Energia: estudo aponta caminhos para o mercado de carbono no Brasil (Agency/Getty Images)
Rodrigo Caetano
Publicado em 8 de fevereiro de 2022 às 18h20.
Última atualização em 17 de fevereiro de 2022 às 10h58.
No ano passado, houve uma onda de compromissos climáticos empresariais. O número de companhias que prometeu zerar as emissões até 2050 (o compromisso carbono zero), como determina o Acordo de Paris, dobrou e atingiu 3 mil organizações.
Foi um passo importante para a descarbonização da economia, principal ação de combate às mudanças climáticas. No entanto, permanece a dúvida sobre a seriedade desses compromissos: até onde as empresas estão dispostas a ir para honrar a palavra, e quanto desse novo discurso pode ser classificado como greenwashing?
As empresas que adotam o compromisso net zero estão dizendo, basicamente, que deixarão de emitir carbono até determinada data, que varia de 2040 a 2050, aproximadamente. Isso significa, de fato, cortar as emissões.
A chamada compensação, que é quando uma empresa compra créditos de carbono de projetos verdes, como reflorestamento ou energia renovável, só é aceita de maneira complementar, ou seja, de uma pequena parcela das emissões que não podem, por motivos técnicos, serem eliminadas.
Um estudo publicado na segunda-feira, 7, de autoria das organizações climáticas New Climate Institute e Carbon Market Watch, analisou os compromissos de descarbonização de 25 empresas globais, entre elas duas brasileiras, Vale e JBS. A conclusão é que as metas atuais não são suficientes para que as companhias alcancem o net zero, ou carbono neutro.
De forma geral, diz o estudo, os compromissos assumidos são ambíguos e, em média, representam um corte de 40%, e não de 100% como anunciado. Segundo os autores, a iniciativa foi motivada pelo aumento expressivo no número de companhias que assinaram compromissos de descarbonização, que dobrou no ano passado, superando a marca de 3 mil corporações.
“A dificuldade em distinguir liderança climática de greenwashing é um desafio que, se superado, potencializa as ambições climáticas globais”, afirmam as organizações.
Entidades como Carbon Disclosure Project (CDP), que atua na certificação dos planos de descarbonização das empresas, e o Pacto Global, órgão da ONU que reúne o setor empresarial, questionaram o estudo -- Pacto e CDP formam o Science Based Targets Initiative (SBTi), iniciativa que busca criar um padrão de cálculo e divulgação de emissões baseado em critérios científicos.
A principal crítica ao estudo diz respeito ao universo de empresas estudado. Das 25 companhias, apenas uma teve seu plano de descarbonização aprovado pelo SBTi, modelo que já é usado como padrão pelo mercado financeiro. Metade teve metas de curto prazo aprovadas, porém, dessas empresas, nenhuma se comprometeu oficialmente com o net zero. As duas brasileiras sequer submeteram seus planos ao SBTi.
Como os créditos de carbono só são aceitos de maneira complementar, muitas empresas estão correndo para eletrificar suas frotas, comprar energia de fontes renováveis, reduzir deslocamentos e mudar os processos produtivos, com a adoção de modelos de economia circular, por exemplo.
O desafio é que há uma parte das emissões que as empresas não controlam: o carbono emitido por seus clientes e fornecedores. Esse é o chamado “escopo 3” de um plano de emissões — o 1 diz respeito às emissões controladas pela empresa, e o 2, às fontes de energia.
Há uma dificuldade intrínseca em calcular o volume das emissões de escopo 3. Empresas com compromissos recentes, muito provavelmente, não tiveram tempo de ir a fundo o suficiente na cadeia para apresentar a conta certa. Isso é um problema que o SBTi busca resolver.
“É importante lembrar que a SBTi é uma iniciativa que fornece métodos e ferramentas para que empresas estabeleçam metas de redução de gases de efeito estufa alinhadas aos objetivos do Acordo de Paris e com base na ciência”, afirma Carlo Pereira, diretor-geral da Rede Brasil do Pacto Global.
Segundo Pereira, ao assinar um compromisso com a iniciativa, as empresas têm até dois anos para apresentar suas metas para a validação, que podem ser aprovadas, ou não. “O comprometimento à iniciativa é apenas um primeiro passo”, diz ele. Em outubro do ano passado, o SBTi lançou o Padrão Net Zero, padrão de contabilidade de carbono que será a base para as revisões dos planos das empresas.
Nem todas as mais de 3 mil empresas comprometidas com o net zero utilizam o padrão SBTi. É provável que uma parte delas esteja fazendo greenwashing. Porém, como ressalta Pereira, é fundamental fazer esses compromissos com base na ciência, que é a base de atuação da SBTi. “Como o próprio SBTi ressalta, é importante que tenhamos cada vez mais entidades sérias estudando o tema e acreditamos que juntos vamos fortalecer a busca pela Agenda 2030”, completa o diretor.