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A matéria que está no centro da nova briga entre Twitter, Facebook e Trump

A menos de um mês da eleição, posts sobre o filho de Joe Biden são a nova fonte do cabo de guerra entre as redes sociais e o presidente Donald Trump

Hunter Biden, filho de Joe Biden: matéria questiona o possível uso da influência do pai na Ucrânia (Paul Morigi/Getty Images)

Hunter Biden, filho de Joe Biden: matéria questiona o possível uso da influência do pai na Ucrânia (Paul Morigi/Getty Images)

CR

Carolina Riveira

Publicado em 15 de outubro de 2020 às 09h01.

Última atualização em 16 de outubro de 2020 às 13h06.

A repercussão de uma reportagem sobre um dos filhos de Joe Biden é centro do novo embate entre as redes sociais e o presidente americano, Donald Trump.

As desavenças começaram após o jornal New York Post, do mesmo dono da Fox News, publicar sobre a suposta influência na Ucrânia de Hunter Biden, filho do presidenciável democrata. As fontes do material vêm sendo questionadas pelo restante da imprensa americana.

Diante da falta de confirmação em torno da reportagem, em um movimento sem precedentes, tanto Facebook quanto Twitter decidiram reduzir a visibilidade da matéria em suas plataformas.

O caso acontece a menos de um mês da eleição presidencial americana, marcada para 3 de novembro (mais de 9 milhões de pessoas também já votaram com antecedência). Biden, por ora, tem ampliado a vantagem nas pesquisas nacionais e nos estados decisivos.

Primeiro, o Facebook anunciou na quarta-feira, 14, que reduziria a visibilidade da matéria em seu algoritmo até que as informações fossem checadas pelas agências parcerias da empresa. O chefe de comunicação do Facebook, Andy Stone, disse que o procedimento é habitual e que a plataforma reduz a visibilidade de informações que carecem de confirmação.

Já o Twitter, horas depois, foi além e anunciou que iria bloquear completamente os posts com link para a reportagem até que as informações fossem esclarecidas.

Quando algum usuário tenta publicar a matéria no Twitter, recebe uma mensagem afirmando que o conteúdo é "potencialmente danoso". Ao clicar nos links já postados, outra advertência também aparece.

https://twitter.com/TwitterSafety/status/1316525303930458115

Só neste ano, as redes sociais já tiveram momentos de limitar a distribuição de conteúdo considerado questionável -- inclusive conteúdos compartilhados ou escritos pelo próprio Trump, como um vídeo compartilhado pelo presidente que afirmava que a hidroxicloroquina era a cura para a covid-19, embora não haja comprovação científica.

Mas é a primeira vez que as redes barram um conteúdo de um jornal mais estabelecido. O New York Post é um dos jornais mais antigos dos Estados Unidos, fundado em 1801, e tem milhões de leitores. Atualmente, pertence ao empresário Rupert Murdoch, mesmo dono da Fox News. Seus canais são conhecidos nos EUA pela cobertura favorável ao presidente Donald Trump.

Na outra ponta, o jornal vem sendo acusado de espalhar teorias conspiratórias que não foram checadas nos últimos meses. Um dos casos mais conhecidos neste ano foi uma matéria, de abril, que repercutia sem contexto declarações de auxiliares de Trump de que o empresário Bill Gates teria ajudado a espalhar o coronavírus "para colocar chips" em humanos.

O presidente Donald Trump primeiro disse "obrigado" ao New York Post por expor o que chamou de "corrupção massiva" em torno de Biden. Após os bloqueios, o presidente não escreveu diretamente, mas retuítou postagens afirmando que as empresas de tecnologia "estão tentando roubar uma eleição".

Em meio à repercussão da notícia do Post e dos bloqueios, o Facebook e as redes sociais também têm sido questionados sobre a própria forma como funciona seu algoritmo. Ao privilegiar notícias com mais reações ou interações, o algoritmo pode terminar dando mais espaço, mesmo que de forma não intencional, a informações mais sensacionalistas e não verificadas.

