É necessária uma visão mais humana pelas empresas (RTimages/Thinkstock/Thinkstock)
Bússola
Publicado em 20 de julho de 2022 às 13h00.
Por Beatriz Beré Motta & Cibelle Linero*
As atividades insalubres são aquelas que, por sua natureza, expõem os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites permitidos pela lei. De acordo com a Norma Regulamentadora nº 15, são tidas como atividades insalubres aquelas expositivas a ruído contínuo ou intermitente; ruído de impacto; exposição ao calor; radiações ionizantes e não-ionizantes; trabalho sob condições hiperbáricas; vibração; frio; umidade; agentes químicos; poeiras minerais; e agentes biológicos. A sujeição a tais atividades assegura ao empregado o pagamento de adicional de insalubridade de 40%, 20% ou 10% sobre o salário-mínimo, dependendo do grau de exposição.
A Reforma Trabalhista, inseriu o art. 394-A da CLT, o qual previa distintas consequências para o trabalho da gestante vis a vis o grau de insalubridade do local de trabalho. A gestante deveria ser afastada de atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durasse a gestação. Já nas atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, o afastamento dependeria da apresentação de atestado de saúde, emitido por médico de confiança da gestante. As trabalhadoras lactantes, por sua vez, seriam afastadas se apresentassem atestado médico com essa recomendação, independentemente do grau de insalubridade.
O §3º do artigo em comento, por sua vez, passou a prever que a gestante ou a lactante que não puder ser realocada para um local salubre na empresa, terá sua condição equiparada a uma gravidez de risco, o que ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei 8.213/91. Nesse caso, portanto, foi transferido para a Previdência Social o ônus de arcar com a licença antecipada e estendida por todo o período de amamentação.
Desde logo, houve diversos questionamentos acerca da redação do referido artigo, eis que demandava da empregada o ônus de comprovar a incompatibilidade entre a gravidez ou lactação e as atividades desempenhadas no ambiente insalubre.
Em 2019, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.938, alegando que a expressão “quando apresentar atestado de saúde emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento” contida nos incisos II e III do art. 394-A da CLT fere dispositivos constitucionais relacionados à proteção à maternidade, à gestante e ao nascituro, além de violar preceitos da dignidade humana e valores sociais do trabalho, bem como representar um retrocesso social. No mesmo ano, o STF julgou, por maioria de votos, a referida ADI procedente, sob relatoria do Ministro Alexandre de Moraes. Assim, as grávidas e as lactantes devem ser afastadas, durante a gravidez e a amamentação, das atividades insalubres sem necessidade de apresentação de atestado médico, como condição para tanto.
Dois pontos valem a reflexão, mesmo passados cinco anos da Reforma e finda a discussão no STF.
Ao prever o afastamento independentemente de atestado, ou seja, de uma necessidade médica comprovada, o legislador parece não ter atentado para o fato de existirem inúmeras empresas onde todas as atividades são consideradas insalubres e, com facilidade a gravidez se converterá na hipótese de gravidez de risco e o período de lactação será um impeditivo ao trabalho, o que onerará a Previdência Social que passará muitas vezes a ter que custear um benefício maior do que aquele originalmente garantido e também o empregador que ficará por um período longuíssimo com a empregada afastada.
Outro ponto sensível que afeta o tema é a empregabilidade das mulheres em empresas cujas atividades são insalubres. Ora, diante da possibilidade de afastamento – sem obrigatoriedade de comprovação médica da necessidade para tanto – qual o incentivo para a contratação das mulheres?
Não seria mais protetivo às mulheres e aos nascituros prever o afastamento apenas quando pertinente do ponto de vista médico, ainda que para não onerar as mulheres, tal confirmação tivesse que ser feita pela empresa, por meio de seus médicos do trabalho ou com o custeio, também pelo empregador, de médicos particulares de escolha da empregada para a devida avaliação, outorgando a tais médicos a faculdade de visitar o local de trabalho, ter acesso ao PPRA da empresa?
O que parece mais equilibrado é a avaliação de cada caso concreto, ou seja, em cada situação real verificar a efetiva exposição aos agentes insalubres e a saúde da empregada grávida ou lactante. No entanto, a Reforma não prevaleceu nesse sentido e, atualmente, a regra é geral para todas as trabalhadoras em atividades insalubres, independentemente do grau de insalubridade.
*Beatriz Beré Motta e Cibelle Linero são integrantes da área Trabalhista e sócia da área de Trabalhista do BMA Advogados
Siga a Bússola nas redes: Instagram | Linkedin | Twitter | Facebook | Youtube
Veja também
Bússola & Cia: Nova presidente da CEF mira poder às mulheres
Beatriz Leite: A mulher empreendendo dentro e fora das paredes corporativas