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Dólar não tem grande espaço de queda, diz Alfredo Menezes

Ícone do mercado brasileiro, gestor acredita em alta da moeda americana no segundo semestre; sua gestora, a Armor Capital, tem apresentado retornos e número de cotistas crescentes

Alfredo de Menezes, CEO, CIO e fundador da Armor Capital (Leandro Fonseca/Exame)

Alfredo de Menezes, CEO, CIO e fundador da Armor Capital (Leandro Fonseca/Exame)

Guilherme Guilherme
Guilherme Guilherme

Repórter de Invest

Publicado em 18 de julho de 2023 às 16h05.

Última atualização em 2 de agosto de 2023 às 14h04.

Considerado um dos maiores especialistas em câmbio do mercado brasileiro, Alfredo Menezes, CEO, CIO e fundador da Armor Capital, não vê espaço para o dólar seguir em trajetória de queda no Brasil. Pelo contrário, sua projeção é de que a moeda americana deverá subir do atual patamar (próximo de R$ 4,80) para R$ 4,90 até o fim deste ano e encerrar 2024 a R$ 5,10. O maior gatilho para a queda do dólar neste ano, afirmou em entrevista à Exame Invest, já ficou para trás. 

"O primeiro semestre é o melhor momento de fluxo de dólar para o Brasil e o quarto trimestre é o pior momento. Então, o dólar deverá subir até o fim do ano." 

Atento aos fundamentos da moeda, Menezes, inclusive, tem uma visão pouco consensual sobre os fatores que derrubaram o preço do dólar em R$ 0,50 no primeiro semestre. A balança comercial, disse, foi o principal motivador por trás da valorização do real. "Sem dúvida", pontuou. Fatores como o avanço do novo arcabouço fiscal e da reforma tributária, segundo ele, não tiveram mais de 30% de participação na queda do dólar neste ano.

Para Alfredo de Menezes, a atuação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem surpreendido positivamente, mas não teve maior peso, por exemplo, do que o da queda do dólar no mundo. Isso, disse Menezes, tem relação com o controle melhor que o esperado da inflação americana e com a desaceleração chinesa. "Com a China crescendo menos, há menor pressão de preços e o combustível é um peso importante da inflação americana."

Por outro lado, o gestor acredita que essa maior fraqueza da China ainda poderá cobrar o preço na bolsa brasileira, em especial, sobre as ações da Vale, com a maior participação do Ibovespa. No primeiro semestre, a mineradora caiu mais de 25% na bolsa e Menezes acredita que há espaço para o papel cair ainda mais. 

Enquanto as ações da Vale caem, seu principal fundo, o multimercado Armor Axe, tem apresentado rentabilidade, patrimônio e número de cotistas crescentes. Desde o início do ano, o fundo rendeu cerca de 10,3%, equivalente a 146% do CDI. Em todos os anos, desde sua criação em 2019, o fundo apresentou retorno positivo e acima do indicador de referência. O número de cotistas também tem passado por um grande aumento desde que a Armor abriu o fundo para todo o tipo de investidor, neste ano, retirando a necessidade de ser qualificado. Em relação ao fim de 2022, a quantidade quase que triplicou, beirando a marca de 1.000 cotistas. Tudo isso, enquanto toda a indústria convive com números decrescentes. "A boa rentabilidade frente às maiores gestoras da indústria tem aumentado o interesse dos investidores por nossos fundos".

Ex-chefe de Tesouraria do Bradesco, Menezes está no mercado desde o início dos anos 1980. Em seus fundos, Menezes tem mantido a veia trader que desenvolveu em décadas de carreira, sempre em busca de boas oportunidades para ficar comprado -- ou vendido. 

Alfredo Menezes em entrevista à Exame Invest (Leandro Fonseca/Exame)

Confira a entrevista com , Alfredo Menezes, CEO, CIO ese fundador da Armor Capital.

A última ata do Copom fez o mercado apostar de vez no início do ciclo de queda de juros em agosto. Mas ainda há dúvida sobre a intensidade do primeiro corte. Qual é a expectativa da Armor Capital para a próxima reunião e as seguintes?

