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Salários no freezer

Uma olhada nos acordos coletivos fechados até agora mostra que você deve se preparar para notícias ruins na hora de pedir aumento

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h33.

No começo, 2001 prometia ser um dos melhores anos para a economia brasileira. Como se sabe, tudo ficou na promessa. Que o digam os 27 mil funcionários da Bandeirante de Energia, de Campinas (SP). Para eles, este seria o ano da virada na política salarial da companhia. Todo mundo esperava para junho a implantação de um programa de reorganização de cargos e salários. A empresa já tinha destinado 10% do orçamento anual com pessoal e mais 2% da folha mensal para recuperar os salários, que estavam congelados há cinco anos. Então, vieram o racionamento de energia e a crise econômica. Resultado: a Bandeirante deve fechar o ano com uma receita de 500 milhões de reais a menos do que a meta traçada para o ano.

Diante do novo cenário, a empresa adotou a velha política salarial. A Bandeirante definiu corte de 22% no orçamento de pessoal. Congelou o quadro de funcionários. Limitou as horas extras. Suspendeu aumentos salariais."Todo mundo ficou boquiaberto com a suspensão do programa que beneficiaria muitos funcionários com promoções e aumentos por mérito", diz Carlos Figueiredo, gerente executivo de recursos humanos. Em 1996, os funcionários abriram mão dos reajustes salariais em troca de uma política de abonos oferecida pela companhia. Na época, a Bandeirante - então uma parte da estatal Eletropaulo - precisava reduzir a gigantesca folha de pagamentos para se preparar para a privatização. Em 2001, com a volta do equilíbrio, havia chegado o momento para a revisão na política salarial. Era o que todo mundo esperava.

Momento
A saga dos funcionários da Bandeirante não é única. Ela ilustra como a crise energética - seguida da crise econômica - foi o ponto de partida de uma mudança brutal nas expectativas salariais deste ano. No primeiro trimestre acreditava-se que o PIB brasileiro poderia se expandir 5% em 2001. A mais recente estimativa do departamento de economia do BBV Banco derrubou esse percentual para 1,7%. O cenário dificulta as negociações salariais. Além disso, reduz as chances de acordos contemplando a reposição integral da inflação (veja gráfico). Em junho, dois meses depois de anunciadas as medidas de racionamento de energia, metade das negociações não obteve reposição integral da inflação.

Negociação
Se a conjuntura econômica é determinante no desfecho dos acordos coletivos, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC mostrou eficiência em operar na adversidade. Na campanha salarial deste ano, encerrada na segunda quinzena de outubro, os 40 mil trabalhadores fecharam um acordo com as montadoras pelos próximos dois anos. Ficou acertada a reposição integral da inflação do período mais um aumento real de 2%, a ser concedido em 1o de novembro de 2002. Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, diz que o trabalhador não terá perdas em nenhum dos três cenários possíveis para a economia nos próximos dois anos. Se permanecer do jeito que está, se melhorar ou se piorar, haverá reposição integral do INPC. O resultado das negociações dos metalúrgicos do ABC, porém, pode vir a ser uma exceção nas campanhas deste segundo semestre.

A costura do acordo salarial dos bancários, por exemplo, não está sendo fácil. Com data-base em setembro, somente em outubro os bancários - cerca de 400 mil em todo o Brasil e 105 mil em São Paulo - receberam uma contraproposta da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) de reajuste de 4% mais um abono único de 750 reais. A proposta foi recusada e as negociações foram paralisadas.

Abonos
Não são apenas os salários fixos que se deterioram em conseqüência do desaquecimento econômico. A parte variável da remuneração, o abono e a participação em lucros e resultados (PLR) também acabam minguando em épocas de economia retraída. Em tese, isso seria uma verdade inquestionável. Executivos de RH observam, porém, que muitas empresas procuram manter uma política de remuneração competitiva para garantir que as metas de desempenho para o período sejam cumpridas. "As expectativas dos acionistas continuam altas, mas o mercado está em baixa. A solução para buscar as metas é criar uma remuneração variável desafiadora", observou Petros Katalifós, diretor de RH da Siemens. "Assim, os lucros não se reduzirão tanto." A política de abonos da Siemens, porém, não mudou, e os reajustes dos salários seguem os acordos da categoria dos metalúrgicos.

