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PLAY: “Véspera” desnuda o descontrole humano e suas consequências

Na última parte da conversa com a escritora Carla Madeira, Bússola Play explora a construção de sua mais recente obra

Série de livros tem planos para chegar às telas (Redes Sociais/Reprodução)

Série de livros tem planos para chegar às telas (Redes Sociais/Reprodução)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 11 de setembro de 2022 às 16h38.

Por Danilo Vicente*

“Véspera” é um livro que, aposto, vai te marcar por muito tempo. Terceiro de Carla Madeira, é o meu preferido da escritora recordista em vendas no Brasil em 2021 e 2022, talvez por ter sido o primeiro dela que li (“Tudo É Rio” e “A Natureza da Mordida” também são de tirar o fôlego). A publicação, da editora Record, tem duas histórias que se cruzam em determinado momento. Enquanto uma já começa tensa, com um abandono maternal impensado, a outra cresce com o passar das páginas, acompanhando uma família que tenta se equilibrar após um também impensado gesto, desta vez paternal.

A análise desta oposição de ritmos faz parte da conversa que tive com Carla sobre suas três obras Em “Véspera”, o descontrole é inerente ao ser humano e tem consequências imprevisíveis.

Nesta derradeira parte do papo, a escritora e publicitária, fundadora da agência Lápis Raro, aborda personagens queridos de suas obras - como o cativante padre Tadeu -, a futura transformação de “Véspera” em série ou filme e o seu próximo livro, já em produção, além de, claro, contar como “Véspera” foi construído.

Bússola: Seus livros têm sempre um acontecimento que desenrola em mudança de vida para o personagem. Algo por vezes grave, por vezes corriqueiro, mas que se torna divisor de águas para a história. Como é essa criação?

Carla Madeira: Existem dois tipos de autoria. Há o autor de composição, que define tudo sobre os personagens – como se vestem, como falam – e que define territórios, contextos políticos e históricos. Com tudo pronto, ele escreve. E há os de improviso, classificação que me encaixo. Aliás, eu não gostava da palavra “improviso”, pois me parecia um despreparo, mas quando se leva isso para o mundo musical, muito importante em minha formação, é algo muito legal. O improviso exige o maior preparo possível, um conhecimento do instrumento, por exemplo, que o músico precisa dominar para, então, improvisar.

Sou uma escritora de improviso, pois é o acontecimento que me dá a chave para mostrar quem é essa pessoa, a personagem. É este acontecimento que faz essa pessoa chegar ali. Em “Véspera” isso fica explícito. É uma ideia de coerência que vem de plasticidade, o que a pessoa faz também a faz.

Sempre que fico em uma investigação, uma preparação, descolada de um acontecimento, me sinto superficial. Há autores que são incríveis neste estilo, mas não é o meu.

Bússola: Seus protagonistas conquistam, mas há personagens secundários que também cativam. O padre Tadeu, de Véspera, é muito citado por seus leitores?

Carla Madeira: Aurora de “Tudo É Rio” e padre Tadeu de “Véspera” são sempre lembrados pelos leitores. O padre Tadeu tem uma função muito importante na obra. Ele recoloca toda a questão do mito de Caim e Abel. Ele está no lugar que, apesar de ser um religioso, desconstrói a perspectiva religiosa. Tem um papel curto, mas uma importância estrutural para o livro. Ele e Aurora são personagens que estão ali para abalar as certezas.

Bússola: Por que “Véspera” tem duas histórias intercaladas até o fim, estrutura que difere de seus livros anteriores?

Carla Madeira: “Véspera” tem uma estrutura de abertura do narrador, que é um personagem. É um narrador onisciente, cotando uma história que se percebe ao fim o que realmente é. É igual a pegar um crime midiático, no qual se sabe detalhes da vida da pessoa, mas que não se sabe o que é verdade ou mentira. Sabe-se tanta coisa, mas não há certeza do que é verdadeiro. Ainda há o tempo convergindo, com o acontecimento ligado a Vedina, com a ação toda se passando durante um dia. Essa história sai do máximo da tensão e distensiona. E há a outra, que vem lá de trás e vai tencionando. O leitor no início está mais interessado na história da Vedina, mas depois muda para se interessar pela história de Caim e de Abel.

Bússola: “Véspera” vai virar filme ou série?

Carla Madeira: Está com a produtora Boutique Filmes. Estão trabalhando no projeto. Vamos ver o que virá. Estou superfeliz. Algo vai rolar.

Bússola: Você divide seu tempo entre a Lápis Raro, agência focada em branding e performance que criou em 1987, e a carreira de escritora. Já pensou na inversão de papeis?

Carla Madeira: Sim. Tenho 35 anos de agência e hoje já tenho uma equipe muito madura, nível gerencial forte, lideranças muito desenvoltas. Estou cada vez mais no estratégico. Porém, é ainda uma área de muito desafios: a gente tem uma carga de aprendizado muito forte, dorme de um jeito e acorda com um termo novo a saber, novo canal etc. É sempre muito desafiador. Será um processo natural. Vou construir esta possibilidade de me dedicar mais à literatura.

Bússola: Quando teremos o quarto livro?

Carla Madeira: Tinha me proposto ficar um ano sem escrever, mas não estou cumprindo. Muito no meu ritmo, mas estou tomada pela história.

*Danilo Vicente é sócio-diretor da Loures Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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