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Coletivo quer popularizar o pão integral, considerado mais saudável

O pão é uma espécie de cavalo de Troia, uma maneira de disfarçadamente incluir ingredientes saudáveis para uma geração mais jovem

Pão integral: nos Estados Unidos, um coletivo quer popularizar o alimento (Oliver Parini/The New York Times)

Pão integral: nos Estados Unidos, um coletivo quer popularizar o alimento (Oliver Parini/The New York Times)

Guilherme Dearo

Guilherme Dearo

Publicado em 13 de março de 2020 às 08h00.

Última atualização em 13 de março de 2020 às 08h05.

Elmore, Vermont – Quando Blair Marvin começou a fazer e a vender pães 15 anos atrás, ela prometeu três coisas a si mesma: eles nunca seriam fatiados. Ela nunca os assaria em uma forma. E certamente nunca os embalaria em plástico.

Mas, três anos atrás, enquanto ajudava na escola em que seu filho, Phineas, cursava o primeiro ano, ela percebeu que tinha um problema. No almoço, seus amigos não estavam comendo os sanduíches feitos com os pães orgânicos que ela e seu marido produziam na Elmore Mountain Bread e que vendiam em supermercados locais. Claro, havia os sanduíches com o queijo de Vermont, feito com o leite de vacas criadas em Vermont. Mas o pão em geral vinha de uma empresa nacional, feito de farinha branca ou cheio de conservantes.

"Todas essas noções e esses padrões preconcebidos que eu tinha, nada disso importava. Se os colegas de Phineas não estavam comendo nosso pão, então estávamos fazendo algo errado", disse Marvin, de 39 anos.

Então, ela quebrou seu juramento. Usando basicamente farinha de trigo integral moída em um moinho feito pela New American Stone Mills, empresa de propriedade de seu marido, Andrew Heyn, ela desenvolveu um novo pão – macio, fatiado e embalado em plástico.

"Todo mundo deveria ter acesso a alimentos saudáveis. Estamos tentando fazer algo que seja reconhecível para a população em geral. É uma maneira de colocar pão de verdade na dieta das pessoas."

Blair Marvin, fabricante de pães em Elmore

Blair Marvin, fabricante de pães em Elmore (Oliver Parini/The New York Times)

Marvin e Heyn fazem parte de um coletivo de cerca de 40 padeiros, moleiros, professores e plantadores de trigo que trabalham com o Bread Lab (Laboratório do Pão), um famoso centro de pesquisa afiliado à Universidade Estadual de Washington que há muito se concentra no desenvolvimento de variedades de trigo específicas para regiões dos EUA. Desde abril de 2019, usando diretrizes estabelecidas pelo laboratório, o coletivo segue um objetivo comum: fazer um pão integral com aparência familiar e acessível o suficiente para atrair o grande público.

O Bread Lab o chama de "pão acessível", mas cada padaria do Bread Lab Collective faz uma versão ligeiramente diferente, baseada nos gostos e nos grãos locais. A Elmore Mountain Bread chama seu pão de Vermont Redeemer, por causa de um tipo de trigo local. A Zingerman's Bakehouse, em Ann Arbor, no Michigan, chama seu pão de State St. Wheat. A King Arthur Flour, uma empresa de propriedade de funcionários em Norwich, Vermont, batizou sua versão de Just Bread e publicou uma receita para padeiros domésticos em seu site. Ela vende 350 pães por semana e doa outros para os pobres, disse Karen Colberg, executiva-chefe da King Arthur Flour.

Seja qual for o nome, o pão acessível é feito em 20 estados americanos, desde Kalispell, em Montana, até New Haven, em Connecticut, e também na Inglaterra, no Canadá e na Austrália. Para cada pão vendido, dez centavos vão para o Bread Lab para ajudar a financiar a pesquisa de grãos.

O pão é uma espécie de cavalo de Troia, uma maneira de disfarçadamente incluir ingredientes saudáveis para uma geração mais jovem. Seu disfarce de pão de sanduíche padrão pode ser apenas uma tática de guerrilha necessária para incluir grãos integrais regionais na dieta do mundo desenvolvido.

"Se for crocante, as mães não vão dizer: 'Ei, precisamos fazer sanduíches de manteiga de amendoim e geleia com isso'", comentou Anthony Ambeliotis, membro do coletivo que vende uma versão acessível do pão por US$ 4,50 na Mediterra Bakehouse, sua padaria perto de Pittsburgh.

