Bússola Poder: a República dos abacaxis
Em artigo, Márcio de Freitas analisa a o cenário político brasileiro e sua tendência a acumular "abacaxis"
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Publicado em 18 de agosto de 2023 às 14h20.
Por Márcio de Freitas*
O Brasil não é uma república de bananas.Outra fruta ocupou o campo imaginário nacional antes que a United Fruit Company preenchesse os requisitos de nosso realismo fantástico. Todos os dias o cidadão brasileiro acorda para descascar seuabacaxidiário: incerteza jurídica, inflação, juros altos, crise política, concentração de renda, instabilidade econômica, violência, saúde precária, falta de infraestrutura…
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O país disputa a liderança do torneio mundial de produção de abacaxis nos campos social, político e econômico. A supersafra dos últimos anos continua sendo superada, cotidianamente – mesmo com a diminuição do crescimento populacional, um pequeno fruto que deve crescer no futuro.
Há ainda o incremento de variações mutantes: o ananás virtual, cultivado por hacker em depoimento-delação, cujas cascas ásperas e cortantes produziram um suco intragável para ex-presidente de pijamas. Essa espécie é uma praga que, historicamente, ronda o país com ameaças autoritárias e antidemocráticas, ora encontrando terreno fértil, ora com maior resistência social, tal como foi em 2022 quando o voto prevaleceu sobre as bravatas.
Há também a modalidade globalizada. O petróleo subiu no mercado internacional, mesmo com as incertezas econômicas que mostram pouca evolução no crescimento mundial nos próximos meses. E o abacaxi acaba nascendo, com coroa pontiaguda e espinhenta no topo, no bolso do brasileiro. Não é possível fugir dessa conta importada, sob o risco de ficar sem combustível para fazer a economia girar.
O cenário internacional é, por isso mesmo, outro imenso abacaxi, que pode ser doce para quem produz carne e soja, mas tem que ser descascado com habilidade de cuteleiro premiado. O governo, empresas exportadoras e importadoras têm de decifrar esse enigma onde há inflação acima da média ainda na Europa, guerra na Ucrânia, desaquecimento do mercado interno chinês e uma eleição nos Estados Unidos completamente aberta, com possibilidade da volta de Donald Trump, o candidato Republicano que enfrenta investigações e denúncias em série mas se mostra extremamente competitivo.
Esse é um ponto que pode propiciar a reação da economia brasileira se tudo der certo, ou atrapalhar o crescimento de um país cuja principal pauta é exportação de grãos e produtos primários para países desenvolvidos. Por mais que alguns achem a globalização excludente, suas crises são inclusivas.
O presidente Lula tem seu abacaxi particular: a base aliada que ele tenta saborear desde a posse. Mas só conseguirá depois chegar ao Centrão da fruta. Tem que descascar seu ministério para que o Centrão também saboreie a consistência doce de ser governo.
Sem que haja essa salada de uma só fruta o orçamento, o arcabouço fiscal, o novo Carf e a reforma tributária andam de lado na agenda de votações da Câmara, onde os deputados esperam avançar em mais nacos do Executivo, além das verbas vitaminadas das emendas autodeterminadas obrigatórias. Lula resistiu o quanto pode, mas teve que ceder para não criar um território movediço de instabilidade política.
Além disso, o cenário nacional para o investidor privado está ácido com a bolsa de valores registrando seguidas quedas em recordes de sequência de baixa. Na Petrobras, há pouca certeza sobre como a empresa se comportará frente à pressão dos preços internacionais; há o movimento para trocar o comando da Vale por ex-ministro amigo; há a politização do incidente de blecaute da semana, com responsabilização antes da apuração dos fatos. Um país onde causa e efeito não se juntam, é um grande abacaxi para qualquer cidadão começar a descascar, no escuro.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
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