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UNICEF transforma sala de aula em estufa para alertar sobre o impacto das mudanças climáticas (UNICEF)
Redação Exame
Publicado em 28 de dezembro de 2025 às 08h00.
*Por Ricardo Henriques
Algumas imagens marcam a humanidade de forma definitiva.
A nuvem atômica sobre Hiroshima, em 1945, que despertou o mundo para a devastação nuclear. A menina correndo pela estrada no Vietnã, em 1972, símbolo da brutalidade da guerra. Esses registros nos obrigaram a enxergar o inaceitável — e a agir.
A crise climática produzirá, em breve, imagens igualmente incontornáveis. Talvez o desaparecimento completo de um país, como o iminente submergir de Tuvalu.
Talvez novas enchentes, secas e ondas de calor que desfigurem territórios inteiros.
Mas, ao contrário das tragédias que nos pegam de surpresa, essa é uma tragédia anunciada. E é justamente por isso que não podemos — e não devemos — alegar desconhecimento.
Na COP30, em Belém, essa percepção ficou ainda mais forte. Foi impossível caminhar pela cidade e não sentir a presença viva de quem mais sofre com os extremos climáticos: povos tradicionais, comunidades ribeirinhas, populações indígenas, famílias inteiras que resistem no território e que, mesmo diante da vulnerabilidade, carregam o conhecimento, a força e as soluções que o mundo precisa ouvir.
A Amazônia — e especialmente Belém — transformou a COP30 numa COP da implementação, do território, da pedagogia da vida real.
Em todas as mesas e encontros que participei, especialmente no debate com crianças, jovens e lideranças educacionais, uma verdade se impôs: não existe transição justa sem educação.
E não existe justiça climática se continuarmos ignorando que a crise do clima é, antes de tudo, uma crise de desigualdade — que recai com mais peso exatamente sobre aqueles que menos contribuíram para provocá-la.
O Brasil conhece essa realidade de forma dramática. O Rio Grande do Sul viveu, desde 2024, sucessivas enchentes que interromperam aulas, destruíram escolas e criaram um ambiente de medo entre estudantes — muitos passaram a temer ir para a escola em dias de chuva.
Por isso, desde o início, o Instituto Unibanco, entre outros parceiros, esteve ao lado da rede estadual, oferecendo apoio técnico, metodológico e emocional para fortalecer a resposta educacional à emergência.
Não apenas para reconstruir prédios, mas para reconstruir vínculos, rotinas e horizontes.
Essa experiência dialoga diretamente com uma agenda estratégica que o Brasil começa a consolidar: o novo Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 10 de dezembro.
Uma das grandes inovações propostas é justamente a inclusão de uma meta dedicada à sustentabilidade socioambiental — reconhecendo que enfrentar a crise climática exige currículo robusto, formação docente e planos efetivos de prevenção, mitigação e adaptação.
Sem isso, continuaremos despreparados para lidar com riscos cada vez mais frequentes.Mas não se trata apenas de proteger escolas. Trata-se também de formar pessoas para um mundo do trabalho em rápida transformação.
O relatório “Empregos e Habilidades para a Nova Economia” (Systemiq e World Resources Institute), lançado na COP30, reforça que a transição ecológica tem potencial para gerar 375 milhões de empregos na próxima década — mas também alerta para o risco real de aprofundar desigualdades se não houver investimento forte e consistente em competências, habilidades verdes e educação profissional.
Até 1 bilhão de trabalhadores terão de mudar de ocupação ou setor — exigindo requalificação massiva. O mesmo relatório indica três grandes desafios que ameaçam o sucesso da transição:
Políticas climáticas que não incluem o componente humano
Sistemas educacionais e formativos desatualizados
Baixo investimento em capacitação e requalificação
E ainda revela que a demanda por habilidades “verdes” cresce duas vezes mais rápido que a oferta de trabalhadores qualificados, o que pode atrasar a transição e até aumentar o aquecimento global.
No Brasil, esse desafio é evidente. Estamos abaixo da média da OCDE em formações STEAM, registramos queda de matrículas em engenharia e apenas 11% dos jovens de 15 a 19 anos estão no ensino técnico.
Sem uma estratégia forte, perderemos oportunidades concretas de desenvolvimento.
A COP30 deixou muito claro que não temos mais tempo para agendas desconectadas.
O planeta exige velocidade — mas também justiça.
E justiça se constrói com gente: com estudantes, gestores, professores e comunidades que precisam estar preparados para enfrentar emergências, mas também para imaginar futuros possíveis.
Este é o chamado global: colocar pessoas no centro da nova economia, com intencionalidade, inovação e investimento.
*Ricardo Henriques é economista, Superintendente Executivo do Instituto Unibanco e Professor Associado da Fundação Dom Cabral.