O ator Antonio Salvador, que vive Prometheus. No espetáculo da Companhia Balagan, o titã perde o papel de protagonista (Mônica Côrtes)
Da Redação
Publicado em 25 de novembro de 2011 às 17h53.
São Paulo - Poucos mitos da Grécia antiga foram tão revisitados como o de Prometeu. O personagem, que apareceu pela primeira vez nos versos da Teogonia, do poeta Hesíodo, teria roubado o fogo de Zeus.
Como vingança, o líder dos deuses do Olimpo acorrentou o titã a um rochedo e fez com que ele fosse fustigado por uma águia durante milhares de anos. Tal história inspirou grandes autores do Ocidente, como Ésquilo, Platão, Goethe, Pirandello, Franz Kafka, Heiner Müller e Machado de Assis.
Na primeira incursão pela tragédia clássica em 12 anos de currículo, a Companhia Teatro Balagan bebe de todas essas fontes e propõe uma versão inovadora do mito à luz dos dias atuais em Prometheus – A Tragédia do Fogo, em cartaz no Tusp, em São Paulo.
Na dramaturgia assinada por Leonardo Moreira, mas criada coletivamente e ainda em constante mutação, Prometeu perde o papel de protagonista, função que assume na obra de Ésquilo mais conhecida em palcos brasileiros.
Sua saga é contada também por outros personagens que interagem com ele, gerando uma polifonia de vozes. Entre os relatos agregados estão os de Epimeteu, o irmão, os da Águia, que a tudo sobrevoa vigilante, e os de Pandora, primeira fêmea enviada por Zeus, com sua caixa que guardaria todos os males.
Ato Transgressor
O trabalho de multiplicar as vozes não se limita à estrutura narrativa. Na década passada, Antunes Filho foi decisivo para tirar a pompa do gênero trágico e valorizar a linguagem em peças dos clássicos gregos Sófocles e Eurípedes.
O projeto da Balagan, encabeçado pela diretora Maria Thaís, vai mais adiante: é um marco no aprofundamento da qualidade do trabalho vocal (preparação feita pelo ator Jean Pierre Kaletrianos).
A voz é pilar em intervenções individuais ou por meio do coro. Às poderosas imagens do texto somam-se os cânticos em grego arcaico. São recursos que evitam a simplificação do herói e ampliam os sentidos de seu ato transgressor para incutir reflexão. O espectador nota o desacordo entre a previdência e a imprudência, sejam divinas ou humanas.
O uso pouco convencional do espaço distribui a plateia em quatro ângulos. A cenografia de Márcio Medina e a iluminação de Fábio Retti sincronizam movimentos de cena por meio de cortinas, ora em plano aberto, ora fechado.
Em sua minuciosa criação, a companhia consegue redimensionar os ritos sacrificais e os vínculos ancestrais, como se os sussurrasse ao ouvido.
A PEÇA
Prometheus – A Tragédia do Fogo. Texto de Leonardo Moreira. Direção de Maria Thaís. Com Companhia Teatro Balagan (Antonio Salvador, Gustavo Xella e outros). Tusp (r. Maria Antônia, 294, SP, tel. 0++/11/3123-5233). 5ª a sáb., às 21h; dom., às 19h. R$ 20. Até 4/12.