A menos de um mês das eleições presidenciais nos EUA, em 3 de novembro, as plataformas vêm sendo pressionadas a tomar medidas contra a desinformação, tema que já marcou as últimas eleições presidenciais americanas, em 2016, e em outros lugares do mundo, incluindo o Brasil. A crise do coronavírus também vem demandando medidas das plataformas. Só nesta semana, o Facebook anunciou que barrará anúncios contra vacinas e o YouTube, do Google, disse que vai remover vídeos com teorias conspiratórias contra vacinas da covid-19.

No que consistem as acusações contra Biden

Não é de hoje que se discute nos Estados Unidos uma potencial relação imprópria entre o ex-vice-presidente Joe Biden e a Ucrânia, quando seu filho Hunter Biden trabalhava para uma empresa de energia ucraniana. Até hoje, contudo, as acusações não foram provadas.

Desta vez, a matéria do New York Post se baseia em e-mails que teriam sido obtidos em um computador abandonado.

Segundo a publicação, alguém teria entregue um computador para conserto em uma loja em Delaware, estado natal dos Biden, mas nunca voltou para buscar o computador ou pagar pelo serviço. O dono da loja, ao ver o selo da fundação Beau Biden (que leva o nome de outro filho de Biden, já morto), fez uma cópia dos arquivos. Ele nunca entrou em contato com os Biden para receber o pagamento, mas, em vez disso, teria entregado a cópia ao advogado do ex-prefeito de Nova York, Rudy Giuliani.

Giuliani, dentro do Partido Republicano, é um dos principais nomes que têm tentado nos últimos dois anos conseguir informações sobre a participação de Hunter Biden na Ucrânia.

Os arquivos são compostos por fotos pessoais de Hunter Biden e e-mails que teriam sido trocados por ele. Segundo as mensagens, o filho de Biden estaria tentando ganhar influência na Ucrânia para acabar com investigações contra uma empresa ucraniana de energia para a qual ele estava trabalhando na época, chamada Burisma.

Hunter Biden também teria apresentado o pai a um executivo da Burisma. A campanha de Biden apresentou a agenda do ex-vice-presidente naqueles dias e afirmou que a apresentação não aconteceu.

A reportagem também diz que o ex-vice Joe Biden pediu à Ucrânia que demitisse o promotor Viktor Shokin. A imprensa americana, contudo, apontou alguns problemas na evidência. O promotor Shokin, ao contrário do que diz o Post, não estava investigando a Burisma na época, segundo os registros oficiais. Segundo disseram ex-oficiais ucranianos ao Washington Post em julho, o promotor teria sido demitido justamente por estar sendo ineficiente em investigações de corrupção como essa.

A contratação de Hunter Biden pela Burisma possivelmente tem, de fato, o desejo de que Hunter influenciasse o pai. Mas não há evidências de que Biden ou os Estados Unidos tenham exercido algum tipo de ação favorável à empresa ucraniana.

Uma das polêmicas em torno do conteúdo é a suspeita de que ele teria sido obtido por hackers. Em janeiro deste ano, foi comprovado que hackers da Rússia obtiveram e-mails da Burisma. Foi justamente esse tema, somado às divergências na reportagem, que fizeram as redes sociais reduzirem seu alcance.

Os contatos de Giuliani entre a inteligência americana responsável pelas investigações contra hackers russos também têm sido citados para colocar em xeque a afirmação de que o computador veio de uma loja de informática.

Ainda segundo o Post, não foi Giuliani quem transmitiu as informações para a reportagem; elas teriam sido obtidas por fontes próximas ao caso. Outro questionamento é que a repórter responsável pela matéria só publicou até hoje três reportagens, todas nesta semana, de modo que seria mais difícil acreditar que ela pudesse ter, sem experiência, apurado a história sem o consentimento de Giuliani.

Entre as idas e vindas sobre o caso, não se sabe ainda o quanto a história vai impactar a campanha eleitoral americana.

 

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