Eu, particularmente, acredito que o corte deveria ser de 0,5 ponto percentual (p.p.), porque a inflação deverá surpreender para baixo neste ano. Muito disso devido ao preço das commodities. A China deverá crescer entre 4,5% e 5%. Então, o petróleo e o minério não têm espaço de alta. O combustível deverá ajudar na inflação. Mas, olhando a linguagem do Roberto Campos Neto [presidente do BC]. Pelo discurso, a impressão é de que o corte será 0,25 p.p. Mas não descarto um corte de 0,50 p.p. em agosto. Como um todo, não estamos com um crescimento muito forte no Brasil. Esperamos por mais uma de 0,5 p.p. em setembro.

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Vê espaço para um corte de 0,75 p.p.?

Isso deverá ocorrer nas decisões de novembro e dezembro, com a Selic fechando o ano a 11,25%Quando sobe o juro é importante subir rápido, mas quando cai, é importante que seja devagar. Quanto mais rápido o Banco Central sobe o juro, menor é a taxa final e quanto mais devagar cai, é possível impor uma taxa final mais baixa.

Qual seria o piso dessa queda de juros? Hoje, o mercado tem o consenso de 9% para o próximo ano.

O mercado futuro, inclusive, está nessa taxa. O piso seria de 8,5%.

A Selic ainda pode surpreender para baixo?

O espaço é pequeno, porque a curva pré-fixada longa sempre vai ter um prêmio no Brasil. Há um descasamento de ativo e passivo muito grande. Tem o Tesouro tomando pré-fixado e mais a NTN-B e tem toda a parte de crédito bancário. Investidor em pré-fixado quase não tem. Quem aplica em pré-fixado no Brasil é o investidor estrangeiro, as tesourarias e os gestores, que, olhando a curva, acham que vai ser um pouquinho acima do CDI.

Se não tiver nada para ganhar, não vai ter o arbitrador. Então, a curva precificando a 9% já embute uma curva real de 8,5%. Esse prêmio, historicamente, é de 0,50 p.p. a 0,80 p.p. entre o que o mercado acredita e precifica. Eu diria que o mercado já está com 8,5% de consenso para o ano que vem, mesmo precificando 9%. Não tem mais prêmio na curva longa, acho que pode ter na ponta curta. Afinal, acho que pode cortar 0,50 p.p. na próxima reunião em vez de 0,25 p.p., mas derrubar 0,5 p.p., até porque derrubar 0,50 p.p. de uma taxa de 13,75% é nada quase. Percentualmente é muito pouco para afetar a política monetária. A difusão e os núcleos de inflação estão comportados, o que gera uma visão mais otimista no curto prazo com a inflação.

Como essa queda da Selic afeta o câmbio, tendo em vista que o Federal Reserve continua subindo a taxa de juros nos Estados Unidos? 

O Fed deverá fazer apenas mais uma elevação de 0,25 ponto percentual e encerrar o ciclo de alta de juros. Os núcleos da inflação americana têm dado bons sinais, tanto os da inflação ao consumidor quanto os da inflação ao produtor. Isso tudo sem afetar muito a atividade, o que é bom. Então, o carrego ainda vai estar muito alto. Outro ponto para entender o câmbio é o fluxo. O fluxo financeiro no Brasil foi negativo em R$ 14 bilhões. Quem ajudou bastante foi a balança comercial. A balança comercial contratada, que dá o fluxo, foi positiva em 29 bilhões. Então, o fluxo foi positivo em R$ 15 bilhões. 

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Então, foi a balança comercial que derrubou o dólar no primeiro semestre?

Sem dúvida. A balança comercial física do primeiro semestre foi R$ 46 bilhões e foi fechado só R$ 29 bilhões. Ainda sobrou um estoque de dólar para o exportador.

Esse estoque de dólar ainda vai entrar no Brasil?

Um dia, teoricamente. Normalmente, o exportador traz o dinheiro para pagar impostos, folha de pagamento.

A taxa de juros do que jeito que está é um atrativo para o exportador trazer esse dinheiro e aplicar em juro? 

Teoricamente, sim. Mas é muito mais atrativo se o exportador estiver endividado e hoje são poucos os que estão. Quando a taxa de juros estava a 2% o exportador estava segurando mais que a metade no exterior. A taxa de juros influencia muito no carry trade e na vontade do exportador de trazer os recursos.

Na última carta, a Armor revisou a projeção de dólar para o fim de 2023 de R$ 5,10 para R$ 4,90. O que explica essa visão mais otimista para o real?

