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Você é mesmo livre? Não, se seu pensamento estiver sendo controlado

A perda da liberdade de pensamento se manifesta como alienação, manipulação, negacionismo e ansiedade

Liberdade é não ter de fazer o que não se quer (akinbostanci/Getty Images)

Liberdade é não ter de fazer o que não se quer (akinbostanci/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 26 de maio de 2021 às 18h44.

Última atualização em 26 de maio de 2021 às 18h53.

Por Martha Gabriel*

Você é livre? Verdadeiramente livre? Adoramos acreditar que sim, e que estamos no comando de nossas decisões, pois, indubitavelmente, a liberdade é um dos principais valores da humanidade. Advogamos pela liberdade de expressão, liberdade de ir e vir, liberdade de amar, liberdade de escolher, liberdade de ser.

No entanto, a verdadeira liberdade, que é raiz de todas as outras, é a liberdade de pensar, mas, talvez por acreditarmos que já a possuímos, esquecemos, muitas vezes, de lutar por ela. Podemos ignorar a perda de liberdade de pensamento, mas não conseguimos ignorar seus efeitos, que se manifestam de inúmeras formas, por exemplo: alienação, manipulação, negacionismo, ansiedade, entre outros problemas cada vez mais comuns na nossa sociedade

Ao contrário do que muitos pensam, liberdade não é fazer o que quiser, mas não ter de fazer o que não se quer. Liberdade é poder escolher, e, quando esse poder nos é tirado, nos tornamos escravos daquilo que nos restringe, perdemos autonomia.

A escravidão está entre as piores formas da condição humana, mas, apesar disso, humanidade e escravidão têm caminhado lado a lado desde o início de nossa história. Infelizmente, milhares de anos de evolução não foram suficientes para nos libertar, e parece que, ao contrário, nossa “evolução” tem trazido consigo novas e mais sofisticadas formas de escravizar: mais sutis, menos explícitas, mais camufladas, menos visíveis, tornando-se, assim, mais difíceis de serem identificadas para combater, ficando, portanto, mais poderosas. A situação complica-se ainda mais quando não conseguimos saber exatamente “quem” nos domina.

Se, por um lado, percebemos facilmente e resistimos prontamente contra qualquer força física direta que tenta restringir nossa liberdade, por outro, torna-se praticamente impossível se defender de qualquer ameaça imperceptível. Nesse sentido, tecnologias mecânicas são visíveis, diretas, físicas; tecnologias digitais, por sua vez, são mais sofisticadas, invisíveis, difusas, intangíveis. Tecnologias rudimentares escravizam com luta, tecnologias sofisticadas escravizam sem resistência. Armas físicas escravizam corpos, armas sofisticadas escravizam mentes.

Uma lição que a história nos ensinou é que para combatermos qualquer invasão à nossa liberdade, precisamos alcançar o mesmo nível de sofisticação tecnológica que criou as armas que nos ameaçam. A mesma tecnologia que nos liberta é também aquela usada para nos oprimir — o cavalo, uma das tecnologias mais importantes para locomoção e produção de recursos, foi também uma das tecnologias mais poderosas de guerra; a pólvora que permitiu abrir tantos caminhos, também foi usada para destruir e arrasar; a radioatividade que pode curar o câncer, também pode construir bombas para matar.

No entanto, se até recentemente as tecnologias que tanto criavam quanto restringiam a nossa liberdade eram mecânicas, hoje as tecnologias que potencializam tanto a nossa liberdade quanto a escravidão são digitais, e exponenciais (e sofisticadas, e tudo mais que já discutimos antes). Você provavelmente já assistiu aos documentários Privacidade Hackeada e O Dilema das Redes, que mostram a ponta do iceberg do poder que as tecnologias digitais oferecem para o controle e manipulação em massa de pensamento, e consequentemente, de ações. Talvez você tenha assistido também A Era dos Dados (série documental) ou Coded Bias (documentário) e percebeu como, sem percebermos, a nossa liberdade de pensamento corre o risco de se tornar cada vez mais ilusão.

A ideia aqui não é negar ou rejeitar quaisquer tecnologias — muito pelo contrário. Temos vivido uma relação simbiótica crescente com elas desde as nossas origens, e foi assim que evoluímos como humanidade. A intenção aqui é a aumentar a conscientização para que nos eduquemos e nos empenhemos mais em percebê-las, compreendê-las e refletir sobre seu impacto na nossa liberdade de pensar — para não apenas sabermos como usá-las, mas também, e principalmente, como nos defendermos delas e de quem sabe manipulá-las.

O pensamento humano tem sido a força motriz direcionadora da nossa evolução, e seria muito bom garantir que sejamos livres — verdadeiramente — para pensar como indivíduos, enquanto estamos, ainda, escrevendo os próximos capítulos dessa história, que tende a ser cada vez mais repleta de tecnologias sofisticadas.

E, então? Você é livre? Pense novamente.

*Martha Gabriel é futurista, autora do best-seller Você, Eu e os Robôs: como se transformar no profissional digital do futuro, professora de inteligência artificial na pós graduação da PUC-SP

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