Para o pró-reitor de Pós-graduação da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, o momento é de "preocupação (Reprodução/USP Imagens)
Estadão Conteúdo
Publicado em 8 de maio de 2019 às 21h54.
Última atualização em 9 de maio de 2019 às 12h01.
A Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) afirmam que o governo federal cortou bolsas novas de mestrado e doutorado que estariam sem utilização por apenas 15 dias.
O critério de corte de bolsas chamadas "ociosas" foi um dos divulgados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC), para justificar a medida. As instituições alegam, no entanto, que as bolsas já estavam previstas para 2019 para os programas de pós-graduação e aguardavam apenas a seleção dos candidatos que iriam utilizá-las.
O jornal O Estado de S. Paulo adiantou que o contingenciamento de R$ 7,4 bilhões do MEC iria afetar as bolsas de mestrado e doutorado. O bloqueio de verbas na pasta atingiu todas as áreas da educação, do ensino infantil à pós-graduação.
O sistema ficou fechado nos primeiros dias de maio e abriu apenas hoje, quando as universidades tentaram então cadastrar seus alunos para receber as bolsas já previstas. Todo ano, os programas de pesquisa contam com uma quantidade de bolsas, de acordo com critério da própria Capes, que são consideradas no planejamento e dão segurança sobre quantos estudantes podem vir a participar de seus cursos de mestrado e doutorado.
Quando um aluno finaliza o curso, essa bolsa, no ano seguinte, é passada para um colega. Foram justamente as bolsas que ficaram vagas em abril que não mais puderam ser preenchidas em maio, por causa do corte da Capes que as considerou "ociosas".
Questionada, a Capes não informou qual é o critério para definir que uma bolsa está ociosa.
As universidades paulistas são as três instituições do País que mais produzem conhecimento científico, segundo o relatório Web of Science, feito pela Clarivate Analytics, uma das mais prestigiadas equipes de análises de dados científicos do mundo. Juntas, elas são responsáveis por 33,8% dos papers publicados pelo Brasil.
"As universidades foram pegas de surpresa com o recolhimento de bolsas chamadas "ociosas". Nenhum comunicado foi feito às instituições", afirmou em nota a pró-reitora de Pós-Graduação da Unicamp. Segundo a instituição, a estimativa inicial é de que cerca de 40 bolsas foram cortadas. "Mas já há inúmeros relatos que dão conta da insensatez da medida, dado que em muitos casos estava-se justamente buscando atribuir a bolsa ao aluno e o sistema não permitia."
Para o pró-reitor de Pós-graduação da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, o momento é de "preocupação". "Mas é importante que aguardemos novas informações e continuemos nossas atividades para termos uma pós-graduação de excelência na USP com o apoio da Capes", afirmou.
A Unesp informou ter registrado cortes em praticamente todos os seus programas de pós-graduação, mas que ainda dimensiona o número total de bolsas cortadas. "Os coordenadores do programa estão me pedindo ajuda, pois se sentem responsáveis pelos estudantes que tiveram as bolsas cortadas. São pessoas que pediram demissão do emprego, deixaram de lado outros compromissos e se programaram para estudar contando com o recurso. Ainda não temos a real dimensão dos prejuízos que os cortes causaram, mas a situação é caótica", disse a professora Telma Teresinha Berchielli, pró-reitora de pós-graduação da instituição.
Telma contou que uma das bolsas do Programa de Alimentos e Nutrição da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, do câmpus de Araraquara, já estava destinada para um estudante de Moçambique. O jovem saiu de seu país, pediu demissão do emprego com a garantia de que teria o auxílio da bolsa para estudar.
As universidades federais também tiveram bolsas cortadas pela Capes. Há relatos de bolsas suspensas em ao menos mais seis Estados, além de São Paulo. Instituições do Pará, Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais e Paraná já identificaram a perda.
Reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA) e integrante da Andifes (associação de reitores das universidades federais), Emmanuel Tourinho, considera que a medida é uma "tragédia para a ciência" do País. "Não existe bolsa ociosa na pós-graduação, porque temos muito mais alunos do que bolsas disponíveis. Dados do Sistema Nacional de Pós-Graduação mostram que apenas 1/3 dos alunos dos alunos da pós tem bolsa. O processo para registrar novos alunos tinha acabado de ser aberto e nós temos uma lista de espera para elas", disse.
A Capes informou, em nota, que "nenhum bolsista já cadastrado nos sistemas de concessão foi retirado". E que não há ainda o número exato das bolsas ociosas recolhidas. As universidades confirmam que apenas bolsas novas foram atingidas.
A Capes sofreu um bloqueio de R$ 819 milhões, 19% do orçamento autorizado inicialmente. Na rubrica de bolsas de estudo (nacionais e internacionais; mestrado e doutorado) o contingenciamento é um pouco maior, 23% dos R$ 1,85 bilhão reservados. Procurado, o órgão não quis confirmar quanto do valor foi bloqueado pelo MEC.