Carreira

Esta CEO brasileira quer cotas para promover a liderança feminina

Presidente da Blue Tree Hotels avalia a evolução da igualdade de gênero no Brasil e diz por que defende políticas para incluir mais mulheres em conselhos

Chieko Aoki, fundadora e presidente da Blue Tree Hotels (Divulgação)

Chieko Aoki, fundadora e presidente da Blue Tree Hotels (Divulgação)

Claudia Gasparini

Claudia Gasparini

Publicado em 8 de março de 2017 às 15h00.

Última atualização em 8 de março de 2017 às 18h16.

São Paulo — Fundadora e presidente da operadora de hotéis Blue Tree Hotels e uma das executivas mais influentes do país, Chieko Aoki é um ponto fora da curva no cenário brasileiro: segundo uma pesquisa lançada nesta semana pela consultoria Page Executive, a participação das mulheres na direção das empresas no país foi de apenas 14% em 2016 — uma queda em relação a 2015, quando chegava a 16%.

Conhecida como “a dama da hotelaria brasileira”, Aoki precisou enfrentar obstáculos no início de sua carreira em turismo por causa do seu gênero. “Eles achavam que eu não entendia daqueles assuntos, até porque hotelaria era considerada uma profissão de homem”, lembra ela. “Nas reuniões, os homens conversavam entre si e nunca perguntavam a minha opinião, mas eu falava mesmo assim”.

Desde então, diz a empresária, a igualdade entre os gêneros avançou muito  dentro e fora das empresas. Mas as mudanças são lentas. Além da iniciativa individual, ela acredita na necessidade de políticas para acelerar o ingresso feminino nas altas cúpulas do poder corporativo, e se declara a favor de cotas para mulheres nos conselhos das empresas.

"Conheço muitas executivas extremamente bem preparadas que não fazem parte de nenhum conselho, enquanto existe muito homem que está em 7 ou 8 conselhos diferentes, o mesmo homem", diz. "Com a cota, a mulher vai poder participar, exibir o seu desempenho, e mostrar que ela traz um olhar diferente e proporciona um equilíbrio maior nas discussões".

Formada em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), Aoki estudou também no Japão e nos Estados Unidos. Começou sua trajetória em 1982, como diretora de marketing e vendas do Caesar Park São Paulo, e em 1997 lançou a bandeira Blue Tree Hotels. Em 2006, foi eleita presidente do LIDEM (Grupo de Mulheres Líderes Empresariais) e, em 2015, foi eleita pela revista “Forbes Brasil” como uma das 15 mulheres mais poderosas do país.

Em entrevista exclusiva a EXAME.com por telefone, a executiva disse o que pensa sobre os desafios e conquistas das mulheres dentro e fora do mundo corporativo, e deu seu conselho de carreira para elas. Confira os trechos principais da conversa a seguir:

EXAME.com — Por que ainda há tão poucas mulheres atuando como CEOs no Brasil?

Chieko Aoki — Isso é resultado de uma questão cultural que se manifesta em todo o mundo. Um dos motivos é o fato de que a mulher ingressou no mercado executivo há bem menos tempo que o homem, daí essa disparidade significativa entre eles. Ainda existem muitos espaços que as mulheres precisam ocupar, e elas precisam se candidatar a esses espaços.

É claro que isso envolve certas decisões. Conheço muitas mulheres que, para chegar à presidência de uma empresa, tiveram que mudar de país. Muitas delas desistem porque não querem ir para o exterior, não têm com quem deixar os filhos, ou os maridos não podem ir com elas. Por outro lado, quando o marido vai, normalmente a esposa larga tudo e vai junto. Vejo que o contrário está começando a acontecer. Os maridos de várias amigas minhas abriram mão de ter um emprego mais fixo para poder acompanhá-las, virando consultores, por exemplo.

A senhora enfrentou algum tipo de obstáculo na sua carreira por ser mulher?

