Denúncia de abusos de mais de 500 atrizes abala o cinema sueco
Atrizes denunciam ter sofrido abusos e humilhações sexuais e criticam a "cultura do silêncio" que impera sobre a situação
EFE
Publicado em 11 de novembro de 2017 às 16h32.
Copenhague - Uma carta aberta na qual mais de 500 atrizes denunciam ter sofrido abusos e humilhações sexuais e na qual criticam a "cultura do silêncio" que impera sobre esta situação abalou o mundo do cinema sueco nos últimos dias.
Desde que o jornal conservador "Svenska Dagbladet" publicou na última quarta-feira em seu site a nota, as principais instituições de artes cênicas do país acabaram envolvidas em um escândalo que provocou reações de vários setores da sociedade sueca, inclusive do governo.
O texto relata como várias atrizes começaram a discutir a possibilidade de fazer uma declaração em conjunto sobre a campanha de denúncias de abusos com a hashtag "#Metoo" ("Eu também", em tradução livre do inglês), como elas criaram um grupo fechado nas redes sociais e, após receberem pressões anônimas de supostos assediadores, decidiram escrever esta carta aberta.
"A cultura do silêncio é generalizada em nosso meio. Os diretores e astros do sexo masculino são considerados gênios e a profissão os apoia, independentemente do que eles façam a seus colegas", diz o texto, assinado inicialmente por 456 atrizes, ao qual outras 100 aderiram no dia seguinte.
Entre as signatárias estão algumas das atrizes mais consagradas da Suécia, como Marie Göranzon e Lena Endre, e outros nomes, como o de Sofia Helin, protagonista da popular série de televisão sueco-dinamarquesa "The Bridge".
Os muitos depoimentos incluídos no documento relatam de forma anônima casos que vão desde humilhações verbais a abusos sexuais como carícias, masturbação e até casos de estupro ocorridos nas últimas décadas.
Uma das instituições mais mencionadas foi o Teatro Dramático Real - o prestigiado Dramaten -, cuja direção foi acusada por várias fontes anônimas ouvidas pelo "Svenska Dagbladet" de acobertar os atores masculinos e de ignorar as denúncias.
A ministra da Cultura da Suécia, Alice Bah Kuhnke, convocou nesta semana, com urgência, os diretores do Dramaten, do Teatro Nacional e da Ópera Real para discutir a situação.
"É preciso acabar com o que ocorre nos bastidores. Estou cheia de pena, ira, asco e vontade de lutar após ler os depoimentos", declarou a ministra no Instagram, no qual também anunciou que o governo começou a estudar um plano com ferramentas políticas "claras".
O primeiro-ministro sueco, Stefan Löfven, qualificou os fatos denunciados como "horríveis", "muito piores do que se poderia imaginar", e insistiu na necessidade de uma solução "radical".
A diretora do Instituto de Cinema Sueco, Anna Serner, disse que os depoimentos são "um soco no estômago", e a chefe da Ópera Real, Birgitta Svenden, denunciou que sofreu assédio quando era cantora na MetOpera em Nova York.
O Dramaten, que iniciou uma investigação interna contra um funcionário por assédio sexual, já anunciou que fará uma pesquisa com seu elenco, que poderá ser respondida de forma anônima, para denunciar casos de assédio e ofereceu ajuda jurídica e psicológica às possíveis vítimas.
Um dos principais fundos de financiamento de filmes na Suécia, o Film i Väst - cujos estúdios em Trollhättan são conhecidos como a Hollywood sueca -, se mostrou favorável a incluir um código de conduta em futuros acordos.
O Film i Väst já tinha anunciado há poucos dias que, em suas futuras colaborações com a produtora dinamarquesa Zentropa, do cineasta Lars Von Trier, seu sócio Peter Albaek não trabalhará mais como produtor-executivo, após suas declarações polêmicas.
Albaek minimizou as recentes denúncias de assédio sexual contra Von Trier feitas pela cantora islandesa Björk durante as filmagens de "Dançando no Escuro" (2000) e admitiu ter passado a mão em várias colegas, sem demonstrar qualquer arrependimento.
As denúncias de assédio sexual dispararam nas últimas semanas no mundo do cinema desde que surgiram as primeiras acusações contra o produtor de Hollywood Harvey Weinstein.
Dezenas de atrizes revelaram que foram vítimas de assédio e abusos sexuais do poderoso produtor, cofundador ao lado de seu irmão Bob da Miramax e da The Weinstein Company e expulso recentemente da Academia de Hollywood. EFE