Dólar alto em 2023? O que esperar do câmbio com juros globais elevados e risco fiscal
Contas públicas preocupam, mas analistas veem inflação no exterior como obstáculo maior para queda do dólar
Beatriz Quesada
Publicado em 28 de dezembro de 2022 às 06h04.
Entre altos e baixos, o dólar caminha para encerrar a montanha-russa de 2022 em queda próxima de5%, cotado na casa dosR$ 5,28. Para o próximo ano, a expectativa do mercado, medida pelo Boletim Focus , é de que o dólar chegue a R$ 5,27 – praticamente estável em relação ao fechamento registrado naúltima sessão.
Existem, no entanto, três grandes obstáculos para que o preço da moeda se mantenha sob controle. Dois deles são externos: a trajetória de juros nas economias desenvolvidas e o desempenho das commodities . O terceiro é interno, e está associado ao risco fiscal sob o novo governo Lula .
Somados os riscos, agentes do mercado ouvidos pela EXAME Invest não descartam que o dólar chegue a um patamar entre R$ 5,40 e R$ 5,50 no próximo ano. Nos extremos, o risco de subir para os R$ 6 seria provável apenas no pior cenário possível, enquanto uma queda para abaixo dos R$ 5 nem sequer está no radar.
Inflação e juros globais ameaçam preço do dólar em 2023
A inflação tem sido a principal preocupação das economias desenvolvidas. Nos Estados Unidos , a inflação atingiu o maior nível em 40 anos em 2022, levando o Federal Reserve ( Fed, o banco central americano) a intensificar o ritmo de aperto monetário. Em sua última decisão do ano, o Fed elevou a taxa de juros dos EUA para o intervalo entre 4,25% e 4,5% – o nível mais alto desde 2007.
Para 2023, o perigo é que a inflação não mostre sinais de arrefecimento como o mercado espera. Se for este o caso, as taxas podem continuar subindo.
E como isso impacta o dólar? Taxas mais altas atraem investimentos para os Estados Unidos, tirando dólares de outras economias. O resultado é uma alta global da moeda americana, que impacta, principalmente, países emergentes como o Brasil. Em suma: quanto maior a taxa americana, menor é a expectativa de valorização do real.
Os últimos dados, no entanto, foram positivos. A inflação ao consumidor (CPI) nos EUA subiu 7,1% em novembro na base anual, abaixo do consenso de 7,3%. Ainda assim, analistas alertam que há um longo caminho até que o tema deixe de ser uma preocupação.
“O dólar só deve começar a perder força quando for possível visualizar o fim da trajetória de alta de juros nos EUA. E, embora tenham saído dados animadores sobre a inflação agora no final do ano, a visibilidade é baixa e ainda não há nada definido”, afirma Wilson Barcellos, CEO da Azimut Brasil Wealth Management.
O impacto das commodities e da China
A alta de juros nas economias desenvolvidas também traz um outro desafio: a possibilidade de recessão. Especialistas alertam que a disparada das taxas pode causar a contração das economias de diversos países – o que seria um golpe direto na demanda por commodities, principal produto de exportação do Brasil.
“Uma retração da atividade global significa uma demanda menor por bens, inclusive commodities. Então, é possível haver uma revisão de preços que impacta diretamente o real”, avalia Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset.
Existe, porém, a possibilidade de que a China consiga equilibrar a balança. A segunda maior economia do mundo tem flexibilizado sua política de restrição contra a Covid, o que aumenta a expectativa de alta na demanda do país asiático – maior consumidor das exportações brasileiras.
Nesta terça-feira, o preço do minério de ferro disparou para o maior nível em cinco meses de olho na retomada da demanda chinesa.
“Se a China cresce, o real se beneficia. É um fator que pode, até mesmo, compensar parte da deterioração fiscal que está no horizonte do novo governo”, completa Lima. A expectativa da Western é que o dólar flutue entre R$ 5,40 e R$ 5,50 no próximo ano.
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E o risco fiscal?
Quando Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito presidente do Brasil, a grande preocupação do mercado era de que o petista retomasse uma política de fortes gastos, sem equilíbrio nas contas públicas.
Desde então, qualquer sinalização de novos gastos é motivo de estresse no câmbio. Na véspera, por exemplo, o dólar disparou1,46%com o rumor que o governo deve prorrogar a isenção de PIS e Cofins sobre combustíveis por mais 30 dias.
Preocupa também a falta de uma nova regra fiscal. Antes mesmo de assumir, o governo conseguiu a aprovação da PEC da Transição , que abre um espaço de R$ 168 bilhões em recursos adicionais no Orçamento para custear os R$ 600 do programa Bolsa Família. A expectativa para 2023 é que a gestão Lula equilibre os novos gastos, apresentando uma alternativa de controle fiscal para manter a saúde das contas públicas.
“O que vai fazer a moeda andar não é o cenário fiscal do ano que vem, é o cenário de sustentação da dívida a longo prazo. A perspectiva é importante. Se o governo mostrar que não está comprometido em controlar a dívida, a moeda pode bater os R$ 5,80 ou até mesmo R$ 6,00”, afirma Alfredo Menezes, sócio fundador da Armor Capital. O cenário base da gestora é de um dólar entre R$ 5,20 e R$ 5,40 no próximo ano.
Menezes defende a necessidade de uma reforma tributária como prioridade número um para impedir a deterioração da dívida pública. O futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já sinalizou que a reforma será o primeiro foco de sua gestão, mas o mercado aguarda sinalizações mais claras. E isso, só em 2023.