Carreira

A ousadia pode ser muito bem recompensada no trabalho

Entenda como a atitude de arriscar-se pode ajudar você a crescer na carreira e alcançar novos objetivos e rumos

Luana Cardoso, executiva de vendas da International Paper (Fabiano Accorsi/EXAME.com)

Luana Cardoso, executiva de vendas da International Paper (Fabiano Accorsi/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 19 de abril de 2013 às 19h42.

São Paulo - Em uma das paredes da sede do Facebook, em Nova York, está escrito, bem grande, proceed and be bold, algo como “prossiga e seja ousado”. A rede social criada pelo americano Mark Zuckerberg detectou que a ousadia é um valor tão importante para seu negócio que fez questão de incorporá-lo à sua cultura e disseminá-lo entre seus funcionários.

Além do quartel-general nova-iorquino, a frase está estampada em outros escritórios da empresa, inclusive na filial brasileira, em São Paulo. Mas há outros lemas que combinam com ousadia, como “fracasse duramente” (fail harder) e “movimente-se rápido” (move fast).

O que o Facebook quer, assim como várias empresas, é disseminar para seus profissionais uma mentalidade de trabalho inovadora e corajosa, fundamental para obter sucesso em mercados que passam por muitas e rápidas mudanças. 

“Quando as empresas pedem ousadia, elas querem, na verdade, profissionais comprometidos com os objetivos da corporação”, afirma Mireia Las Heras, professora de desenvolvimento profissional da escola espanhola de negócios Iese.

Em uma pesquisa feita no ano passado pela empresa de treinamento corporativo LAB SSJ, de São Paulo, com 159 líderes de 32 companhias brasileiras e multinacionais, a capacidade de assumir riscos, uma das características centrais da ousadia, ficou em terceiro lugar — as duas primeiras estão ligadas à comunicação.

“Como o mercado está muito aquecido, com uma guerra por bons profissionais, este é um bom momento para ousar na carreira”, diz Mauro Mercadante, diretor de projetos de desenvolvimento do LAB SSJ. “Aquele que demonstra estar aberto e disponível é visto com bons olhos e certamente terá uma boa oportunidade.”

As empresas valorizam profissionais que se arriscam, aceitam o novo e enfrentam mudanças. Não apenas porque essas pessoas ajudam a corporação a resolver problemas, mas porque elas mostram que sempre estarão prontas para passar por transformações e para arriscar.

“Se o profissional demonstra naturalmente que está disposto a mudar, a organização sabe que ele poderá ajudá-la a chegar a resultados melhores”, afirma Clara Linhares, professora de gestão de pessoas da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.

Por isso, profissionais que aceitam uma expatriação, por exemplo, tendem a crescer mais rápido na companhia. Eles demonstram a seus chefes e pares que estão dispostos a encarar desafios em contextos diferentes e que conseguem arriscar.  


A importância que as empresas dão à ousadia também pode ser medida pelo perfil profissional exigido em programas de trainee. Entre as atitudes e competências buscadas nos jovens aspirantes a líderes estão o inconformismo, a criatividade e a capacidade de traçar objetivos e alcançá-los com rapidez — características que poderiam ser sintetizadas como ousadia.

“A ousadia está ligada à responsabilidade e à tomada de decisões”, diz Danilca Galdini, sócia-diretora da Nextview, empresas de pesquisas do grupo DMRH, que auxilia grandes corporações a realizar os programas de trainee e é parceira do Guia VOCÊ S/A – As Melhores Empresas para Começar a Carreira. 

Ser arrojado não é uma competência esperada apenas de áreas comerciais ou criativas. Departamentos mais sisudos, como finanças ou direito, também dão importância a essa atitude.

“O advogado que tiver a habilidade de ser técnico, o que é bom, mas consiga visitar clientes, gerar negócios e ser dinâmico passa a ser uma peça essencial”, diz Carlos Ferreira, sócio da consultoria de recolocação 4hunter, especializada nas áreas jurídica e financeira. “Um advogado que não souber ser ousado está fadado a não crescer.”

Sentimento de dono

Embora não seja um traço comum a todos os profissionais, a ousadia pode ser desenvolvida e praticada. Nas empresas, muitas vezes é chamada de sentimento de dono, usada quando a corporação pede comprometimento, responsabilidade e iniciativa a seus funcionários.

Na Suzano, uma das maiores produtoras de celulose do país, o sentimento de dono virou pauta recentemente. Para melhorar a eficiência e a competitividade, os funcionários estão sendo estimulados a treinar habilidades que os façam participar do negócio mais ativamente.

