Conselheiros: quão próximos ou distantes?
Não se deve entender que o papel primordial dos conselheiros é o de fiscalizar ou monitorar a gestão. Agregar experiência, conhecimento e apoio à gestão, é igualmente importante
Da Redação
Publicado em 21 de agosto de 2022 às 11h17.
No mundo da governança, quando se procura abordar a proximidade que um Conselho deve ter com relação a tarefa de executar as ações do plano de negócios, usa-se a expressão “ nose in, fingers out ” (nariz dentro, dedos fora). Ou seja, conselheiros não devem se imiscuir com as atividades atinentes aos gestores dos negócios.
Em termos genéricos, é mesmo esse o comportamento que devem ter os conselheiros.
Há, porém variações sobre o tema.
Costumo dizer que a atividade de governança atinge seu ponto ótimo quando os gestores enxergam seus Conselhos como umrecursoao qual podem recorrer na busca de aprimorar sua visão sobre os temas sobre os quais possam ter total domínio.
Uma vez que a formação do Conselho, na escolha de seus membros, é conduzida da forma apontada em meu último artigo , isto é, em seu corpo devem existir pessoas que detém reconhecida competência nas áreas que representam os maiores desafios à empresa e a seus gestores.
Muitas vezes confunde -se a necessidade de preservar a aderência aos mandatos - estabelecidos por molduras legais, regulatórias, estatutárias - como se esses documentos incluíssem uma provisão que proíbe aos administradores maior proximidade que permita extrair a melhor contribuição entre eles para obtenção do melhor resultado para a empresa. Assim, não se deve entender que o papel primordial dos conselheiros é o de fiscalizar ou monitorar a gestão. Agregar experiência, conhecimento e apoio à gestão, é igualmente importante.
É quase inconcebível que se atraia os melhores profissionais em matérias críticas para uma empresa e que sua contribuição seja dada durante algumas horas de reuniões mensais de Conselhos ou comitês, em que assuntos de várias naturezas competem por espaços de agenda. Há que haver a possibilidade de amplo acesso entre gestores e conselheiros, sempre que algo de real importância faça isso necessário. Claro que com total transparência sobre estes momentos e permanente comunicação ao Presidente do Conselho e da empresa.
Sinto a necessidade de repetir que a governança não é fim, ela é meio, e sua missão é contribuir para que sejam realizados os objetivos das empresas e obtidos os melhores resultados, tanto na busca de preservação de valor, como na geração de valor novo.
Em época recente, empresas mais jovens têm inovado nessa dimensão de abertura e proximidade na relação entre Conselho e gestão. Em uma delas - desse novo mundo digital - um ou dois conselheiros são destacados, num processo rotativo durante um certo período, para acompanharem as reuniões da diretoria executiva e tombarem numa “ata digital viva” os assuntos mais relevantes e que acreditam devam ser do conhecimento dos membros do Conselho, trazendo assim muita eficiência à tarefa de agregar valor.
A partir do conhecimento de algum assunto relevante em que possam agregar algo, os conselheiros tomam a iniciativa de fazê-lo. Aguardar a próxima reunião do Conselho ou comitê, pode significar perda de oportunidade. Não se trata de um conselheiro decidindo ou influenciando isoladamente, mas sim, provendo a contribuição que dele é esperada. Tudo isso é registrado na tal “ata digital viva”.
O pano de fundo desse assunto é a comunicação. Um sistema de governança deve praticar comunicação de forma intensa. Costumo dizer que governança, além de estrutura, processos e documentação, precisa estruturar bem a sua comunicação.
As decisões desses sistemas serão tão melhores quanto melhores forem as interações entre seus diversos atores, internos e externos, pois é a partir da explicitação e entendimentos de suas demandas e necessidades, que são formatadas as decisões.
Conselheiros e gestores são os agentes mais centrais nesse processo, portanto, a interação e a comunicação, entre eles, devem fluir com proatividade e liberdade.
*Jose Guimarães Monforte é economista, ex-presidente do conselho do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa e participou de conselhos de grandes empresas como Natura, Petrobras, Eletrobras, entre outras. Foi responsável por organizar a estratégia de governança da Natura, que resultou na abertura de capital da companhia, em 2004.