polícia ou em "ataques terroristas".
Essa é a versão do governo central, argumentando que as tensões se devem ao ânimo separatista de forças terroristas de Xinjiang, influenciadas por jihadistas de países vizinhos, enquanto grupos "uigures" no exílio atribuem as tensões à opressão política e cultural à qual são submetidos por Pequim.
Nesse cenário a medida corre o risco de ser interpretada como uma tentativa de assimilação "uigur" na cultura "han" - chamada de "hanização" por alguns analistas, principalmente por ser uma das poucas áreas de Xinjiang em que a população dessa etnia, aparentada dos povos de Ásia Central, supera a majoritária chinesa.
Isto é resultado, em parte, de décadas de políticas maciças de emigração "han" para Xinjiang que favoreceram que o povo "uigur" seja "a etnia do planeta que mais sofre com o desemprego, com uma taxa de 60%", como denunciou o intelectual "uigur" Ilham Tohti, preso há meses acusado por Pequim de separatismo.
Por essas e outras razões Dilxat Raxit, membro do Congresso Mundial Uigur no exílio, disse na semana passada à "Radio Free Asia" que "o governo de Qiemo está utilizando recompensas para tentar acelerar a assimilação dos "uigures"".
"Nossa cultura é diferente da "han" em todos os aspectos", reforçou.
Sem ainda saber se em agosto houve novos casamentos inter-raciais registrados no condado, resta esperar para ver o resultado da ação alcoviteira das autoridades.