Modelos corporativos tradicionais de progressão de carreira e liderança perderam o sentido em meio à ascensão de novos conceitos. (Morsa Images/Getty Images)
Bússola
Publicado em 26 de março de 2022 às 11h41.
Por Souzanne Dupont*
O avanço acelerado na adoção de novas tecnologias, acentuado pela pandemia global e uma mudança significativa no comportamento social, tiveram alto impacto nas relações de trabalho nos últimos anos. Modelos corporativos tradicionais de progressão de carreira e liderança perderam o sentido em meio à ascensão de novos conceitos. Propósito, diversidade, inclusão e colaboração se tornaram muito mais do que palavras, mas ações necessárias para as companhias que buscam atrair, reter e desenvolver talentos.
O movimento batizado de “Grande Renúncia”, como os economistas cunharam o êxodo de colaboradores em todo o mundo, deixa bem claro a profunda insatisfação das atuais gerações com o mercado de trabalho e provoca os profissionais de Gestão de Pessoas a repensar metodologias e caminhos para construir novos modelos de carreira.
Na prática, isso significa que o plano de carreira tradicional, com progressão linear, já não é mais uma opção. O desafio está em enxergar um passo à frente, preparando os profissionais no hoje para assumir funções no futuro que ainda não conhecemos em detalhe. A pesquisa Projetando 2030: uma visão dividida do futuro, encomendada pela Dell Technologies ao Institute For The Future (IFTF) explica bem o que isso significa: até o final da década, estima-se que 85% dos trabalhos existentes serão novos.
Não à toa, os colaboradores das mais diferentes áreas e níveis estão preocupados com oportunidades de qualificação e requalificação. O estudo Mercer 2021 Global Talent Trends, mostrou que, na visão dos profissionais, “oportunidades para aprender novas habilidades e tecnologia” (43%) e “reconhecimento por suas contribuições” (42%) são os dois principais pontos para prosperar na carreira.
Ou seja, garantir a empregabilidade futura por meio de habilidades é agora uma parte crítica do contrato de trabalho, e os empregadores, gestores e, principalmente, os responsáveis pela área de gestão de pessoas, precisam abordar essa questão adequadamente.
Mudança de mentalidade
Para isso, muitas organizações estão adotando uma mentalidade e metodologias mais ágeis, repensando o modelo de carreira e o sistema de gestão de talentos de uma forma mais estratégica, e com foco nas necessidades de cada pessoa. Entre as iniciativas aplicadas atualmente para encontrar e reter os bons profissionais — ou mesmo moldá-los dentro das organizações — está a conscientização de que é preciso estar preparado para os desafios dos negócios como um todo e não mais apenas para a resolução de problemas de determinada posição.
Com o avanço da gestão aberta e do posicionamento colaborativo, a tendência é que as profissões demandem cada vez mais habilidades interpessoais e uma visão 360º, somadas aos conhecimentos técnicos. As vagas serão criadas para abordar oportunidades e adversidades nos negócios, e orientadas pela perspectiva de que quanto mais os profissionais estiverem cientes desse contexto, mais estarão abertos para aprender e buscar novos caminhos de desenvolvimento.
Com isso, a companhia tem uma avaliação única de cada colaborador e do seu próprio ambiente corporativo, o que leva a um melhor planejamento de treinamentos e conversas para evolução de carreira. A ideia é contribuir para que as pessoas conectem seus propósitos com suas equipes e, consequentemente, os objetivos da empresa se conectem com as oportunidades de carreira.
Ao planejar a carreira, cada profissional precisa entender quais são as expectativas individuais e habilidades que já possui. A partir dessas informações e com o conhecimento de cada colaborador, a equipe de Gestão de Pessoas pode equipar líderes e liderados sobre como avaliar esses elementos-chave e como conversar sobre esse tema. No final, isso ajuda a convergir aquilo que os talentos querem e realmente são bons, com as necessidades futuras do negócio — e registrar isso em um plano de carreira personalizado.
Atuação conjunta
Estudo recente da consultoria britânica Fuel 50 mostrou que 65% dos profissionais ainda esperam que a empresa ofereça os passos definidos de carreira. Um cenário que já não faz mais parte da realidade da maioria das organizações: a dinâmica do mercado, os negócios se tornam cada vez mais imprevisíveis — quem, afinal, estava preparado para a pandemia? Deixar isso claro para os profissionais é fundamental para um avanço positivo na gestão de talentos. A transparência entre empresa e colaboradores é o primeiro passo para a construção de um relacionamento duradouro e de uma carreira promissora.
Em um contexto de novos anseios, novas visões e crescimento da tecnologia, as empresas estão se conscientizando de que precisam revisar constantemente a maneira como lidam com a gestão de pessoas. E se encontram em uma posição única para liderar a agenda de estímulo à empregabilidade, aplicando abordagens mais inovadoras e colaborativas para promover a resiliência do trabalho e uma revisão dos critérios existentes de contratação, remuneração e promoção. É preciso pavimentar novos caminhos de carreira intencionais, permeados por qualidade e requalificação para manter os talentos empregáveis, aptos ao futuro.
A jornada para essas mudanças, para a construção de um plano de carreira conectado ao século 21, será uma montanha-russa de incertezas, acertos e erros, seja para as organizações, seja para os profissionais. Mas a mudança não é mais uma questão de escolha, é um caminho mandatório, uma redefinição que exige uma intenção e ação coletiva e flexível para tornar o trabalho dos sonhos de cada talento e a equipe dos sonhos de cada empresa uma realidade.
*Souzanne Dupont é Chief People Officer & Board Member da GhFly Network
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