No começo, sim. Eles achavam que eu não entendia daqueles assuntos, até porque hotelaria era considerada uma profissão de homem. Eles não sabiam que a mulher poderia ocupar esse tipo de lugar. Nas reuniões, os homens conversavam entre si e nunca perguntavam a minha opinião. Mas eu falava mesmo assim, e as minhas ideias davam resultado. A partir do momento em que você dá resultado, tudo muda. As pessoas gostam do que funciona. Com o tempo, foram se acostumando.

Olhando para trás, como a senhora enxerga a evolução da igualdade de gênero no Brasil e no mundo?

As coisas melhoraram muito desde que comecei a trabalhar. No Japão, por exemplo, que costumava ser bem atrasado nesse sentido, o primeiro-ministro assumiu como projeto do governo dele aumentar o PIB até 2020 com uma maior inclusão das mulheres na economia do país. É uma política do governo japonês. Eles estão criando cursos para o marido aprender a cuidar dos filhos, porque eles não sabiam fazer, não eram acostumados a isso até pouco tempo atrás.  

É claro que são várias as condições que ajudam a mulher a progredir na carreira, inclusive o país em que ela está. Nos Estados Unidos, a igualdade é mais avançada, porque a vida lá é muito prática, mecanizada, e por isso as mulheres foram mais cedo para o mercado de trabalho. Há boas creches, o transporte é muito eficiente, há uma divisão melhor das tarefas domésticas com os homens. Essas condições são positivas para a carreira delas por lá.

No Brasil, apesar de ainda haver muitas dificuldades, vejo hoje muito mais mulheres comprometidas com a própria carreira do que no passado. Gostam de suas carreiras, não abrem mão do sucesso profissional, querem chegar ao topo. E sabem que são competentes. São mudanças lentas, mas as coisas estão melhorando.

A senhora é a favor de políticas que acelerem essas mudanças, como cotas para mulheres nos conselhos de grandes empresas, por exemplo?

Sim, sou a favor de cotas para mulheres em conselhos. É uma questão de conscientização. O número de homens em conselhos ainda é muito maior do que o de mulheres. Por que isso acontece? Como os homens são mais numerosos, eles também são mais lembrados na hora de compor o grupo. Quando pensam em conselho, as pessoas pensam: “Ah, vamos chamar o Fulano”. Como há menos mulheres ocupando essas posições, elas acabam sendo esquecidas. Se houver cota, as mulheres obrigatoriamente serão chamadas.

Eu sou a favor porque conheço muitas executivas extremamente bem preparadas que não fazem parte de nenhum conselho, enquanto existe muito homem que está em 7 ou 8 conselhos diferentes, o mesmo homem! A mulher não é menos competente,  mas às vezes não é lembrada.

Com a cota, a executiva vai poder participar, exibir o seu desempenho, e mostrar que ela traz um olhar diferente e proporciona um equilíbrio maior nas discussões. Aos poucos, isso vai fazer com que as mulheres passem a ser requisitadas nos conselhos das empresas.

Qual é o seu conselho de carreira para as mulheres?

É importante fazer o que você gosta. Quando você tem paixão pelo seu trabalho, não existem sacrifícios. É preciso estar preparada. Vão aparecer muitas dificuldades, mas você precisa acreditar que está agregando o seu valor, que pode transformar uma situação, e que a sua participação no trabalho e na sociedade é fundamental. Essa é uma motivação muito importante, saber que você está transformando alguma coisa. É o que faz com que eu acorde de manhã com vontade de trabalhar.

A senhora trabalha muito? Como é sua rotina?

Acordo, faço ginástica, tomo café da manhã no carro porque não dá tempo de tomar em casa, trabalho o dia inteiro, às vezes tenho eventos à noite, volto para a casa e coloco as coisas em dia. Durmo por volta de 1h30  e levanto no dia seguinte às 6h. Se adoro isso? Olha, não é algo que me chateia, porque eu tenho paixão pelo que faço.

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