Witzel fracassa em buscar apoio para barrar possível pedido de impeachment
Deputados dizem que base não tem sequer 12 votos para alcançar objetivo; governo negociou cargo com parlamentares, mas acordo não foi adiante
Clara Cerioni
Publicado em 2 de junho de 2020 às 09h15.
Com um processo de impeachment cada vez mais iminente na Assembleia Legislativa do Rio, o governador Wilson Witzel tenta recompor, em vão, sua base de apoio, que vem se desfacelando no Parlamento diante das investigações de supostas fraudes em contratos emergenciais em sua administração.
No fim de semana, o cargo de secretário de Polícia Civil foi para a mesa de negociação. O deputado Carlos Augusto Nogueira, do PSD, partido cuja bancada tem cinco nomes, chegou a ser convidado para ocupar a vaga deixada pelo delegado Marcus Vinícius Braga, mas recusou a proposta.
Ele teria indicado uma colega, Patrícia Alemany, que comanda hoje o Departamento Geral de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro.
Sete votos em jogo
O acordo garantiria, além dos cinco votos do PSD, mais dois de outros parlamentares. Mas a repercussão dessa costura não foi como o governo esperava. Alguns delegados denunciaram intervenção política na instituição, e um grupo cogitou até entrar na Justiça com um mandado de segurança por desvio de finalidade.
A delegada Martha Rocha, deputada pelo PDT, também criticou a barganha com a Polícia Civil. Pressionado, à noite, o governo anunciou que vai nomear para o cargo o delegado Flávio Marcos Amaral de Brito, subsecretário de Gestão da Polícia Civil, que estava interinamente no comando da secretaria.
"Fui convidado pelo governador, mas não aceitei, pois isso contaminaria meu votos futuros na Alerj", disse Carlos Augusto, referindo-se ao fato de ter que se alinhar ao governo. "Eu jamais deixaria de ser imparcial. O governador me perguntou sobre a possibilidade de indicar a Patrícia, assim como outros nomes", completou.
Witzel precisa de pelo menos 36 dos 70 votos da Alerj para impedir seu impeachment, caso o processo vá adiante. Parlamentares dizem que ele não chega hoje a um um terço desse número.
"A situação do governo é dramática. A curto prazo, ele não consegue nem uma dúzia de votos. A corrupção é inaceitável. E, na área da saúde, durante uma pandemia, é crime hediondo", disse Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB).
O deputado Bruno Dauare, aliado do governo, disse desconhecer qualquer tipo de negociação por cargo: "O que vejo é o governador fazer uma ampla reforma administrativa".
Com a indicação para a Polícia Civil, o governo pretendia ter a chance de dar um passo rumo à recomposição de sua base na Alerj, onde há pelo menos três pedidos de abertura de processo de impeachment na mesa diretora.
Witzel perdeu recentemente quatro votos do Republicanos, partido do prefeito Marcelo Crivella que decidiu deixar o grupo de governistas. Nesta segunda-feira, saiu no Diário Oficial a exoneração a pedido de Jorge Gonçalves, da Secretaria de Trabalho e Renda, indicado pela sigla.
Com as recentes operações Favorito e Placebo, que investigam fraudes no governo, principalmente na área da Saúde, Witzel fez cinco trocas no primeiro escalão: Saúde, Fazenda, Casa Civil, Polícia Civil e Trabalho.
A saída de Luiz Claudio Rodrigues de Carvalho, da Fazenda, e de André Moura, da Casa Civil, deixaram o clima bem hostil para Witzel na Alerj. A mudança nas duas pastas, arquitetadas pelo secretário de Desenvolvimento Econômico, Lucas Tristão, fez com que o então líder do governo na Casa, deputado Márcio Pacheco (PSC, partido de Witzel), e o vice-líder, Rodrigo Bacelar (SDD), entregassem seus cargos.
Até agora, o governo está sem comando no Parlamento. Fontes contaram que Witzel convidou um deputado nesta segunda para assumir o cargo de líder, mas que ele recusou. E Tristão, secretário mais próximo do governador, entrou agora de férias, deixando a administração estadual ainda mais desfalcada.
Nova investigação
Para piorar, a Alerj instalará hoje a Comissão Estadual de Saúde para investigar e pedir documentos ao Ministério Público sobre a Operação Favorito, deflagrada pela Polícia Federal há duas semanas. A presidente deve ser a delegada Martha Rocha.
Sem o acordo na pasta da Polícia Civil, não se sabe se os deputados do PSD vão ficar ao lado do governo. Para indicar Patrícia Alemany, o deputado Carlos Augusto, que é delegado, teria tido o apoio dos deputados Rodrigo Amorim e Alexandre Knoploch, ambos do PSL e muito ligados à área da segurança.
Augusto é amigo do marido da delegada, o ex-chefe de Polícia Civil Gilberto Ribeiro. Antes de sair a escolha de Flávio Brito, a delegada desconversou sobre sua indicação:
"Como vou dizer se vou ser secretária ou não, se não recebi um convite formal. O governador ainda não me ligou para dizer se me chama para a secretaria. Só após isso, e se é que vai acontecer, é que teremos um posicionamento".
A gota d’água para a saída de Marcus Vinícius da pasta foi o fato de a Polícia Civil ter iniciado as investigações sobre suposta fraude nas licitações para a construção e a gestão de hospitais de campanha durante a pandemia.
A apuração deu origem à Operação Placebo, desencadeada na semana passada pela Polícia Federal, que cumpriu mandados de busca e apreensão em endereços ligados a Witzel e à primeira-dama Helena Witzel. A ação policial teria abalado a relação e entre o governador e o então secretário, que foi exonerado a pedido.
Procurado, Knoploch negou que tenha feito indicações para a Polícia Civil. Já o deputado Rodrigo Amorim não se manifestou. O governo do estado confirmou o nome de Flávio Brito, mas não quis comentar a a sua situação na Alerj.