2019 é o ano das carnes não convencionais
Carnes brasileiras que respeitam a relação dos animais com seus ambientes naturais são tendência para o churrasco
Paty Moraes Nobre
Publicado em 26 de janeiro de 2019 às 08h00.
Última atualização em 26 de janeiro de 2019 às 08h00.
Muitas vezes, boas ideias começam despretensiosamente em algum lugar e acabam se espalhando no “boca a boca”. E quando o assunto é carne , isso pode acontecer no sentido mais literal da expressão.
Foi assim nos últimos meses com as carnes que chamo de “não convencionais”. Carnes não convencionais são aquelas proteínas que ainda estão conquistando espaço de consumo ou aqueles novos cortes que não eram explorados com frequência.
Exótica? Não!
Assim como as plantas comestíveis não convencionais (PANCs), a melhor forma de classificar alguns produtos não deveria ser mais “carne exótica”. Afinal, algumas delas passaram a ser produzidas em larga escala, seguindo critérios estabelecidos pelos órgãos competentes, e são encontradas em grandes redes e supermercados.
Chamar essas carnes de exóticas distancia ainda mais as pessoas das histórias desses produtores e suas regiões e da importância sócio-econômica dessas atividades em todo o Brasil. Da mesma forma isso acontece com outras características, como as informações nutricionais e seus benefícios surpreendentes quando comparados aos das carnes do dia a dia. Isso tudo, é claro, sem mencionar o sabor!
Carnes brasileiras
Um exemplo é a produção de jacaré da espécie natural da região do Pantanal, no Mato Grosso do Sul, a caiman yacaré. A Caimasul é a maior fazenda de confinamento do País que promove o uso sustentável da carne com certificação ambiental do Ibama, muita tecnologia e inúmeras recompensas para a comunidade ribeirinha local. No último ano, a produção apresentou aumento de 200% nas vendas de pacotes com a carne porcionada e congelada em diversos cortes, como filé de cauda e coxas, dobrou. Há um mês, inclusive, novos produtos, como linguiças e hambúrgueres de jacaré, foram lançados.
No mesmo caminho, a produção de avestruz da Strut Alimentos, também no Mato Grosso do Sul, inicialmente ocupou um pequeno espaço do pasto bovino (adaptado no local há tanto tempo) com a criação para comercialização das aves, que são típicas da região. Agora o negócio se expande a passos largos: passou a fazer abates semanais (antes, eram quinzenais) e prevê a distribuição das peças de filé mignon, picanha, pescoço e coxa em todos os estados brasileiros este ano.
Os dois exemplos já se enquadraram no conceito exótico, assim como a carne de javali ou rã. Vale lembrar que, na França, por exemplo, a carne de cavalo é consumida sem estranhamento e está bem longe de ser um comportamento excêntrico.
Novas raças de gado, como Piemontês e Jersey (mais comum para leite), já viraram até hambúrgueres na linha premium da Goldy Alimentos, que também comercializa produtos Brangus, raça que cruza animais Brahman e Angus.
Cortes novos
A mesma tendência também invade a convenção dos cortes de bovinos, suínos e aves. A paleta bovina, nas regiões de pescoço e membro dianteiro, estava bem longe de ser protagonista de qualquer churrasco. Atualmente, chamada de shoulder (pescoço em inglês) ou até raquete, de onde também se retira o flat iron, já começa a invadir os churrascos pelo sabor, maciez e preço mais acessível (chega a ser 50% mais barata) que as tradicionais picanha e fraldinha. Da mesma forma, a bochecha vem ganhando o paladar dos apaixonados pelo fogo.
A barriga e o lardo (costas) de porco deixaram de ser utilizados apenas para fazer bacon e já estão figurando sobre a brasa. Aliás, o porco inteiro se torna uma excelente opção para quem tem tempo e espaço nas confraternizações em família ou entre amigos.
Consumo consciente
Aos poucos, os movimentos que reforçam o consumo consciente de forma mais ampla também estimularam essas novas ideias no setor da pecuária. Portanto, 2019 promete ser o ano das carnes não convencionais, das novas técnicas e cortes que exploram as inúmeras possibilidades de aproveitamento, com o mínimo de preconceito ou desperdício.