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Beatles, a construção de uma marca eterna

Os Beatles, a mãe de todas as bandas, acabaram há 40 anos. Mas sua marca continua sendo uma das mais poderosas do mundo

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

Num ano marcado pela morte de Michael Jackson, em que as melhores esperanças da combalida indústria fonográfica estavam depositadas na enorme procura por seus álbuns e coletâneas, os Beatles surgem para bater todos os recordes de vendas de CDs. Sim, 40 anos após seu término, a banda formada por Paul, John, George e Ringo, os quatro garotos de Liverpool, mostra que continua a ser uma das marcas mais poderosas do planeta. O nome Beatles e tudo o que ele representa - rebeldia, revolução, qualidade e inovação - ainda hipnotiza a geração de filhos e netos de seus primeiros fãs.

Em meados de setembro, a banda chegou ao topo da lista dos álbuns mais vendidos da revista americana Billboard, principal indicador de vendas de discos nos Estados Unidos e termômetro da indústria fonográfica mundial. O lançamento dos 14 álbuns dos Beatles em versão remasterizada, a cargo da EMI, detentora dos direitos, levou milhões de consumidores às lojas. Em cinco dias, 2,3 milhões de cópias de CDs simplesmente desapareceram das prateleiras. A procura fez com que os Beatles tivessem cinco entre os dez álbuns mais vendidos do ranking geral da Billboard, batendo a marca do próprio Michael Jackson (que tem três discos entre os dez mais vendidos do ano) e de estrelas populares, como o rapper Jay-Z e a cantora Beyoncé. Simultaneamente ao lançamento dos CDs, a emissora MTV e a distribuidora Viacom lançaram o Beatles Rock Band, videogame adaptável a vários tipos de console, que, em apenas uma semana, entrou para o grupo dos cincos jogos mais vendidos nos Estados Unidos, na Europa e no Japão. A expectativa é que sejam vendidos 5 milhões de cópias do game até o fim do ano. "Ninguém ignora que os Beatles são provavelmente a marca musical mais forte que já houve, mas a capacidade de renovar seu apelo comercial sempre surpreende", diz Luiz Garcia, gerente de marketing estratégico da EMI Brasil, responsável pela distribuição dos álbuns da banda no país.

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Quase ninguém discorda de que há um abismo de qualidade entre a produção musical dos Beatles e do rapper Jay-Z, mas não é só isso que faz de John Lennon, Paul McCartney, Ringo Starr e George Harrison ícones da música até hoje. Há muito marketing - bom marketing - por trás da marca Beatles. Uma das táticas para preservar sua mística é manter longos hiatos entre cada leva de lançamentos de produtos que recebem a grife. Desde que os quatro músicos se separaram, em 1970, houve apenas quatro grandes "ondas". Em 1987, lançaram seus álbuns em CD - depois que as outras grandes bandas, como Rolling Stones e Pink Floyd, já haviam feito a digitalização de suas músicas. O segundo grande lançamento só veio em 1995. Batizado de Anthology, o projeto reuniu os ex-integrantes Paul McCartney, Ringo Starr e George Harrison para a gravação de três álbuns com músicas inéditas deixadas por John Lennon, assassinado 15 anos antes. Em 2000, lançaram o álbum Beatles 1, a primeira coletânea de grandes sucessos do grupo. A procura foi tão grande que o CD entrou para o Guinness Book como o álbum que vendeu mais cópias no menor espaço de tempo em toda a história: 13,5 milhões de cópias no primeiro mês. "Esse é o tempo do amadurecimento de uma geração", diz Alejandro Pinedo, diretor-geral da consultoria Interbrand no Brasil. Para Pinedo, trata-se de uma estratégia semelhante à adotada pela Disney na exploração comercial de seus clássicos. A empresa criada por Walt Disney costuma dar um intervalo de sete anos entre os lançamentos de novas versões de desenhos como Cinderela ou Branca de Neve. Na prática, ao programar esses intervalos, os Beatles conseguem renovar constantemente sua legião de fãs. Uma pesquisa feita nos Estados Unidos e divulgada em agosto pelo Pew Research Institute, especializado em comportamento, mostrou que os Beatles estão entre as quatro bandas favoritas por gente de todas as faixas etárias. A pesquisa também constatou que os Beatles estão em segundo lugar entre os astros pop mais admirados por jovens de 16 a 25 anos, logo atrás de Michael Jackson.


Além de estratégica, a demora para levar novos produtos ao mercado tem uma explicação, digamos, menos nobre. Segundo o americano Bill Stainton, autor do livro 5 Best Decisions the Beatles Ever Made ("As cinco melhores escolhas que os Beatles fizeram", numa tradução livre), sobre o modelo de negócios da banda, a complexa rede de autorizações necessárias para o fechamento de cada contrato é outro fator que define a velocidade dos lançamentos. Além dos ex-Beatles e de seus herdeiros, executivos da Sony/ATV (dona do catálogo com as músicas da banda) e da EMI (que detém o direito de distribuição dos álbuns) precisam avaliar cada proposta. "É muita gente para entrar em acordo", diz Stainton. Para que as decisões desse grupo sejam respeitadas, foi preciso criar uma rede de proteção com severas restrições ao uso da marca e uma afiada equipe de advogados. Os ex-Beatles vivos, Paul McCartney e Ringo Starr, e as viúvas Olívia Harrison (de George Harrison) e Yoko Ono (de John Lennon) não permitem a inclusão de músicas da banda em coletâneas com outros artistas, e a marca não pode ser vinculada a campanhas comerciais de produtos que não os dos próprios Beatles. Também são vetadas promoções com os discos da banda - até hoje eles são vendidos com preços de álbuns novos.

Essas restrições já renderam aos representantes dos Beatles longas batalhas judiciais contra empresas como Nike e Apple. Em 1987, a Nike foi processada pela banda por utilizar a música Revolution num comercial de TV. Os ex-integrantes da banda não haviam sido consultados e cobraram 15 milhões de dólares na Justiça. O comercial saiu do ar e chegou-se a um acordo (o valor jamais foi revelado). Com a empresa de Steve Jobs a pendenga foi mais longa e muito mais cara. O motivo era o nome Apple, que batizava a empresa criada por Jobs em 1976 e também a empresa dos Beatles, fundada oito anos antes, a Apple Corps. Depois de 25 anos de briga, o caso foi resolvido - de acordo com o noticiário da época, Jobs teve de desembolsar mais de 500 milhões de dólares.

A próxima "invasão" do quarteto de Liverpool deve coincidir com os Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, quando os Beatles vão ser explorados como um dos símbolos do país. A Disney já anunciou que vai recriar o filme Yellow Submarine, um desenho animado estrelado pelos quatro músicos em 1968, para lançá-lo em versão 3D no ano dos Jogos. O cineasta americano Martin Scorsese também trabalha numa biografia de George Harrison, que morreu de câncer em 2001. Os ex-integrantes da banda sabem que eles mesmos ainda têm muito material para explorar quando quiserem. Há centenas de horas de gravações que nunca foram divulgadas e Paul McCartney já afirmou que gostaria de lançar em breve uma faixa gravada em 1995 com os demais integrantes da banda. Quarenta anos após seu fim, os magistrais Beatles continuam a ser referência - na arte e nos negócios.

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