Mayna Dias Melo: perspectiva de gênero em projetos de infraestrutura
Benefícios de desenvolver projetos de infraestrutura com perspectiva de gênero não se limitam a colocar mulheres na posição de destinatárias dos projetos
Bússola
Publicado em 22 de agosto de 2022 às 18h15.
Última atualização em 22 de agosto de 2022 às 18h22.
Por Mayna Dias Melo
Ao pensar em infraestrutura, geralmente vislumbramos grandes projetos, tais como aeroportos, rodovias, energia, cujos usuários não possuem gênero, cor, orientação sexual, religião etc., como se todos pudessem ser indistintamente beneficiados por referidos projetos na mesma proporção.
No entanto, embora os projetos “clássicos” de infraestrutura possam impactar muitas pessoas, tais impactos poderiam ser potencializados, caso sua modelagem considerasse as demandas específicas de determinados grupos social e economicamente vulneráveis.
Neste contexto, pode-se citar o exemplo de mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade social que não possuem transporte público ou saneamento básico próximos de suas residências. Isso demanda que elas percorram grandes distâncias e gastem muito tempo para finalmente conseguirem acessar escolas, água potável, dentre outros serviços.
A escassez de infraestrutura básica nas localidades em que vivem essas mulheres faz com que não haja tempo para atividades como investir em sua própria educação, trabalho e busca por independência financeira (fenômeno conhecido como time poverty — “pobreza de tempo”, numa tradução livre).
Neste sentido, acrescentar a perspectiva de gênero ao desenvolvimento de projetos de infraestrutura tem o potencial de reduzir a pobreza de tempo dessas mulheres e, consequentemente, permitir o alcance, por elas, de melhores condições de vida sob o aspecto social e econômico.
Os benefícios e objetivos de desenvolver projetos de infraestrutura com perspectiva de gênero não se limitam a colocar as mulheres na posição de destinatárias dos projetos, mas também na condição de agentes ativos e participantes na comunidade, no papel de empreendedoras, gestoras, colaboradoras, líderes e usuárias dos serviços prestados (World Bank Group, 2019), o que gera benefícios à sociedade como um todo.
Para ilustrar esses impactos mais abrangentes, um estudo da consultoria McKinsey aponta que a maior participação de mulheres no mercado de trabalho em posições de poder poderia aumentar o PIB mundial em 26% em 2025 (McKinsey apud Woetzel et al., 2015). Na mesma linha, estudos citados pelo Banco Mundial apontam que, se a diferença entre os salários de homens e mulheres fosse eliminada, haveria um potencial aumento líquido do PIB brasileiro em 9%.
Embora as políticas de infraestrutura ainda sejam, em sua maioria, indiferentes ou neutras em relação ao recorte de gênero, há países que já possuem projetos cujas modelagens foram pautadas nas demandas específicas de meninas e mulheres.
No caso do Brasil, a temática vem ganhando relevância nos últimos anos, mas, na prática, a inclusão desses critérios na estruturação dos projetos ainda é tímida. À medida que os impactos positivos de projetos brasileiros com perspectiva de gênero forem identificados e divulgados, há uma tendência de que as necessidades desses grupos sejam levadas cada vez mais em consideração pelos formuladores de políticas públicas e pelos responsáveis pelos projetos, adequando-se à tendência já identificada no cenário internacional.
*Mayna Dias Melo é advogada sênior de infraestrutura, regulação e assuntos governamentais no BMA Advogados, especialista em PPPs e concessões pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo
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