Nelson Bunker Hunt em subcomitê da Câmara dos Representantes que investigava o crash do mercado de prata (Bettmann/Getty Images)
Guilherme Guilherme
Publicado em 3 de fevereiro de 2021 às 06h00.
Última atualização em 3 de fevereiro de 2021 às 07h12.
Depois de fazerem as ações da Gamestop dispararem mais de 1.000% e provocarem prejuízos bilionários em fundos com posições vendidas (que lucram com a queda do ativo), um grupo de pequenos investidores dos Estados Unidos escolheram outro alvo: a prata.
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A ideia é praticamente a mesma: combinar massivas ordens de compra para inflar o preço do ativo e provocar perdas tão grandes nos vendidos que sejam obrigados a se desfazer da posição, pressionando ainda mais o lado comprador.
Ainda que em proporções inferiores ao do caso Gamestop, o plano controverso voltou a causar efeitos no mercado. Desde quinta-feira, 28, a prata chegou a se valorizar 19,5% e superou pela primeira vez em oito anos a marca dos 30 dólares a onça troy.
Com a commodity em alta, os efeitos sobre as ações de mineradoras de prata foram colossais. Entre quinta e segunda-feira, 1, as ações da canadense Endeavour dispararam 45%, enquanto o ETF iShares MSCI Global Silver Miners subiu 24,5%.
A prática conhecida como “short squeeze”, porém, não é nova no mercado. E a história mostra que isso pode não acabar bem. No fim da década de 1980, um dos homens mais ricos da época tentou algo semelhante, elevando o preço da prata para o maior patamar da história. Mas acabou perdendo quase toda sua fortuna.
Em busca de proteção contra a crescente inflação americana do início dos anos 1970, o magnata do petróleo Nelson Bunker Hunt investiu pesado em prata, pagando cerca de 1,70 dólar a onça troy.
Com a inflação chegando a 12,3% em 1974, mais investidores recorreram à prata, levando seu preço a 5,60 dólares em meados daquele ano. Na época, o estoque de contratos de prata sob posse de Bunker Hunt e de seu irmão Herbert Hunt já estava em 55 milhões de onça troy, correspondendo a 9% do mercado, segundo a Business Insider. Mas os irmãos Hunt queriam mais.
Na expectativa de que o metal continuasse se valorizando, os dois mantiveram a enorme posição por cinco anos - até que em 1979 convenceram seus contatos da Arábia Saudita a comprarem 43 milhões de onças, elevando o preço do metal de 8 dólares para 16 dólares em oito semanas.
Para conter a supervalorização do metal, as bolsas de commodities dos Estados Unidos limitaram a quantidade que cada investidor poderia ter de prata e determinaram que os contratos acima de 3 milhões de onças deveriam ser vendidos até fevereiro de 1980.
Hunt chegou a acusar as bolsas de estarem vendidas em prata e aumentou a aposta no metal, comprando mais 32 milhões de onças. A estratégia era juntar com os sauditas uma quantia de contratos suficientes para que as bolsas precisassem comprar prata no mercado à vista para garantir a entrega física na data de vencimento - e assim garantir novas altas.
Mas o plano não deu certo. Logo após a prata bater 50 dólares a onça, as bolsas de commodities, com o apoio do governo dos Estados Unidos, proibiram a compra do ativo - medida semelhante à adotada por corretoras para frear o short squeeze da Gamestop.
Com apenas a venda permitida, o preço da prata despencou 20% nos dois pregões seguintes. Então, veio o golpe final: o Federal Reserve proibiu que bancos e corretoras emprestassem dinheiro para “propriedades especulativas de commodities ou metais preciosos”.
Quando o preço da prata já estava em 15 dólares a onça, Hunt recebeu uma chamada de margem de 135 milhões de dólares. Mas, sem conseguir pagar, sua posição começou a ser liquidada, inundando o mercado de prata e levando o preço da commodity a cair 50% em dois dias, atingindo 10,5 dólares a onça - 78,5% inferior ao preço de 10 semanas antes.
Embora desta vez não sejam bilionários por trás da manipulação do preço da prata, a forte valorização recente também pode ser apenas passageira. Nesta terça-feira, 2, o metal caiu 10%, enquanto a Endeavour, que subiu mais de 40% nos últimos dias, se desvalorizou 17,8%.