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Bem-vindos advogados do século 21: ainda vamos contratar terno e gravata?

Esse mix de novos aprendizados adquiridos ao longo da vida faz com que um advogado não se limite a ser um aplicador da lei

Quem é esse “novo” advogado, afinal? (Arquivo/Getty Images)

Quem é esse “novo” advogado, afinal? (Arquivo/Getty Images)

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Publicado em 23 de maio de 2022 às 16h45.

Por Gabriela Seincman*

A figura do advogado sempre foi associada à aplicação da lei, ao gerenciamento de conflitos e à condução de processos. Gravata no pescoço, roupas alinhadas e jargões complexos: o famoso estereótipo do advogado. O operador do Direito, de fato, tem o conhecimento da legislação, se utiliza dela para resolver conflitos e, também, para patrocinar medidas judiciais.

Mas será só isso?

Estamos em abril de 2022, uma pandemia que (espera-se) chega a uma conclusão, um novo mundo, novos formatos de trabalho (de qualquer lugar, híbrido, digital), novas relações entre as pessoas, empresas e a sociedade, enfim, mudanças profundas e necessárias em um sistema e ordenamento em constante mutação, onde a única certeza é, justamente, a mudança.

Mas e o advogado de hoje, da pós pandemia, da era do NFT, Metaverso, workfromanywhere, officeless, que demonstrou não necessitar mais ter (ou estar) — necessariamente — em um escritório, com grandes estruturas e caros ornamentos para cumprir, com excelência, o seu trabalho?

Quem é esse “novo” advogado, afinal? Ele se limita às atividades tradicionais, apenas como um operador da lei e conhecimento legal? Será a aplicação do conhecimento jurídico somente o que lhe resta no exercício desta profissão?

Temos que lembrar que, por trás da profissão escolhida — advogado — existe um ser humano. Que, como qualquer outra pessoa, adquiriu, ao longo do tempo, novas habilidades e experiências. Possui facilidade para determinados assuntos, vivenciou temas complexos e, certamente, já foi subordinado e liderado por alguém.

Esse mix de novos aprendizados adquiridos ao longo da vida faz com que um advogado não se limite a ser um aplicador da lei; assim como o arquiteto não é um simples projetista. Os profissionais são seres humanos, cada um com a sua singularidade e complexidade, mas todos, sem exceção, com conhecimentos que vão muito além da faculdade escolhida.

O mundo mudou completamente. Não temos mais somente as empresas tradicionais, os “bancos” não se limitam mais às instituições financeiras, e vivemos em um mundo inundado pelas moedas digitais.

A advocacia tradicional, aquela que se definia por palavras difíceis, roupas (por vezes) tradicionais, formais ou antiquadas, e por escrever um simples parágrafo em duas extensas folhas, cheias de latim e predicados, já não tem mais espaço.

Hoje, como advogados, temos que entender de business, tecnologia, inovação, economia e uma série de outros temas estratégicos para compreender as necessidades e conversar com os nossos clientes sobre o que mais importa: o negócio deles; temos que entender os ciclos das startups para auxiliá-las na criação, crescimento, perenização ou momentos de reorganização, incluindo os famosos exits, no jargão dos empreendedores; é necessário ter conhecimento do mercado financeiro, agora do mercado de criptoativos e de toda uma nova ordem descentralizada, interdependente e globalizada de finanças e economia. Temos que entender de pessoas, de gestão, de administração, de soft skills, de filosofia, da arte de viver.

E por quê? Para ter uma “caixa de ferramentas” que nos permita operar em benefício dos nossos clientes, pensar e executar soluções criativas, ter ideias e ações que agreguem valor ao negócio, muito além da simples verificação do cumprimento de regras e formalismos. Mais do que um “sim” ou “não”, a palavra de ordem hoje é “como”.

O conceito deste 2022 e dos anos para frente é que hoje o advogado não seja mais chamado apenas para “apagar o fogo”. A advocacia do presente e do futuro está na simplificação (ainda que para temas complexos), no pensamento estratégico, na colaboração, na parceria e na busca de resultados para nossos clientes, nos médio e longo prazos.

E não estamos aqui para defender que os escritórios ou os advogados sejam iguais ou tenham as mesmas estruturas de empresas de tecnologia, com puffs coloridos, mesas de sinuca, redes ou outros benefícios comuns nestes setores da economia.

Há que se buscar uma mudança de pensamento, de postura diante o exercício da profissão. É uma mudança de modelo mental, de dentro para fora, e não o inverso. E não há nada errado em ser tradicional. Mas podemos trazer um modelo de atuação “tradicionalmente” inovador, no qual o aprendizado contínuo de novos conceitos, de outros setores e outras áreas do conhecimento permitirá a construção de novas possibilidades e ferramentas para os novos — e atualizados — operadores do direito.

Nessa linha, lembrando que nós, advogados, antes do terno e gravata, somos seres humanos, há que se lembrar do componente fundamental para quem lida, todos os dias, com os problemas de, e entre pessoas: “inteligência emocional”. Em curtas palavras, mandatório que o novo profissional do direito conheça sobre e seja capaz de atuar com conceitos que passam pela empatia, diferentes estilos e formas de liderança, a capacidade de resiliência e, fundamentalmente, adaptação. Talvez, a adaptabilidade, em um mundo em constante e certeiras mudanças, seja hoje o pilar fundamental da nossa atuação como profissionais do direito.

A reflexão é simples: se o mundo mudou, se a forma de conduzir os negócios evoluiu, porque a nossa atuação ainda está olhando pelo retrovisor dos séculos 19 e 20 e não pelo para-brisas do século 21?

As reflexões aqui não buscam apontar certo ou errado, até porque não há.

De nossa parte, o questionamento e provocação são no sentido de adotarmos a multidisciplinariedade, os “soft skills”, a busca pelo autoconhecimento contínuo, bem como de novas ferramentas e áreas de aprendizado, conjuntos esses que permitirão a evolução para um novo profissional do direito, onde o ser humano (e não apenas o profissional) está no centro da equação. Melhoraremos como pessoas, e, por consequência, como profissionais para que, na outra ponta, possamos lidar com os temas e questões de outras pessoas, nossos clientes, e que, todos os dias enfrentam desafios em uma sociedade cada dia mais ambígua, incerta, vulnerável e volátil.

Que possamos dar as boas-vindas para este novo profissional do direito e que ele seja, como tudo nos dias de hoje, um ser em constante, positiva e harmônica evolução, em um processo e jornada de aprendizado contínuos pela nossa vida pessoal e profissional.

*Gabriela Seincman é sócia do J. Amaral Advogados, responsável pela área de contratos, societário, mercado de capitais, fusões e aquisições, empreendedorismo, startups e governança corporativa

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