A balança comercial do primeiro semestre foi perto de R$ 46 bilhões. Projetamos uma balança de R$ 70 bilhões, mas tem surpreendido para cima. Os preços de duráveis que importamos tem caído, enquanto nossa proteína animal e vegetal (que é a soja) tem melhorado os preços. E tivemos recorde de exportação de soja e, possivelmente, teremos de carne. O que nos fez rever a projeção é a balança comercial e os termos de trocas que têm acontecido no Brasil.

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Outros agentes do mercado atribuem muito essa melhora do câmbio e da bolsa aos avanços de pautas econômicas em Brasília, como o arcabouço fiscal e a reforma tributária. Qual peso a política teve nessa queda do dólar? 

A queda do dólar no mundo teve maior peso. Tem moedas que se fortaleceram bastante. Mas é claro que a expectativa que se tinha com Fernando Haddad como ministro da Fazenda era bastante ruim. Então, ele surpreendeu positivamente. Fatores da política interna contribuíram com 20% a 30%. O grande vento foi o dólar fraco no mundo todo.

Isso porque o mercado passou a esperar um Fed mais brando?

O Fed vai subir só mais 0,25 p.p., no máximo mais 0,50 p.p., tanto que as curvas longas fecharam. Os títulos de high yield melhoraram muito. O high yield despencou em economias maduras, o que ajudou bastante.

O que explica esse Fed menos contracionista do que o mercado chegou a esperar? 

A inflação corrente, especialmente os núcleos e serviços, que também saiu abaixo do que se esperava. Acho também que o enfraquecimento China teve participação Com a China crescendo menos, há menor pressão de preços e o combustível é um peso importante da inflação americana. Isso melhora o viés da inflação e até atividade, já que o combustível é uma parte importante no comprometimento da renda do cidadão médio americano. A queda de commodities acaba sendo muito boa para os Estados Unidos.

O menor crescimento da China limita o potencial de alta do Ibovespa?

A nossa bolsa, em grande parte, são commodities metálicas e geração de energia. Na parte de geração, temos água sobrando. Então, não vejo pressão em preço de energia. As geradoras, portanto, não terão bons resultados, assim como as transmissoras. Também não vejo o minério de ferro subindo.

A Vale pode cair mais? 

Sim. A Vale sofre por dois motivos: pela queda do minério de ferro e pelo fortalecimento do real. Mas não só a Vale, toda a cadeia tende a sofrer um pouco nesse cenário.

Algum setor, entre os mais relevantes do Ibovespa, deve ter um bom desempenho nesse segundo semestre? 

O único setor que acho que vai melhorar bastante é o de bancos. Eles sofreram muito com a subida da taxa de juros, pois tinham uma carteira grande de títulos, o que prejudicou o resultado. Com o fechamento da taxa de juros, esse resultado volta. Não sou otimista globalmente com a bolsa de valores, sou otimista com um ou outro setor. Com os que dependem da China não consigo ser otimista.

Petrobras entra nessa história também ?

A Petrobras (PETR4) entra, mas já está bem descontada. É muito mais fácil vender outra petrolífera, mas a Petrobras entra também.

Faz sentido ficar vendido em petrolífera privada no Brasil?

Faz sentido. Acho que faz sentido ficar vendido em uma mineradora também. Inclusive, prefiro ficar vendido em uma mineradora do que em petróleo, até porque o preço está mais justo.

Além dos bancos, qual outro setor deve se beneficiar da queda da taxa de juros?

Acho que construtoras para classe C e D são muito boas, porque o crédito de longo prazo fica mais barato.

Varejo não? 

Depois do que houve com a Americanas, não me sinto mais confortável em ter ativos de varejo. Só Americanas teve problemas e os demais não? Pode ser, mas prefiro ter cuidado. Com certeza, o varejo deverá aumentar as vendas, mas eu não teria ativos.

Mesmo varejo de vestuário?

Eu não teria.

A Armor coloca projeção de R$ 5,10 para o dólar no ano que vem e R$ 4,90 para este ano. Até no Focus temos visto o dólar projetado para os próximos acima do previsto para este. O que explica essa expectativa de o dólar subir?

Temos um processo inflacionário brasileiro maior do que o de economias desenvolvidas. Uma parte já vem daí. A outra é que o primeiro semestre é o melhor momento de fluxo de dólar para o Brasil e o quarto trimestre é o pior momento. Então, o dólar deverá subir até o fim do ano. Normalmente, há muita remessa de juros e dividendos no último trimestre e o pessoal está repatriando pouco. É normal o dólar se valorizar no último trimestre. Há fluxos pontuais grandes de saída, o que gera volatilidade, mas não acredito em grandes oscilações até o ano que vem. A grande ajuda foi a balança comercial, que todo o mercado esperava por números mais modestos. 

