RENAN E CÁRMEN LÚCIA, PRESIDENTE DO SET: o Brasil precisa se reacostumar a ter instituições fortes e regras claras que sirvam para todos, se quiser ser uma sociedade analítica e questionadora / Agência STF
Da Redação
Publicado em 6 de dezembro de 2016 às 18h01.
Última atualização em 23 de junho de 2017 às 18h56.
A guerra fria entre o Judiciário e o Legislativo chegou ao fim hoje com um míssil teleguiado. A Mesa Diretora do Senado ignorou a liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello que afastava Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência da Casa. Renan tornou-se réu no Supremo na última quinta-feira (1o de dezembro), acusado de peculato ao ter contas pessoais pagas pela empreiteira Mendes Júnior em troca de favorecimento político. Para Marco Aurélio, isso impossibilita que Renan continue no cargo.
Na tarde desta terça-feira, foi apresentada uma carta assinada pelos integrantes da Mesa do Senado argumentando que a decisão “monocrática” do ministro impacta “gravemente no funcionamento das atividades legislativas” e que esperam pela “deliberação final” do Pleno do Supremo. Juristas estão divididos. Na teoria, alguma instituição, como a Procuradoria-Geral da República, pode pedir a prisão de Renan por descumprir uma ordem judicial — mas o crime não é inafiançável. Em contrapartida, um grupo de juristas continua a criticar a decisão individual de Marco Aurélio, num argumento utilizado pelo Senado para não acatar a decisão.
O Supremo vai se reunir amanhã a partir das 14 horas para validar ou derrubar a liminar. A definição sobre a possibilidade de um réu continuar na linha sucessória continua na posse do ministro Dias Toffoli, que, no entanto, pediu vistas do processo. A maioria dos ministros já se manifestou contra a possibilidade de um réu assumir a Presidência. Nesse caso, Renan poderia, mais uma vez, ser afastado do cargo — não por liminar, mas pelo colegiado do Supremo. Outra hipótese, levantada por Rubens Glezer, professor de direito constitucional da Fundação Getulio Vargas, é que Renan saia da linha sucessória, mas continue à frente da Casa.
A ministra Cármen Lúcia está acompanhando de perto a situação para arquitetar uma saída pacífica. Renan partiu para ataques. Disse que o ministro Marco Aurélio Mello “treme na alma” quando se fala em supersalários de integrantes do Legislativo. Não é sua primeira polêmica com o Judiciário. Em outubro, criticou a ação de busca e apreensão da Polícia Federal no Senado, em que chamou o responsável pela decisão de “juizeco”. O Congresso passa por uma crise de imagem sem precedentes, enquanto o Judiciário desfruta de certo prestígio na onda da Operação Lava-Jato.
O imbróglio, obviamente, afeta o governo. O troca-troca no comando do Senado fez um grupo crescente de senadores afirmar que a votação da PEC do Teto de Gastos, decisiva para o governo e programada para o dia 13 deste mês, deve ficar para o ano que vem. O projeto contra abuso de autoridade, que compunha a pauta desta terça-feira, foi adiado. A queda de braço entre os poderes também leva a uma crise institucional que congela o país.
“Os Três Poderes não precisam andar de mãos dadas, mas é necessário pelo menos um ambiente de segurança jurídica para que não afugente o mercado, os investimentos nacionais e internacionais que o país precisa”, afirma Lucas de Aragão, diretor da consultoria Arko Advice e colunista de EXAME Hoje. O Brasil sempre foi imprevisível, mas desse jeito ninguém aguenta.