O executivo não tem dúvida de que o peso do salário fixo tende a perder espaço no mix da remuneração, especialmente no setor de telecomunicações, tão vulnerável aos caprichos do mercado. A retração dos negócios forçou a Siemens a demitir 300 dos 3,5 mil funcionários da área de informática e telecomunicações. O número de demissões somente não foi maior porque a empresa realocou pessoal para a área de telefonia móvel. Na Siemens, cerca de 65% dos funcionários recebem algum tipo de reajuste desvinculado do acordo coletivo, concedido por competência e performance. Essa parte variável vai de 10% a 30% (gerentes), chegando a 40% (diretores).

A parte variável do salário também está presente no setor bancário. Os bancos, após a onda de reestruturações dos anos 90, foram forçados a adotar uma gestão extremamente profissional. Esse é um dos motivos que levaram banqueiros e bancários a adotar um programa de remuneração variável único para todo o país. O acordo prevê pagamento fixo de 450 reais mais 80% do salário a todos os bancários. O valor é limitado a 7 mil reais. Além disso, os bancos são obrigados a distribuir, no mínimo, 5% do lucro obtido no período. Alguns bancos são mais agressivos e possuem um programa de PLR acima do acordo coletivo. BankBoston, Sudameris e Itaú são alguns deles. "Um mercado cada vez mais competitivo nos leva a uma busca pelos melhores profissionais", diz Marcelo Santos, vice-presidente de RH do BankBoston. A instituição tem 3,9 mil funcionários, grande parte alocada na rede de 60 agências. O executivo sintetiza o sentimento atual dos trabalhadores: medo de perder o emprego diante de um mercado desaquecido. O medo tem seu fundo de verdade. Principalmente para quem não estiver preparado para dar resultados financeiros mensuráveis. Os demais, porém, não têm muito com o que se preocupar. Santos e Katalifós, da Siemens, acreditam que as instituições vão precisar dos bons funcionários, e a única maneira de retê-los é com uma boa política de remuneração.

Futuro
Se as expectativas para este fim de ano não são boas, para o início do próximo são ainda piores. A tendência é que a atividade econômica permaneça deprimida, dificultando a recuperação salarial. Pior: o desemprego deve ser maior do que neste ano. O processo de ajuste do mercado de trabalho a uma economia retraída começa com redução de horas extras. Depois vêm o arrocho nos salários e o congelamento das contratações. As demissões costumam vir só em último caso, quando a recessão aperta. As três primeiras medidas já foram tomadas pela grande maioria das empresas. Uma pequena parte já começou a demitir. Por isso, a maioria dos especialistas acredita que a onda de demissões deve esquentar no início do próximo ano. As notícias podem ser melhores, entretanto, no segundo semestre de 2002. Espera-se que a economia americana dê sinais de recuperação, estimulando as exportações brasileiras, com impacto positivo no nível de atividade econômica. Esse conjunto de fatores pode reverter as expectativas pessimistas às vésperas das eleições presidenciais e esquentar as campanhas salariais. Até lá, porém, as notícias não devem ser boas no fim do mês.

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JAMAIS BLEFE
Negociar é como jogar xadrez. Requer muita paciência e cuidado. Um lance errado pode custar o jogo. Um passo em falso pode custar toda a negociação. Essa regra é seguida à risca por Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, quando fica frente a frente com os negociadores patronais. Marinho, de 42 anos, é um negociador respeitado até pelos patrões. Aprenda com ele as regras da negociação salarial:

Prepare-se para negociar. Marinho fez cursos no sindicato, mas diz que aprendeu mesmo com a experiência;
Antecipe os movimentos do outro lado e pense rapidamente em soluções antes que o problema seja apresentado;
É imprescindível conhecimento da empresa e do setor ao qual ela pertence;
Entenda a conjuntura econômica do país. "Saber avaliar o momento pode valer um bom acordo", garante o sindicalista;
Jamais blefe. Se a categoria decidir pela greve, ela tem de estar organizada para realizá-la. Em outras palavras, se você disser que vai embora se não for atendido, tenha realmente um plano B.

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