Por que tende a entrar mais dólar no primeiro semestre?

Há menos compromisso [financeiro] de juros e, especialmente, dividendos. Segundo, o mercado aloca risco em emergentes em janeiro para realocar a alocação de risco, que é diminuída no último trimestre. No primeiro semestre, ainda tem a grande concentração de embarque de soja, que ocorre entre março e junho. É onde temos o maior fluxo

Dada essas condições, especialmente a diferença dos processos inflacionários, o real tende a perder valor ao longo do tempo frente ao dólar? Em 2050 poderemos ver o dólar bem acima do atual patamar?

Ninguém consegue prever isso, porque dependemos muito dos preços de commodities. É impossível desenhar um cenário de petróleo para 30 anos. Agora, a reserva de valor é sempre de quem teve soberania militar, desde a Roma Antiga. Hoje são os Estados Unidos. Então, não acredito na criação de uma nova reserva de valor.

E o bitcoin?

Não acredito, embora existam pessoas que admiro profissionalmente que acreditam que o bitcoin será a moeda do futuro. Pessoalmente, não acho. Primeiro, porque há uma insegurança tecnológica e porque acredito muito na moeda com soberania militar. O dólar tende a manter valor ou ganhar valor no longo prazo.

O mercado opera muito o iene japonês. Mas, seguindo essa lógica, há espaço para o renminbi ganhar relevância com o poder da China crescendo cada vez mais?

Muita gente defende isso, mas eu, pessoalmente, não acredito. O fato é que uma negociação utilizando a moeda da China torna menos eficiente os termos de troca do mundo e acaba sendo mais inflacionário. Não vejo essa hipótese. Quem vai fazer reserva cambial em renminbi? Não há nenhum país do Ocidente fazendo. Se isso não existe, dificulta-se os termos de troca. O BC opera dólar aqui no Brasil, mas não vejo eles operando uma moeda China.

Estamos conversando aqui já há algum tempinho e o senhor falou pouco de política, diferentemente de outros gestores. O mercado superestima o papel da política na economia?

É uma pergunta difícil de responder. O mercado é cíclico. Há vezes que o mercado passa por cima de tudo que acontece na política. De repente, surge alguma coisa pequena, o mercado estoura e cobra tudo de uma vez. Quando o mercado está mais pessimista, qualquer coisa azeda. Hoje em dia tem correspondido bem ao lado fiscal e político. Mas há vezes o mercado exagera para um lado ou para outro. A vantagem é que o Brasil hoje tem contas externas muito boas. O Haddad, que indicava ser muito expansionista, não está sendo. Isso é até uma surpresa positiva. O mercado tem o viés de estar mais otimista com os fundamentos. Só discordo em termos de bolsa, porque não acho que as empresas de energia e que dependem da China terão bons resultados. 

Empresas mais dependentes do ciclo local deverão ir bem?

Sim. Vendas do varejo deverão ir bem. Temos que ver como será a renegociação de endividados com os bancos. Se for um sucesso, sem dúvida nenhuma, fará com que o varejo melhore. Empresas voltadas para a classe C e D deverão ser bem beneficiadas. 

A queda da Selic já prevista para os próximos meses deverá ser suficiente para trazer fluxo para a bolsa?

Nenhuma taxa abaixo de 10% deve ser suficiente para levar a pessoa física de volta para a bolsa. O fluxo que poderá voltar é o de fundo de pensão e de fundação. Quando a NTN-B bateu de 6%, eles venderam bolsa e compraram NTN-B até cansar, porque é mais que a meta atuarial da maioria dos fundos de pensão. Se a taxa da NTN-B cair para 4,5%, poderá voltar a comprar bolsa. Esse fluxo deverá ser muito mais pelos fundos de pensão e previdência, porque 4,5% não paga o atuarial. 

Isso influencia a captação de fundos?

Muito.

Mais até do que as pessoas físicas?

Sem dúvida nenhuma. O fundo de pensão e previdência na bolsa, hoje, é maior do que o das pessoas físicas. O institucional será o grande fluxo quando a taxa de juros fechar. Eles estão sempre pensando no atuarial. Se o ativo que eles têm não paga, eles trocam. É um fluxo importante a se monitorar.

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