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Efeitos do Marco Legal das Criptomoedas serão sentidos "gradualmente", diz especialista

Lei brasileira voltada para empresas de cripto entrou em vigor nesta semana, mas regulamentação ainda terá outras etapas

Banco Central será responsável por regular empresas de criptomoedas (the-lightwriter/Getty Images)
João Pedro Malar

Repórter do Future of Money

Publicado em 21 de junho de 2023 às 15h22.

O Marco Legal das Criptomoedas entrou em vigor na última terça-feira, 20, trazendo uma série de novas regras e determinações para o setor cripto no Brasil. O principal objetivo da lei é tornar o investimento nesse segmento mais seguro, facilitando a investigação e punição a crimes envolvendo ativos digitais e estabelecendo o papel dos reguladores. Na prática, porém, seus efeitos ainda serão sentido "gradualmente".

É o que avalia Isac Costa, professor do Ibmec, sócio do Warde Advogados e ex-analista da Comissão de Valores Mobiliários ( CVM ), em entrevista à EXAME. Segundo ele, a lei já traz alguns elementos que terão aplicação imediata, em especial na esfera penal, mas diversos elementos dela só impactarão efetivamente o mercado quando outras etapas de regulamentação forem concluídas.

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O motivo é que, agora, haverá o início da chamada etapa de regulamentação infralegal. O governo federal definiu em um decreto publicado na semana passada que o órgão responsável por essa etapa será o Banco Central, que vai fiscalizar as empresas que prestam serviços com criptomoedas. Com isso, a autarquia precisará agora definir normas e regras específicas para o setor .

Próximos passos

Na visão de Costa, um dos efeitos imediatos da nova lei é a possibilidade de aplicação dos crimes especificamente tipificados para os casos em que há envolvimento de ativos digitais. Ele acrescenta, no Código Penal, um novo tipo de estelionato ligado a criptomoedas, atribuindo reclusão de 4 a 8 anos e multa para quem "organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações envolvendo ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento".

Além disso, o professor destaca que a lei também prevê a incidência do Código de Defesa do Consumidor para empresas que prestam serviços com cripto. Entretanto, outras determinações do texto, em especial as voltadas para as operações de empresas de cripto no Brasil, ainda vão demorar mais para serem efetivamente postas em prática.

Pelo Marco Legal das Criptomoedas, as empresas também deverão compartilhar um número maior de informações com órgãos do governo e precisarão de uma autorização para exercer as atividades no Brasil. Entre as medidas que as empresas precisarão seguir estarão regras mais rígidas de coleta de informações de clientes, e a verificação das mesmas, mais clareza sobre transações e fornecedores, além de regras de governança e avaliação de riscos.

"Deveremos esperar a regulação pelo Banco Central , que estipulará um procedimento de autorização. Na prática, exchanges sem autorização só poderão ser punidas daqui a um ano ou mais em razão do processo normal de consulta pública e produção das normas pelo Banco Central, além de regras de transição para que os participantes do mercado possam se adaptar", explica Costa.

O professor afirma que o processo de consulta pública sobro tema e consequente produção de normas específicas para o setor deve demorar entre "seis e doze meses", considerando outras consultas públicas recentes realizadas pela autarquia e também a "complexidade do tema". Ele ressalta, ainda, que "mesmo após a edição da norma, o Banco Central poderá permitir que os prestadores de serviços virtuais que já atuam no país tenham um tempo de adaptação, de modo que as novas regras sejam aplicadas apenas aos novos entrantes", o que também estenderia o tempo para a concretização das determinações do Marco Legal das Criptomoedas.

Ou seja, omais provável é que esses elementos contidos na lei cheguem efetivamente ao mercado apenas em 2024. Além disso, a CVM anunciou que está trabalhando na criação de um novo arcabouço regulatório para os criptoativos que sejam considerados valores mobiliários. A autarquia destacou que vai continuar trabalhando ao longo deste ano para o "desenvolvimento de novo arcabouço regulatório para a constituição e administração de mercados organizados de valores mobiliários, inclusive tokenizados".

O objetivo é criar "uma regulamentação mais compatível com os volumes transacionados e a complexidade de novos mercados". Pelo decreto do governo, o órgão ficará responsável por supervisionar e regular casos envolvendo o setor e empresas quando os criptoativos oferecidos por elas forem considerados valores mobiliários.

Segregação patrimonial?

Um ponto que gerou críticas por parte de especialistas foi a retirada no projeto do Marco Legal das Criptomoedas da necessidade das corretoras realizarem a segregação patrimonial , separando os seus ativos dos fundos de clientes. A medida, considerada importante para reduzir prejuízos em casos como a falência da FTX , chegou a ser incluída no Senado, mas foi retirada na Câmara.

Tatiana Mello Guazzelli, sócia do Pinheiro Neto Advogados, avalia que a segregação "propiciaria uma maior segurança a esse mercado". Nesse sentido, ela acredita que a regulamentação infralegal"buscará trazer uma maior proteção para os ativos mantidos por clientes nas exchanges, tanto em relação aos criptoativos quanto aos recursos em reais que geralmente os clientes transferem para as exchanges para a compra de criptoativos e ficam lá mantidos enquanto essa compra não é concluída ou, ainda, quando vendem criptoativos e não retiram os recursos da exchange".

Como não há previsão legal no momento, ela acredita que o BC não poderia exigir uma segregação patrimonial semelhante à das instituições de pagamento, precisando de uma lei específica sobre o tema. Entretanto, "seria possível criar algumas regras infralegais para proteger esses ativos, tais como regras contábeis ou vedação de as exchanges utilizarem esses ativos para determinados fins, como, por exemplo, determinar que uma exchange não pode dar os criptoativos detidos por conta e ordem de seus clientes em garantia de obrigações assumidas pela exchange.

"De toda forma, eu não descartaria a possibilidade da segregação patrimonial ainda ser abordada em uma lei separada", avalia a especialista. Já Nicole Dyskant, advogada especialista em regulação e compliance para ativos digitais, acredita que pode ser possível incluir o tema na etapa de regulação infralegal. A expectativa dela é que a exigência seja semelhante à imposta para meios de pagamento, mas o Banco Central ainda vai precisar avaliar se já tem respaldo legal para entrar no tema.

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