Apesar do crescente interesse na panificação e do declínio do consumo de pão branco, a maioria dos pães vendidos nos EUA ainda está longe do ideal em nutrientes e fibras. Mesmo os pães de grãos integrais que chegaram ao mercado nacional às vezes contêm conservantes químicos ou aditivos, como melhoradores de sabor ou açúcares.

"Por que é que 'acessível' tem de ser esse produto hipercentralizado e hiperprocessado?", disse Stephen Jones, diretor do Bread Lab, em sua cozinha de pesquisa coberta de farinha em Burlington, Washington.

Pães de Blair Marvin no supermercado Hannaford, nos Estados Unidos

Pães de Blair Marvin no supermercado Hannaford, nos Estados Unidos (Oliver Parini/Divulgação)

Desde que fundou o laboratório em 2011, Jones tenta reinventar o pão promovendo grãos regionais, criando variedades de trigo que têm um gosto bom, como cepas antigas, mas que tenham um bom rendimento, como a maioria dos híbridos modernos. Na conferência Grain Gathering, reunião anual que ele organiza no laboratório, entusiastas e membros do coletivo se reúnem para discutir como incorporar a pesquisa do laboratório à panificação artesanal.

"Antes, se você dissesse: 'Quero colocar meu pão em um saco plástico e quero que seja fatiado', as pessoas diriam: 'Acho que você está na conferência errada.' Mas, agora, é bom fazer um pão que seja bom para mais pessoas", contou Louie Prager, proprietária da Prager Brothers Artisan Breads, em San Diego, que vendeu 4.800 pães acessíveis no ano passado, a US$ 5 cada.

O Bread Lab estabeleceu três parâmetros rigorosos para o pão acessível: mais de 60 por cento da farinha devem ser de trigo integral; não pode ter mais de sete ingredientes, que têm de ser alimentos de verdade, não aditivos químicos; e não pode custar mais de US$ 6.

"É local, e conheço as pessoas que o fazem. Cinco ingredientes ou menos em um rótulo é o que procuro", disse Elaina Lefevre, de 27 anos, que compra regularmente o pão de Marvin para sua filha no supermercado Hannaford em Morrisville, Vermont.

O pão está entre as coisas mais simples e comuns que os humanos comem. Está até em nossas orações: o pão nosso de cada dia nos dai hoje.

Mas o pão também tem sido um catalisador de mudanças. Em 1789, seu alto preço levou manifestantes furiosos às ruas de Paris. Em 2011, aconteceu novamente, na Praça Tahrir, no Cairo.

"Não há nada mais revolucionário do que o pão, mas também não há nada mais mundano. É o que somos", afirmou Jones.

Jones geralmente trabalha com um avental com a imagem de um crânio e as palavras "Morte Branca em Fatias", sua armadura na cruzada por grãos integrais. Ainda assim, sua abordagem em relação à farinha branca e aos grãos regionais lhe rendeu o respeito de muitos no movimento locávoro.

"Acho que o que estamos fazendo é radical. É radical fazer alimentos bons, orgânicos e limpos acessíveis a mais pessoas", disse Prager.

Sem produtos químicos adicionados para manter o produto macio e livre de mofo, o pão acessível tem uma vida útil de cerca de uma semana.

"Não há razão para que o pão se mantenha por tanto tempo", declarou Jones, segurando um pão produzido em larga escala com data de vencimento de junho de 2018 e que ainda está macio. Ele o guarda no laboratório como exemplo.

Hoje, depois de milênios como item básico diário, o bom pão quase se tornou um item de luxo. A farinha de trigo integral pode ser cara, especialmente se for orgânica. Pães feitos a mão custam mais caro, pois os padeiros precisam ser pagos por seu tempo e sua mão de obra.

Mesmo US$ 6 pelo pão acessível pode ser um preço alto para muitas famílias. Mas o preço é próximo do da maioria das outras opções de trigo integral vendidas em supermercados. Os membros do coletivo esperam que, juntos, possam fazer o pão ser levado mais a sério.

"As pessoas se preocupam com lúpulo, queijo, café, laticínios e carne, mas nem pensam duas vezes nos grãos. Só que o pão é o mais alterado", disse Marvin.

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