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A importância de discordar

Muito se tem falado ultimamente sobre o surgimento de pequenos “brotos verdes” — indícios, ao que parece, de um princípio de recuperação econômica — em meio aos escombros da recessão. Talvez seja verdade. Se assim for, podemos respirar aliviados, e quem sabe até comemorar um pouco. Contudo, uma outra espécie de “broto verde" nos tem […]

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Da Redação

Publicado em 24 de julho de 2009 às 09h58.

Muito se tem falado ultimamente sobre o surgimento de pequenos “brotos verdes” — indícios, ao que parece, de um princípio de recuperação econômica — em meio aos escombros da recessão.

Talvez seja verdade. Se assim for, podemos respirar aliviados, e quem sabe até comemorar um pouco. Contudo, uma outra espécie de “broto verde" nos tem deixado intrigados nos últimos tempos. Tudo indica que há sinais incipientes de que a hegemonia absoluta de que desfrutam hoje na política os democratas desde que Barack Obama assumiu a presidência, e o Congresso democrata tomou o poder, talvez esteja começando a ceder e a dar lugar a um debate bipartidário mais sadio.

Que provas temos disso? Em primeiro lugar, os comentários críticos do ex-vice-presidente Dick Cheney sobre questões relativas à segurança nacional vêm ganhando um espaço cada vez maior nos meios de comunicação (embora não se possa dizer o mesmo de Cheney). Em segundo lugar, os californianos votaram em massa contra mais uma rodada caótica de arrecadação e de gastos proposta pelo governo. É claro que dois eventos por si sós não são suficientes para caracterizar uma tendência, mas seria ótimo para o país se assim fosse.

E por quê? Todo o mundo sabe que as ideias melhoram quando há mais vigilância, quando os céticos as criticam e as pessoas as contestam e as submetem à prova dos ângulos mais diversos. Todos, nos mais variados setores, inclusive governo e empresas, já participaram de reuniões em que se chegou a uma solução melhor não só porque houve espaço para discussão, mas também porque houve discordância. Muita gente tem conhecimento de um ou outro projeto que superou as expectativas porque, no decorrer do processo, alguém objetou: “Esperem um pouco. Será que isso é o melhor que podemos fazer?”

A história política recente dos EUA respalda nossa posição. O governo desastroso de Jimmy Carter, de 1976 a 1980, com índices estratosféricos de desemprego e inflação, além de políticas econômicas que tiraram o país completamente do rumo, só foi possível por obra de uma maioria no Congresso que a tudo dizia amém. Posteriormente, Ronald Reagan colocou o país novamente nos trilhos, não só porque pôs em prática políticas republicanas, mas também porque passou a trabalhar com novas estratégias ferozmente combatidas pelos democratas.

De igual modo, os primeiros dois anos do governo Clinton, de 1992 a 1994, não foram tão bem-sucedidos quanto os últimos seis graças a Newt Gingrich, que liderou os republicanos em uma oposição ferrenha aos projetos democratas. Não há dúvida de que a prosperidade duradoura daquele período contou com a ajuda do debate ponderado (leia-se: feroz) que tomou conta de Washington.

Por fim, basta lembrar como foram os primeiros seis anos de hegemonia do governo de George Bush para se ter uma ideia das consequências nefastas do predomínio de um único partido. Nossos líderes abandonaram todos os princípios fiscais: gastaram como gastam os indivíduos embriagados dentro de um bar e nos meteram numa guerra complicada.

Nossa intenção aqui, porém, não é jogar pedra neste ou naquele presidente. Pelo contrário, é chamar a atenção para as consequências negativas da liderança inconteste. Não há dúvida de que Reagan e Clinton representam o que tivemos de melhor na presidência do país nos últimos 40 anos e, evidentemente, ambos se beneficiaram do debate encabeçado por seus leais opositores. Foi por isso que ficamos muito satisfeitos na semana passada quando vimos os comentários de Cheney nas primeiras páginas de vários jornais lado a lado com as explicações de Obama. Os diferentes pontos de vista certamente enriquecerão o debate, e podem levar até a um desfecho mais produtivo e mais próximo do centro.

Com relação à Califórnia, a recente votação ali ocorrida também nos parece promissora. Finalmente, depois de anos de irresponsabilidade financeira sem contestação alguma, as pessoas finalmente estão começando a dizer “chega”. Na verdade, a margem de 2 para 1 mostra que a população da Califórnia está realmente disposta a se manifestar e a fazer ouvir sua voz.

Que lição os gerentes devem tirar disso? Que é preciso criar uma cultura inclusiva que estimule realmente o debate. A liderança corre o risco de cair na tentação de abafar todo e qualquer “barulho” dentro da empresa. Avanços seguidos de retrocessos servem apenas para atrasar o ritmo do progresso. Há contestadores de todos os tipos. Quem já não encontrou na empresa um sujeito implicante que deixa todo o mundo maluco com sua mania de detalhes?

No entanto, a gerência não pode dar ouvidos apenas àqueles que sempre dizem “sim”. Pouco importa se você está à frente de uma equipe ou de uma empresa, obrigue-se a premiar as melhores ideias, não importa de onde venham. Mostre que uma ideia boa vale mais do que a hierarquia do indivíduo dentro da empresa. Coloque no panteão dos heróis aqueles que defendem pontos de vista contrários aos da maioria. Dê força aos excêntricos; e mais do que isso, obrigue-se a ouvi-los. Muitas vezes, sua oposição ao status quo é motivada por uma paixão e por um carinho legítimos para com a empresa.

Bem, abrimos essa coluna com a impressão de que a ocorrência de dois eventos talvez apontem para uma pequena inclinação em direção ao debate bipartidário nos EUA. Contudo, mesmo que estejamos enganados — tomara que não — o que dissemos continua a valer: não há empresa que não saia ganhando com o debate das ideias. Não há oposição infrutífera.

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