OLIMPÍADAS DE INVERNO: pessoas tendem a adotar a política de sempre reduzir os riscos, inclusive físicos / Dylan Martinez/ Reuters
Da Redação
Publicado em 10 de fevereiro de 2018 às 07h47.
Última atualização em 20 de fevereiro de 2018 às 11h08.
12 Rules for Life: An Antidote to Chaos (“12 regras para a vida: um antídoto para o caos”, numa tradução livre)
Autor: Jordan Peterson
Editora: Random House Canada
448 páginas
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Jordan Peterson é um psicólogo (clínico e acadêmico) canadense que está rapidamente se transformando em uma celebridade. A causa disso são vídeos de suas aulas e entrevistas no YouTube em que ele dá conselhos a jovens, explica mecanismos mentais de uma forma inspiradora e que bate com a experiência de muitos.
Algumas de suas expressões mais recorrentes, como “sort yourself out” (que significa arrumar a própria vida e vencer nossos principais vícios) viraram verdadeiros slogans na comunidade de seus seguidores. Além disso, ele tem também se notabilizado por participar de polêmicas em debates sobre gênero e sobre o coletivismo de esquerda em geral.
Ele defende a primazia do indivíduo íntegro sobre as pretensões totalitárias de comandar a todos, que precisa de homens inseguros e incapazes de encontrar seu próprio valor no mundo.
Em seu recente livro 12 Rules for Life: An Antidote to Chaos (“12 regras para a vida: um antídoto para o caos”, numa tradução livre), contudo, estamos longe do mundo das polêmicas.
Aqui temos o Peterson psicólogo fazendo o que ele faz de melhor: falando de forma acessível, num tom não-condescendente, sobre como um indivíduo pode melhorar sua própria vida – ou melhor, sua atitude diante da vida. Para isso, ele articula diversos campos do conhecimento para construir uma visão quase mitológica do homem em sua batalha contra as forças do caos; isto é, da degradação de nossas capacidades e da falta de propósito.
A primeira regra, embora seja a mais simples, dá uma boa ideia do ímpeto geral da obra: “Fique ereto e com os ombros para trás”. É essa postura – e o que ela simboliza em termos de caráter e mentalidade – que ele quer ajudar seu leitor a conquistar. E esse trabalho começa justamente com o aspecto físico, que é central para a vida humana, se lembramos que o homem não é um espírito, mas um ser que se constitui em um corpo.
Na interdisciplinaridade que lhe é característica, ele usa o exemplo da lagosta, animal que, surpreendentemente, tem uma estrutura social hierárquica. Quando uma lagosta perde uma luta, ela fica encolhida; quando vence, seu corpo se expande. Isso manda um sinal para as outras de sua dominância, de modo que a vencedora aumenta, por isso mesmo, a probabilidade de que ela vença seus próximos confrontos. É um processo fisiológico que se repete na psicologia (e no cérebro) e no corpo humano, aliás usando dos mesmos hormônios em nós e nas lagostas. Nossa postura manda sinais sobre nossa capacidade e posição na hierarquia social e também tem efeito sobre a psique. O primeiro passo, portanto, para ter alguma ordem em meio ao caos, é melhorar a própria presença física no mundo.
Não cabe listar cada uma das doze regras, mas de maneira geral somos convidados a tratar de forma consciente e focada muitas áreas da vida que largamos nas mãos da sorte ou dos hábitos irrefletidos. O cuidado que devemos ter com nós mesmos, nossa escolha de amigos (que sejam pessoas que querem o nosso melhor, e não que nos puxam para baixo), nossa organização do tempo e até nossa maneira de falar.
Algumas das regras enfatizam uma mudança de atitude psicológica auto-sabotadora. É o exemplo da regra 4: “compare a si mesmo com quem você era ontem, e não com os outros”. É quase uma máxima de senso comum, mas com frequência, especialmente nas redes sociais, caímos no vício de nos comparar com outras pessoas, cujo resultado é a frustração e a perda de motivação; jamais seremos outra pessoa.
Outra é a regra 11: “deixe as crianças andarem de skate em paz”, que lida com nossa relação com o risco. Hoje em dia é comum adotar a política de sempre reduzir os riscos, inclusive físicos, a que estamos sujeitos. Mas essa postura diante do mundo conduz a uma vida contida e que fica aquém de seu potencial. A disposição de enfrentar riscos evitáveis, em busca de excelência ou de experimentar o desconhecido, engrandece o indivíduo e expande suas possibilidades de vida e autoconfiança.
Por fim, algumas regras adotam um ponto de vista quase religioso, e dizem respeito ao direcionamento do homem a algo maior do que si. Peterson não é religioso no sentido de acreditar literalmente nos dogmas de uma religião, mas entende que a perspectiva do sagrado e do bem absoluto é importante para a vida humana. Assim, se quisermos evitar que o caos tome conta, devemos perseguir um sentido maior para nossa existência (e não apenas viver atrás do que é útil para nossos fins mais mundanos), se acostumar a sempre dizer a verdade (preservando assim um sentido de integridade pessoal) e a valorizar as pequenas ocasiões de bondade e amor que se apresentam entre os sofrimentos do dia a dia.
Apesar de não ter muito das polêmicas sociais das quais Peterson tem participado (a esse respeito, recomendo uma entrevista recente dele ao Channel 4 inglês, com uma entrevistadora particularmente hostil) e de ser direcionado ao indivíduo, há um claro interesse social no livro. Peterson enxerga um grande risco de que nossa sociedade se perca em vidas totalmente desprovidas de sentido; um mundo em que hedonismo, indolência e ressentimento tomam conta. Trabalhando no nível individual, ele espera que uma mudança positiva de atitude possa se transmitir para toda a cultura.
Não há nenhuma dúvida: 12 Rules for Life é um livro de autoajuda. Mas é uma autoajuda mais profunda do que o que costuma receber essa classificação, resultado do trabalho de um psicólogo sério e que estabelece pontes interessantes entre psicanálise, mitologia, espiritualidade, zoologia e neurociência. Uma leitura simples, que talvez não seja revolucionária para ninguém (de uma forma ou de outra, já ouvimos muitas dessas regras), mas que pode de fato nos ajudar a pensar mais sobre como vivemos e como recuperar o ânimo para se reerguer quando tudo parece ir de mal a pior; ou seja, quando o caos ameaça tomar conta.
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Veja mais:
Entrevista de Jordan Peterson no Channel 4 (em inglês):
https://www.youtube.com/watch?v=aMcjxSThD54?rel=0&showinfo=0