Objetivo econômico é evitar total perda de controle sobre as expectativas, tanto do regime fiscal quanto do regime monetário (Carla Nichiata/Getty Images)
Bússola
Publicado em 26 de outubro de 2021 às 16h15.
Última atualização em 26 de outubro de 2021 às 16h24.
Por José Márcio Camargo*
A decisão do presidente Jair Bolsonaro de aumentar o valor do teto de gasto mudou completamente o cenário para a economia brasileira para o próximo ano. Como era esperado, esta decisão gerou forte reação negativa dos investidores, provocando desvalorização da taxa de câmbio, aumento das taxas de juro e queda dos preços das ações. O teto é a âncora fiscal do país. Quando a economia cresce e as receitas tributárias aumentam, o teto restringe o aumento das despesas e o crescimento da receita é utilizado para reduzir a dívida pública. Este mecanismo torna a dívida sustentável ao longo do tempo.
Do ponto de vista dos investidores, o problema não é o valor do aumento do teto, mas a credibilidade. Afinal, se o governo está disposto a aprovar uma PEC que desloca o teto para cima com o objetivo de financiar um aumento dos gastos, por que não irá fazer isto novamente no futuro? Em outras palavras, para que serve o teto?
Um dos principais pilares de nosso cenário era a obediência ao teto. Com o fim de fato do teto aumenta o risco fiscal e o prêmio de risco do país, o que pressiona a taxa de câmbio e a taxa de inflação. O resultado é um aumento da taxa de juro necessária para controlar a inflação, aumento do custo de capital, queda do investimento privado e menos crescimento. Um rebaixamento da classificação de risco do país não está fora do horizonte.
O objetivo agora é evitar a total perda de controle sobre as expectativas, tanto do regime fiscal quanto do regime monetário. Em outras palavras, reconquistar a credibilidade perdida. Não será uma tarefa fácil. Em primeiro lugar, é fundamental que o Banco Central atue no sentido de indicar aos investidores que o regime de metas para a inflação continua efetivo. Isto significa acelerar o reajuste da taxa de juros para mostrar que o objetivo de atingir a meta em 2022 continua em vigor. Se a política fiscal está mais expansionista, a política monetária terá de ser menos expansionista.
A reunião do Copom desta semana é o momento adequado para mostrar o compromisso com a meta. O ideal seria um choque de juros suficientemente forte capaz de convencer os investidores de que o Banco Central continua perseguindo a meta para a inflação em 2022, o que significa um aumento da Selic em não menos que três pontos percentuais.
Mas isto não será suficiente. Além de uma política monetária mais contracionista, é também fundamental que o governo sinalize que a estratégia de consolidação fiscal, que vinha sendo adotada desde o início do governo, será mantida. O que exige aprovar a PEC dos Precatórios como foi enviada ao Congresso, sem novos aumentos de gastos, manutenção de medidas de controle de gastos, como o congelamento dos salários do funcionalismo, reduzir os subsídios tributários, evitar a aprovação pelo Congresso do adiamento do fim da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores, aprovar a privatização dos Correios no Senado, privatizar a Eletrobrás, aprovar a reforma administrativa, entre outros projetos importantes que estão no pipeline do Congresso e do Executivo.
A retomada da economia vai depender principalmente da melhora de bem-estar gerada pelo fim da pandemia. Será o fator positivo no cenário que deverá evitar que a economia entre em recessão em 2022. Mas é fundamental retomar o controle sobre as expectativas, caso contrário, vamos repetir o cenário de estagflação de 2014/2015.
*José Márcio Camargo é professor titular do departamento de economia da PUC/Rio (aposentado) e economista-chefe da Genial Investimentos
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