Entre elas, ter maior senso de responsabilidade e coragem de arriscar. “Ao ousar, o profissional supera as expectativas convencionais”, diz Carlos Alberto Griner, diretor de recursos humanos da Suzano. A disposição para enfrentar desafios também acelera o aprendizado e proporciona ao profissional mais confiança para avançar na carreira — o que é bom para ele e para os negócios.

Na petroquímica Braskem, o funcionário é instigado a assumir o papel de empresário de um negócio.  A atitude empreendedora é treinada e cobrada constantemente, pois tem ligação com a autonomia. “Quando um profissional tem autonomia, ele desenvolve o sentimento de propriedade e consegue realizar por conta própria”, afirma Marcelo Arantes, vice-presidente de pessoas da Braskem.


Um dos aspectos da autonomia é a liberdade para tomar decisões sem depender de aprovação ou amparo de outras pessoas. É justamente nesse contexto que a ousadia encontra espaço para ser exercida com mais tranquilidade — em um momento de tomada de decisão, a sensação de responsabilidade é importante.

Em outras palavras, o profissional só pode ser ousado se estiver seguro o suficiente do caminho a seguir e tiver clareza dos riscos que corre caso a escolha esteja errada. As decisões devem ser tomadas tendo como base todas as informações disponíveis. “Se for assim, mesmo se a decisão estiver errada, é possível aprender com ela”, diz Marcelo.

Do lado oposto, ser ousado sem percorrer um processo decisório consistente é irresponsabilidade. “Ousadia sem planejamento e sem conhecimento é inconsistente”, diz a professora Clara Linhares, da Dom Cabral. Por isso, para ousar é preciso estar preparado.

Não adianta ser ousado no momento em que a empresa está em recessão, por exemplo. A decisão ousada depende do contexto e da capacidade de leitura do ambiente profissional. “É preciso saber até onde você pode ir e como jogar”, afirma Andréa de Paula Santos, sócia da Ascend RH, empresa de 

recrutamento. Fazer essa análise sugere captar os sinais, interpretá-los a partir do conhecimento prévio e tirar conclusões. Com esse relatório em mente, é possível saber se vale a pena ousar ou não. 

É importante lembrar que as empresas criam regras e restrições para impedir que erros ocorram — o que acaba por inibir os profissionais mais predispostos a assumir um comportamento ousado. “A cada vez que a organização perde um cliente, aumenta custos ou tem algum desperdício, ela cria regras para que aquele erro não aconteça novamente”, afirma Marcos Hashimoto, coordenador do centro de empreendedorismo da Faap, de São Paulo. “A empresa entende que é melhor perder a capacidade de ousar do que cometer erros”, diz.

Como praticar a ousadia

Como todo hábito, a ousadia depende da repetição. Entre as principais atitudes ligadas a ela estão: tomar decisão, arriscar, ler ambientes e planejar. Uma das formas de ser ousado sem correr grandes riscos é fazendo pequenas apostas, como defende o escritor americano Peter Sims em seu último livro, Little Bets (“Pequenas apostas”, ainda sem edição no Brasil).


“A estratégia de apostar pequeno abre a possibilidade de fazer acontecer”, diz Peter. “O lance pequeno não tem grande risco e é acessível, além de dar recompensas, também pequenas, mas palpáveis.” Essa estratégia pode ser usada em todas as atitudes ligadas à ousadia. É possível tomar pequenas decisões e arriscar. Com o tempo, elas ganham proporções maiores. É claro que erros poderão ocorrer.

O importante é aprender com eles. “Profissionais ousados são capazes de fazer experimentos, pequenos projetos, antes de se lançar em um projeto maior”, afirma Mireia Las Heras, do Iese. Com o tempo, a frequência das recompensas aumenta e, mesmo que uma cartada não dê certo, você saberá como lidar com ela.

Para saber se o caminho está certo, avalie os resultados. Pergunte-se “como e por que fiz daquela forma?”, “por que me dediquei àquilo?”, “como e por que cheguei àquele resultado?”. “No dia a dia, reflita sobre o processo, avalie o resultado desses experimentos e faça pequenas mudanças”, diz Mireia. Assim você conseguirá avaliar os possíveis erros no futuro e ousar mais, pois terá mais segurança. 

No livro O Poder do Hábito – Por Que Fazemos o Que Fazemos na Vida e nos Negócios (Ed. Objetiva), o jornalista americano Charles Duhigg explica que para um hábito ser criado é preciso levar em conta um ciclo com três etapas. O primeiro é a circunstância, ou seja, uma faísca que faz você repetir uma rotina comum. A segunda etapa é a rotina. A maneira como você age a partir dela gera uma recompensa, completando o ciclo do hábito.

