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Onde ela quiser

Na política, no esporte, na história, presentes e resistentes, elas falam com voz própria. Por que não podemos deixar de ouvi-las

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É possível pensar em uma voz característica da mulher quando elas divergem tanto entre si nas opiniões, circunstâncias e inclinações práticas? (PeopleImages/Getty Images)

É possível pensar em uma voz característica da mulher quando elas divergem tanto entre si nas opiniões, circunstâncias e inclinações práticas? (PeopleImages/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 27 de agosto de 2022 às, 08h00.

Por Daniela Grelin*

À medida em que o radicalizado debate em torno das eleições de 2022 vai ganhando contornos mais definidos, evidenciam-se as intenções e inclinações próprias do voto das mulheres.  Uma pesquisa de intenção de voto publicada pelo BTG Pactual [1] aponta para a dinâmica própria da escolha feminina, sugerindo que o caminho crítico para a vitória em outubro passa necessariamente pela capacidade de criar conexões com os valores, as perspectivas e a voz distinta das brasileiras.

Mas será que é possível pensar em uma voz característica quando elas divergem tanto entre si nas opiniões, circunstâncias e inclinações práticas? Acredito que tanto quanto é possível pensar sobre estilos característicos de cognição, demandas sociais prioritárias e interesses próprios delas. Reconhecê-las em suas peculiaridades é uma forma de responder a uma ordem social construída a partir do silenciamento desta voz e, ao fazê-lo, ampliar a dimensão ética e eficácia prática do programa de país que elas também construirão.

Levar em consideração a voz das brasileiras, por mais heterogênea que possa ser, muda a forma como a história é contada e como é construída, integrando  acordes complexos e ampliando o campo harmônico.

Comecemos por um ranking de interesses prementes das mulheres. Refiro-me a necessidades sociais frequentemente priorizadas por elas, embora longe de as afetarem exclusivamente. Uma pesquisa recente e ainda inédita do Instituto Avon[2] demonstra que os temas atenção ao câncer de mama e outros tipos da doença (principal causa de morte entre mulheres de 30 a 59 anos no Brasil[3]) e enfrentamento das violências contra mulheres e meninas são citados como causas prioritárias para estas que representam 53% das pessoas aptas a votar[4].

Agora, compare este dado à falta de proeminência destes mesmos temas no debate político. Fica claro o descompasso entre as preocupações vividas na esfera íntima da vida das mulheres e sua ausência nas arenas públicas de construção de soluções.

Esta dissonância é apenas um sintoma, bastante indicativo do desinteresse real  pela contribuição da mulher para o exercício da política, para a busca de soluções para suas demandas legítimas e para a ampliação do próprio horizonte moral do debate público, por meio da integração de dimensões de cuidado e responsabilidades das quais são as mais credenciadas porta-vozes. Quando falo em desinteresse real, refiro-me não à disposição de falar para ou pelas mulheres, mas à disposição em ouvi-las.

Para que possam ser ouvidas, é preciso que continuem se fazendo cada vez mais presentes e que sejam reconhecidas. É por isso que ainda é atual e necessária a afirmação “lugar de mulher é onde ela quiser”. Não é que estejam ausentes, seja da história ou do presente. Aprendi com a historiadora Mary Del Priori[5] que “a história nos ajuda a compreender que contra a engrenagem da repetição, contra o retorno da adversidade, há o desejo de autonomia e igualdade. Há a vontade de rejeitar a vitimização generalizada. Há o desejo de dizer ‘sim’ num mundo que diz ‘não’.”

Este desejo que sempre existiu e moveu as histórias de vida de mulheres que lutaram pela independência do Brasil, pelo abolicionismo, pela democratização, moldaram a história do nosso país e transformaram a repetição em inovação, vitimização em protagonismo, medo em coragem, limitação em criatividade, permanece vivo, abrindo caminhos e delineando novos horizontes de desenvolvimento inclusivo e sustentável.

Por tudo isso e para que continuemos a merecer a democracia da qual não abrimos mão, precisamos ouvir esta voz que nos chama, desde sempre, à vida, sua dignidade inviolável e suas múltiplas possibilidades.


[1] https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/07/5024432-uma-a-cada-quatro-mulheres-vota-em-bolsonaro-diz-pesquisa-btg-pactual.html

[2] Jornada da Mulher 2022, IPSOS.

[3] https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/edicoes/2021/boletim_epidemiologico_svs_29.pdf

[4] https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Julho/eleicoes-2022-mulheres-sao-a-maioria-do-eleitorado-brasileiro

[5] Mary Del Priori, Sobreviventes e Guerreiras; uma breve história da mulher no Brasil de 1.500 a 2.000.

*Daniela Grelin é diretora executiva do Insituto Avon

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