Roupas para mulheres criadas por homens: assim é o mercado da moda
Moschino e Alexander McQueen anunciam novos diretores criativos. O número de mulheres no comando das marcas vem caindo
Editor de Casual e Especiais
Publicado em 17 de outubro de 2023 às 11h13.
Última atualização em 17 de outubro de 2023 às 11h46.
O momento na moda, como acontece de tempos em tempos, é de dança nas cadeiras no posto de diretor criativo. A mais recente movimentação foi na Moschino, do grupo italiano Aeffe, anunciada nesta segunda-feira 16. Quem assumiu o comando foi o italiano Davide Renne. Sua primeira coleção deverá ser desfilada em Milão, no começo do ano que vem.
Outra mudança aconteceu também no começo de outubro. Na Alexander McQueen, do grupo Kering, o irlandês Seán McGirr, que dirigia o prêt-à-porter da JW Anderson, foi nomeado diretor de criação no lugar da estilista Sarah Burton, que estava no posto desde 2010.
Nos dois casos, quem assume a direção da marca é um homem. E não são exceções. As marcas de moda de luxo historicamente têm homens como estilista principal. Nos últimos tempos, essa proporção tem sido ainda mais prejudicial às mulheres.
Chanel, Prada e Hermès são chefiadas por mulheres
No passado, o mercado de criação da moda foi dominado por homens. Coco Chanel talvez seja o principal contraponto. Christian Dior, Hubert Givenchy, Karl Lagerfeld, Oscar de la Renta, Roberto Cavalli, Gianni Versace, Yves Saint Laurent, Valentino Garavani, entre tantos outros, são os nomes mais associados a esse mercado.
Em tempos mais recentes, segundo um levantamento do jornal Financial Times com 33 das principais marcas de moda, a proporção de mulheres em postos de comando é a mais baixa desde 2003.
Das 14 marcas do grupo LVMH, apenas três têm mulheres na direção. São elas Dior, com Maria Grazi Chiuri, Pucci com Camille Miceli e Fendi com Silvia Venturini. No grupo Kering, as seis marcas são chefiadas por homens. E todos brancos. A Prada tem a herdeira Miuccia Prada no posto de criação, mas ao lado de Raf Simons.
Sabato De Sarno na Gucci, Peter Hawkings na Tom Ford e Simone Bellotti na Bally estrearam no cargo de diretores criativos na mais recente Semana de Moda de Milão, em setembro. A Burberry nunca teve uma mulher desenhando as roupas de suas clientes.
Claro, há exemplos na direção contrária. Na Chloé, a alemã Chemena Kamali acaba de assumir o comando, no lugar de outra mulher, Gabriela Hearst. A Chanel conta com a francesa Virginie Viard como diretora de criação. A Hermès é chefiada desde 2014 por Nadège Vanhee-Cybulski.
Falta de diversidade de gênero e raça
Existe uma falta de diversidade de gênero, e também de raça. Pharrell Wiliams foi nomeado diretor criativo da Louis Vuitton, em substituição a Virgil Abloh. São casos únicos de negros pensando nas peças que serão apresentadas nas passarelas e vendidas nas lojas. E, vale reforçar, na linha masculina.
“Muitas pessoas sentem que na verdade não pertencem a essa indústria, que deveria ser para todos, porque veste a todos, mas acontece justamente o posto”, disse Thebe Magugu, o jovem designer sul-africano com uma linha homônima que ganhou o prêmio LVMH para jovens designers em 2019, ao The New York Times.
A falta de oportunidades e a baixa presença de mulheres em postos de chefia são problemas crônicos em diversas indústrias. No caso da moda, chama a atenção ainda a falta de lógica em um mercado movido a criatividade.
Para a colunista Vanessa Friedman, do The New York Times, um dos problemas é que, com origens e experiências semelhantes, surgem perspectivas semelhantes – e designs semelhantes. “Corre-se o risco de reforçar uma rotina em vez de escapar dela”, diz. “E se há uma coisa que a moda, uma indústria que depende do desejo, deveria compreender, é que designs semelhantes levam à estagnação.”
Friedman ressalta que essa é uma história que ocorre repetidamente e não apenas na moda, mas no cinema, na publicidade e na TV. “Quando uma estratégia parece funcionar há uma corrida louca para imitá-la, em vez de reconhecer que, nas áreas criativas, é exatamente aquilo que você não sabe que quer que se torna a coisa mais desejável”, afirma.
Para a colunista, o novo é justamente o que vai impulsionar o próximo ciclo do jogo da imitação. “Simplesmente seguir o que já existe pode ser seguro, mas não leva ao sucesso da inovação.”