No caso da ousadia, são os hábitos das atitudes que precisam ser mudados. Oportunidades para arriscar surgem o tempo todo. Pode ser uma conversa com um gestor, que o ajudará a crescer em um futuro próximo, ou a chance de fazer uma apresentação diferente a um cliente. O que deve ser mudado é a forma como você responde a essa circunstância. 

Se o comum é não assumir risco, o resultado será semelhante aos anteriores. Ao mudar o hábito, você se sentirá mais seguro para ousar cada vez mais e mostrar à empresa que está disposto a ajudá-la a crescer. Isso trará resultados para a sua carreira e para os negócios. Se não der certo, aprenda com o erro. O importante é prosseguir e continuar sendo ousado. 

Expatriação extrema

Ousadia: Há dois anos, Luana Cardozo, de 30 anos, executiva de vendas da fabricante de papel International Paper, viu a abertura de uma vaga interna para ir trabalhar na China por dois anos. Aquela seria a primeira oportunidade global de expatriação da empresa na região, que representa 15% das vendas da regional brasileira.


Mesmo sem saber falar mandarim nem nunca ter morado em outro lugar senão Mogi Mirim, cidade do interior de São Paulo com 86 000 habitantes, Luana arriscou e se candidatou à vaga em Xangai, cidade com 23 milhões de habitantes. “Eram metas, culturas e pessoas diferentes”, diz Luana, que conseguiu a vaga.

Lição: Na hora de negociar, Luana mostrou que aquela oportunidade seria boa para todos. Para ela o ganho seria a longo prazo. No futuro, Luana vislumbra ser gerente de exportação, área que responde por 35% do volume produzido pela empresa. “Sabia que aprimoraria meu inglês e faria contato com o escritório asiático, um importante parceiro.” Uma atitude ousada, que fez a empresa vê-la como uma profissional determinada e corajosa.

Risco calculado

Ousadia: Ao tornar-se, há dois anos, vice-presidente da unidade de agronegócio da Basf, multinacional alemã do setor químico, Maurício Russomano, hoje com 37 anos, percebeu que precisaria mudar o modelo de negócio da área. As estratégias de marketing deveriam ter como foco o agricultor, não mais o distribuidor. Decisão ousada para uma área que não mudava sua fórmula.

Lição: Apesar de radical, a medida foi calculada e pensada. Durante os três primeiros meses no cargo, Maurício teve aulas com um técnico agrícola para aprender os pormenores do mercado. “Não sou ousado sem pensar, sempre tento diminuir meu risco”, afirma Maurício. “Eu tenho medo, me preocupo com as consequências de minhas ações.” 

O executivo lançou mão de uma das atitudes mais importantes para a ousadia: ler o ambiente. Viver e entender o ambiente em que se está inserido é essencial para conseguir tomar decisões e ousar. Sem isso, o risco de errar aumenta e a confiança em ousar diminui.

Direto ao presidente

Ousadia: Para ser contratado pela Votorantim Metais, empresa em que hoje é diretor comercial, o mineiro Victor Breguncci, de 37 anos, tomou uma atitude arriscada. Em 2008, o executivo tinha recém-terminado um MBA na escola de negócios suíça IMD, uma das mais renomadas do mundo, e a Vale, empresa em que trabalhou por sete anos e que bancou o curso, não tinha onde realocá-lo por culpa da crise financeira. 


Sabendo disso, Victor mandou um e-mail para o então presidente da Votorantim Metais, João Bosco Silva, apresentando-se e pedindo cinco minutos para uma conversa. Na mensagem, Victor mostrava, muito discretamente, o interesse em trabalhar na empresa.

A resposta chegou no dia seguinte pela manhã: “Prezado Victor, grato por sua mensagem. Alguém de nossa organização vai contatá-lo”. Em três meses foi contratado para ser o novo gerente comercial da área de zinco do grupo. 

Lição: Victor foi ousado por estar suficientemente seguro de que reunia qualificações para trabalhar na empresa. Ele era formado em engenharia metalúrgica, falava cinco idiomas e tinha 11 anos de experiência em desenvolvimento de negócios e vendas. Viveu na França, quando trabalhou na Embraer no começo de carreira, e na Alemanha, na Índia e na Suíça, na época em que estava na Vale.

“Sabia que poderia ser muito útil”, diz. Sua ousadia o ajudou a impulsionar sua carreira. Depois de um ano no cargo, o executivo foi promovido a diretor comercial da divisão de metais, que representa 19% da receita líquida da Votorantim Industrial. Saber os limites da ousadia ajuda a não errar.

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